Com foco no novo álbum, Stereolab encerra Balaclava Fest com show forte

Com uma curadoria sempre atenta ao que desperta o interesse dos ouvintes mais dedicados à música independente, a 15ª edição do Balaclava Fest reafirmou o talento do selo em montar lineups de qualidade. Realizado mais uma vez no Tokio Marine Hall, em São Paulo, no último domingo (9), o festival teve como principais atrações Stereolab e Yo La Tengo — dois nomes cultuados que simbolizam bem o equilíbrio entre relevância e apelo entre fãs de música que buscam além do mainstream explorado por outros festivais — e ainda abriu espaço para vozes e sons em ascensão da cena nacional e internacional, como Gab Ferreira. A principal atração do festival, o Stereolab, que não visitava o Brasil desde 2000, é um dos nomes que melhor representam essa aptidão do Balaclava para escolher seus convidados. Tendo cultivado novos fãs (e a ansiedade dos antigos) desde sua última passagem pelo país, a banda liderada por Lætitia Sadier passou os últimos 25 anos produzindo obras fiéis à proposta de seu som e tinha muito o que apresentar aqui. Apostaram principalmente no seu último disco, o elogiado Instant Holograms on Metal Film, lançado em maio. Das 15 canções tocadas pelo grupo, mais da metade foram da nova obra, que é outra oportunidade do Stereolab de mostrar seu avant-pop dançante, cheio de camadas. O canto de Lætitia evoca o pop francês dos anos 60, com uma certa inocência em sua melodia, mas que, acompanhada do som mais vanguardista dos instrumentos, torna a experiência de um show do Stereolab uma viagem entre melodias suaves e texturas sonoras ousadas. Uma boa amostra disso é a terceira faixa tocada na noite, Vermona F Transistor, dançante e agradável nos vocais, mas cheia de texturas encorpadas pelo teclado e até mesmo por um trombone, tocado pela própria Sadier. A vocalista francesa se comunicou principalmente em inglês com o público e comentou que a música brasileira influencia o som do Stereolab. A conexão ficou evidente em Miss Modular, faixa em que o swing da bateria e o timbre levemente samba-rock da guitarra revelam algum interesse pelos sons brasileiros. Após o tradicional pedido de bis, a banda encerrou a noite com Cybele’s Reverie, deixando o público leve e satisfeito. Edit this setlist | More Stereolab setlists
Yo La Tengo transporta energia intimista para o Balaclava Fest

Antes do Stereolab, o mesmo palco Balaclava recebeu o trio norte americano Yo La Tengo — outro grupo que, mesmo com uma longa carreira e uma extensa discografia, ainda chama atenção com seus recentes lançamentos. Em 2023, depois de quase 40 anos de história, o Yo La Tengo lançou This Stupid World, álbum cultuado por muitos entusiastas da música independente, recebido como um disco à altura do auge de qualquer grande banda. Livres de qualquer necessidade de provar algo ou conquistar novos fãs, o trio se mostrou confortável em apresentar seu som intimista e expansivo, que transita entre a delicadeza das melodias e o caos do noise, mantendo viva a essência de quem faz música por pura convicção do seu som. Georgia Hubley, Ira Kaplan e James McNew não escondem a tranquilidade ao abrir um show de festival com Big Day Coming — longa e introspectiva, conduzida pelo canto suave da vocalista e pelos sons ásperos dos instrumentos, quase como se o Velvet Underground encontrasse os acentos do shoegaze dos anos 80. A plateia — já formada, naquele ponto do festival, por fãs mais maduros de música — ouvia o som com atenção, absorvendo cada timbre que atravessava a cantoria de Hubley sem jamais apagar sua delicadeza. É como se o Yo La Tengo tivesse encontrado a brecha perfeita para fazer coexistirem a dicotomia entre os ruídos distorcidos — por vezes encorpados pelo feedback vindo das caixas de som — e a suavidade de seus cantos serenos. >> LEIA ENTREVISTA COM O YO LA TENGO A primeira metade do show foi calcada em sons mais intimistas, com o instrumental que valorizou ritmos repetitivos e hipnóticos, agradando mesmo aqueles que gostam de prestar atenção nas texturas sonoras de músicas como Green Arrow e Autumn Sweater, em que a banda mostra seu lado mais atmosférico e meditativo antes de partir para momentos mais densos. Já na segunda metade, sem extrapolar muito no agito, mas aumentando a velocidade e microfonia, Fallout e Double Dare deram as caras. Mas a essa altura, os fãs da banda já estavam felizes de presenciar uma emblemática (e atual) banda da cena alternativa do rock. Edit this setlist | More Yo La Tengo setlists
Geordie Greep faz show com improvisos e espontaneidade musical no Balaclava Fest

Quem também esteve no palco Balaclava, inaugurando os trabalhos do mesmo, foi o contemporâneo Geordie Greep. Ex-vocalista da extinta Black Midi, o britânico, que lançou um dos melhores discos de 2024 (The New Sound), levou sua banda brasileira para apresentações no país, incluindo outro show em São Paulo durante a semana. De pouca conversa, mas muita musicalidade, Greep expôs seu art-rock jazzístico, mas com o peso do indie-rock que já o acompanhava na sua antiga banda. A diferença agora é que se notam camadas de outras influências, como da música brasileira e latina como um todo. Talvez tenha vindo daí a decisão de Greep em seguir voos solos e incorporar novas possibilidades para seu som, sem precisar da aprovação de seus antigos companheiros. E é aí que sua banda brasileira de apoio enriquece essa exploração sonora. Além de Greep na guitarra e na voz, os sons de teclado, baixo, bateria e percussão tornaram a experiência no Tokio Marine um show de improvisos e espontaneidade musical, em que o repertório alternava entre faixas puramente instrumentais e outras que se desdobravam em extensas jam sessions. >> LEIA ENTREVISTA COM GEORDIE GREEP Fica difícil enumerar ou definir os gêneros explorados durante a apresentação, já que a mistura, de alguma forma, soava agradável e única para os presentes no festival. Greep mostra, também ao vivo e solo, que continua sendo um grande expoente do rock atual, e que tem muito o que mostrar mesmo sem o restante do Black Midi.
Palco alternativo do Balaclava Fest contou com bons shows de emergentes do cenário nacional

Do outro lado do Tokio Marine Hall, intercalando com as apresentações do Palco Balaclava, outros artistas subiram no Palco Vans para encorpar ainda mais o festival. A primeira delas foi Gab Ferreira. A cantora catarinense vem ganhando nome na cena alternativa da música brasileira e recentemente lançou seu novo álbum, Carrossel. À vontade no palco, Gab mostrou maturidade ao equilibrar delicadeza e presença, não apenas cantando, mas dançando e transmitindo a carga emocional de cada verso. Enquanto sua banda criava texturas que mesclavam dream pop e uma leve psicodelia, ela cantava com nuances da MPB, em composições criativas como a faixa-título do novo trabalho, Carrossel. Ficou evidente que a artista já reúne um público fiel — fãs que cantavam junto cada verso, gesto que Gab retribuía com sorrisos e olhares atentos, fortalecendo a conexão com a plateia. Walfredo em Busca da Simbiose A segunda banda a se apresentar no palco Vans foi Walfredo em Busca da Simbiose, banda que une o rock e MPB. Divulgando seu novíssimo álbum, Mágico Imagético Circular, e liderada pelo multi-instrumentista Lou Alves, a banda apresentou um repertório sólido, acrescentando ao seu som nuances psicodélicas, vindas principalmente das inserções dos teclados, que tornaram as canções dançantes para os presentes. A apresentação teve ainda a participação de Marina Reis, vocalista da banda paulistana Pluma, que cantou, dançou e acrescentou ao som de Walfredo. Jovens Ateus Mais tarde, o post punk dos Jovens Ateus ecoou no Balaclava. Com ecos nítidos de Joy Division, a apresentação da banda ornou com o início da noite paulistana e o clima em volta do bar da casa de shows. Quem saia da apresentação de Geordie Greep se deparava com as batidas rítmicas do som do quinteto e ficava por ali mesmo, para aproveitar os sons que remetem também a bandas nacionais como Titãs. Horse Jumper of Love Para encerrar os trabalhos do palco Vans, o menor do festival, a banda de Boston, Horse Jumper of Love. Convidados às pressas, após o cancelamento do Fcukers, os norte-americanos não soaram nada como banda substituta e cativaram demais o público que optou por esperar o último acorde da banda encerrar, antes de acompanhar a atração principal da noite, Stereolab. Apesar do tom introspectivo, o peso e a intensidade emocional de músicas como Wink e Spaceman mantiveram os ouvintes atentos — muitos de olhos fechados, apenas sentindo o som preencher o ambiente. Em um dia repleto de apresentações notáveis, o Balaclava Fest reafirmou sua importância como um festival com curadoria diferenciada. O evento reuniu nomes que representam diferentes momentos da música independente — de artistas em ascensão, a veteranos que seguem relevantes com novos lançamentos — e se firmou como um festival necessário, em meio à enxurrada de atrações mainstream que dominam o circuito de shows no país.
Domingo do C6 Fest tem show impecável de Nile Rodgers e comoção com Wilco

O C6 Fest encerrou, no domingo (25), sua edição de 2025 com mais uma curadoria inspirada, equilibrando com inteligência artistas consagrados e nomes que vêm despontando na cena internacional — seja conquistando público em festivais europeus, seja chamando a atenção da crítica especializada. Teve a estreia energética do English Teacher, a performance vibrante do The Last Dinner Party, o show consagrado do Wilco e a celebração da lenda Nile Rodgers, que fechou a noite em clima de festa. Donos de um dos discos mais comentados de 2024 (This Could Be Texas), o English Teacher estreou em solo brasileiro já consagrado como vencedor do Mercury Prize — um dos prêmios musicais mais prestigiados do Reino Unido, concedido anualmente ao melhor álbum lançado por um artista britânico ou irlandês. Mas mesmo quem não está muito antenado aos acontecimentos do mercado musical pôde testemunhar os motivos que fizeram a banda ser reconhecida com tal honraria. Pontualmente às 14h de um domingo ensolarado, o grupo, conduzido principalmente por sua vocalista Lily Fontaine, mostrou estar pronto para uma carreira de fôlego — mesmo com apenas um álbum lançado. Lily é certamente o destaque, trazendo vocais firmes e fraseados do post-punk contemporâneo, mas intercalando com momentos suaves, sustentando notas agudas e entregando sutileza com controle — criando uma dicotomia entre o selvagem e o belo. Uma pequena amostra desse equilíbrio apareceu em The World’s Biggest Paving Slab, música em que a banda convidou uma fã da plateia para tocar guitarra no palco. Um gesto simples, mas revelador da segurança e da maturidade precoce que os ingleses demonstram em seus shows. Além da técnica e da qualidade na execução ao vivo, o grupo se mostra à vontade para explorar o palco, interagir com o público e se entregar totalmente — como fizeram na música de encerramento da apresentação, Albert Road. Na sequência, o mesmo palco que recebeu o English Teacher foi ocupado por outra banda internacional aclamada pela crítica musical. O The Last Dinner Party já contava com uma jovem base de seguidores apaixonados na plateia — e certamente saiu do festival com ainda mais fãs. Todas as músicas foram entoadas em coro, sinal de que o grupo, formado por cinco mulheres e acompanhado por um baterista de apoio, já conquistou o público brasileiro. O som da banda transita com naturalidade entre o pop barroco e o indie rock, com uma sutileza que encanta. A vocalista Abigail Morris não apenas canta — ela performa: dança, interpreta, encena suas músicas com intensidade e carisma, cativando quem estava por ali desde os primeiros minutos. Mas a ode teatral do grupo não se resume a Abigail. O próprio palco é cuidadosamente adornado para criar um cenário em que todas as integrantes brilham em suas posições. Outro destaque é a guitarrista Emily Roberts — mais tímida nas interações com o público, mas efusiva em sua técnica, preenchendo as canções do grupo com solos de indie rock notáveis. Visivelmente emocionadas e felizes com a recepção brasileira, o The Last Dinner Party prometeu voltar — e, quem sabe, com um palco maior e mais tempo para explorar suas apresentações. Um dos maiores nomes do festival, o Wilco, entrou para encerrar os trabalhos da Tenda Metlife. Assim como o Pavement, que esteve nesse mesmo palco em 2024, a banda liderada por Jeff Tweedy carrega décadas de fidelidade de um público fã da cena mais alternativa. O grupo norte americano é reconhecidamente um dos maiores nomes de sua geração do rock alternativo, seguindo firme com lançamentos notáveis mesmo após o auge representado pelo elogiado Yankee Hotel Foxtrot. Ainda que tenha passado recentemente pelo pelo Brasil, a vinda do Wilco para o país é sempre valorizada, pois o conjunto preza pela qualidade sonora e por alterar sutilmente seus setlists, proporcionando surpresas para os aficionados pela discografia do sexteto de Chicago. Company in My Back, do disco A Ghost Is Born (que ganhou uma reedição de 20 anos em 2024), foi a escolhida para iniciar os trabalhos em São Paulo. Com a destreza característica, o Wilco passeou por outros álbuns de sua discografia de 13 discos (fora EPs), sem esquecer de seu último trabalho, Cousin, de 2023. O público apaixonado pela banda cantou até mesmo as frases e solos de guitarra do grupo, levando Jeff a dizer que estava emocionado com a participação dos brasileiros. Em Impossible Germany (de Sky Blue Sky – 2007), o guitarrista Nels Cline brilhou com um solo memorável (e longo), amplamente aclamado. Outra canção performada já na noite de domingo, Via Chicago (de Summerteeth, 1999), talvez seja uma música-chave para entender o som do Wilco: uma melodia suave, quase folk, com a voz de Jeff Tweedy bem contida, cantando versos introspectivos, acompanhada por um instrumental leve — até que uma cacofonia de sons, distorção e caos toma conta da música, enquanto Tweedy permanece em sua calma. Essa alternância — entre delicadeza e ruído — sintetiza bem o tipo de tensão emocional e artística que o Wilco cultiva há décadas: músicas que parecem simples à primeira escuta, mas que revelam camadas profundas de construção sonora e sentimento a cada nova audição. Ao fim, a formação americana deixou o palco sob aplausos entusiasmados e gritos de “Wilco! Wilco!”, reafirmando sua relevância como um dos pilares da cena alternativa que moldou. Ficou a cargo de Nile Rodgers promover a festa de encerramento do C6 Fest 2025. Lenda viva da música, o artista é responsável por alguns dos maiores sucessos da história do pop e do funk. Embora seu nome possa não ser imediatamente reconhecido por todos, é difícil encontrar alguém que nunca tenha ouvido uma de suas criações — ou que não tenha sido, direta ou indiretamente, impactado por seu trabalho como hitmaker. Além de ser um exímio guitarrista — um verdadeiro pilar do instrumento no funk americano — Rodgers compôs e produziu para nomes como Diana Ross, David Bowie, Duran Duran, Beyoncé, entre tantos outros. Com um arsenal de sucessos, como Get Lucky (famosa na interpretação do Daft Punk), ficou fácil para o
Pretenders e Air se destacam em sábado com nostalgia e novidades no C6 Fest

Se consolidando como um dos principais festivais do país, o C6 Fest voltou em sua edição de 2025 repetindo a configuração de 2024: dois dias de festival no auditório do Ibirapuera, com apresentações de jazz e shows intimistas (nos dias 22 e 23 de maio), e os shows em palcos ao ar livre no sábado (24) e domingo (25). No sábado (24), que já começou com ingressos esgotados, o C6 Fest mostrou mais uma vez sua versatilidade, sem abrir mão da relevância artística de suas atrações. Trouxe nomes consagrados como Air e The Pretenders, ao lado de artistas em ascensão como Perfume Genius e Beach Weather. Inaugurando a Arena Heineken nesta edição, a banda Beach Weather subiu ao palco diante de uma plateia majoritariamente jovem. Os americanos, que misturam pop-rock com influências do rock alternativo dos anos 2000 (como The Strokes), não pareciam nem um pouco incomodados em tocar nas primeiras horas da tarde de sábado. Liderados pelo vocalista Nick Santino, o grupo encontrou no seu público cativo a energia necessária para atrair os curiosos que chegavam ao festival. Donos do hit Sex, Drugs, Etc., o Beach Weather se encaixa bem naquela categoria de bandas que conquistam principalmente as novas gerações de frequentadores de festivais. Apoiado por seus fãs engajados, o grupo abriu bem a tarde para esse público, que ainda teria Stephen Sanchez na sequência. Do outro lado do festival, na Tenda Metlife, Mike Hadreas se apresentava sob a alcunha de Perfume Genius. Dono do elogiado álbum Glory (2025), o cantor mostrou que já tem um público fiel no Brasil — que cantou junto até mesmo as faixas mais recentes de sua discografia. Embora esteja há mais de uma década na estrada, é principalmente nos últimos anos que o trabalho de Hadreas vem ganhando mais reconhecimento, tanto pela qualidade de suas composições quanto por sua relevância na cena queer musical contemporânea. No palco, Perfume Genius apresenta seu pop experimental (talvez o termo mais adequado, diante da dificuldade em rotular seu som), por meio de uma performance física marcante: ele rasteja pelo chão, se envolve nos fios do microfone e usa cadeiras como extensão de seu corpo — como se traduzisse em gestos toda a carga emocional de cada música. Outro ponto alto é sua banda afiada, que sabe ser contida nos momentos de delicadeza, mas explode com técnica admirável quando as canções exigem força. Um destaque especial é a guitarrista Meg Duffy, brilhante na criação de texturas complexas e sofisticadas, que enriquecem ainda mais o som do artista. Com a chegada da noite, foi a vez da consagrada banda The Pretenders subir ao palco da Arena Heineken. Um público mais maduro e nostálgico se reuniu para vê-los, mas a banda deixou claro que não vive apenas de lembranças — sua relevância permanece viva. Enquanto os clássicos soam impecáveis na voz de Chrissie Hynde, faixas mais recentes como Let the Sun Come In e Junkie Walk chamaram a atenção de quem ainda não explorou os últimos álbuns, Hate for Sale (2020) e Relentless (2023). Mesmo que esses discos nem sempre figurem nas (por vezes duvidosas) listas de melhores do ano, fica evidente que os Pretenders continuam entregando música de alta qualidade. É claro que os grandes sucessos não ficaram de fora. I’ll Stand by You e Don’t Get Me Wrong foram executadas com precisão por uma banda segura e entrosada, liderada com carisma por Chrissie. A cantora tem uma aura própria — transmite segurança e vitalidade sem precisar recorrer a excessos. Sua entrega é natural, mas poderosa, e ainda inspira contemporâneos como Dave Grohl, fã declarado que já a convidou para dividir o palco com os Foo Fighters. Além de sua imponência musical, Chrissie ainda demonstrou carinho pelo público brasileiro e elogiou São Paulo. No fim, os veteranos se reconectaram com os clássicos que amam, enquanto os mais jovens testemunharam um raro exemplo de longevidade e relevância artística em ação. Para fechar a noite, a banda francesa Air reanimou o clássico Moon Safari e proporcionou ao público a sensação de uma viagem espacial, por meio de ritmos, batidas e imagens transcendentais — suficientes para que quem se conectou à apresentação experimentasse uma travessia cósmica guiada pelo disco de 1998. Tocado na íntegra e na ordem original, o show trouxe um curioso clima de ficção científica ao cenário natural de árvores e lagos do Parque Ibirapuera. As projeções nos telões e na fachada do auditório complementaram a experiência, tornando-a difícil de descrever — uma rara oportunidade de se conectar, ao mesmo tempo, com a música do disco original e com o ambiente inexplicável que se formou naquela noite de sábado. Após tocar a obra completa, o Air ainda apresentou faixas de outros álbuns, oferecendo mais amostras de seu som eletrônico, atmosférico e sofisticado. O encerramento ficou por conta da épica Don’t Be Light, que soou como um convite para explorar além de Moon Safari. O primeiro dia do fim de semana do C6 Fest confirmou que a curadoria do festival continua afiada. Mesmo competindo com outros eventos consagrados, a organização consegue reunir nomes ecléticos, que dialogam com diferentes públicos, mas que se destacam por sua consistência e relevância nas cenas das quais fazem parte. Há artistas em ascensão, que começam a conquistar espaço no mercado e já acumulam prêmios e elogios da crítica especializada. E há também as atrações clássicas — que talvez não estejam entre as mais populares do momento, mas seguem mantendo a excelência em seus shows e lançamentos.
Com experiência completa, Incubus agrada ainda mais em São Paulo

Perto de completar apenas sete meses desde sua última apresentação no Brasil, o Incubus voltou ao país para novos shows, dessa vez para entregar toda a experiência de sua turnê Morning View + The Hits. Da última vez, no Rock in Rio 2024, com tempo reduzido e uma plateia que dividia atenção com outras atrações, o grupo entregou apenas uma demonstração do que tem performado nas apresentações para comemorar os 25 anos do álbum Morning View. Depois de passar por Curitiba, foi a vez de São Paulo receber a banda, no Espaço Unimed, na última quinta-feira (10). Na nova oportunidade em território brasileiro, agora tocando um show solo, sem nem mesmo uma banda de abertura aquecer a audiência, o Incubus soube aproveitar o espaço e o tempo. Com cerca de 9 mil pessoas em um ambiente bem mais contido do que a imensidão do Rock in Rio, a banda encontrou um público mais engajado e conectado com suas músicas. Desde a primeira parte do set, tocando Morning View do início ao fim, na mesma ordem do álbum, o grupo não economizou na qualidade de seu som. Já no petardo que iniciou a apresentação, Nice To Know You, o vocalista Brandon Boyd mostrou que os anos não afetaram sua voz, entoando a música com a qualidade das gravações de estúdio. Os efeitos criados nas pick-ups por Chris Kilmore, um dos diferenciais do som do Incubus, enriquecia os agudos e médios da guitarra de Mike Einziger, mantendo firme toda identidade que o grupo construiu e que os torna uma banda de sonoridade inconfundível — difícil de rotular, mas imediatamente reconhecível aos ouvidos de quem os acompanha. Com o público mais próximo e aglomerado, foi fácil até para quem chegou mais contido ser contagiado pelos coros que acompanhavam a cantoria de Boyd. O local também foi propício para que os efeitos visuais provocados pelas luzes do palco preenchessem o ambiente e tornassem ainda mais emocionantes faixas como Circles e Wish You Were Here, tocadas na sequência. Se o fator “espaço” estava a favor do Incubus, o “tempo” acompanhou. Aproveitando a nostalgia que seu som provoca na maioria do público, a banda seguiu confiante ao tocar as demais canções do consagrado disco homenageado. Blood on the Ground surgiu em um mini set acústico, enquanto 11am contou com um pouco mais da bela presença da mais recente integrante da banda: Nicole Row. Além de manter firme a base da música do Incubus com seu baixo, Nicole trouxe a novidade dos backing vocals femininos, acrescentando uma nova camada a muitas das músicas apresentadas durante a noite. Sobrou tempo até para homenagear canções de outros artistas, como quando Brandon e Mike se uniram para uma versão intimista de Umbrella, de Rihanna. Ou quando a banda muito bem entrosada aproveitou a base de Are You In? para executar uma tag de In the Air Tonight, dando espaço para o baterista José Pasillas executar a clássica virada de bateria de Phil Collins. Na parte final dedicada aos hits, o Incubus revisitou brevemente outros álbuns de sua discografia, tocando clássicos como Anna Molly e a (sempre) esperada Drive. Com um show de aproximadamente 1h40, embalado por coros e aplausos do público ao longo das músicas, o Incubus soube explorar a qualidade sonora e, com o espaço e o tempo a seu favor, potencializou ainda mais a conexão com seus fãs.
Dinosaur Jr mata a saudade dos fãs com show impecável em SP

Dinosaur Jr. certamente era a banda mais esperada da edição 2024 do Balaclava Fest, que rolou em São Paulo, no último domingo (10). As camisas da banda eram a vestimenta oficial no Tokio Marine Hall, usadas por fãs que esperavam, há anos, por uma nova oportunidade de ver o trio lendário do rock alternativo norte-americano. O Dinosaur Jr nunca esteve entre os mais famosos nomes do rock mainstream, mas o gênero sempre foi eficiente em tornar cult e sagrado vários nomes menos badalados. E é nesse grupo especial que se encontra a banda composta por J Mascis, Lou Barlow e Emmett Murph. Majoritariamente um público um pouco mais velho dominou a pista do Tokio Marine, após os mais jovens curtirem os sons indies e contemporâneos da tarde do festival. Após uma espera sem atrasos, os caras entraram no palco, em um momento meio anti climático: foram necessários alguns segundos para Mascis afinar a guitarra ao seu modo, antes de tocar a primeira nota da música de abertura, The Lung. Cercado por um paredão de amplificadores Marshall, Mascis, de poucas palavras, não economizou nos efeitos de pedais e distorções do seu instrumento. Para dar ainda mais peso, Barlow, selvagem em seu baixo e Murph, incansável na bateria, criaram uma verdadeira onda sonora, um pouco estourada pelo sistema de som do casa, que embolou o que era produzido pela banda no palco. Nada que tenha desanimado o público, que estava ali justamente pelo peso, a distorção e o virtuosismo dos dinossauros do rock alternativo. Seguiram-se In The Jar e Garden, tão celebradas quanto a abertura. Até a curiosa pausa e retomada em Out There — interrompida porque, segundo Lou, a banda estava sem dormir há dois dias — foi celebrada pelos fãs. Teve espaço até para o cover de Just Like Heaven, do The Cure, gravado pela banda no álbum You’re Living All Over Me, de 1987. E claro, as esperadas Feel the Pain e Gargoyle. Foram 18 músicas bem escolhidas, de uma extensa coleção de músicas. Aliás, alguns devem ter sentido falta de clássicos como Raisans. Mas com 40 anos de história, escolhas são inevitáveis — e a seleção final capturou bem a carreira da banda. A noite e o encerramento do Balaclava Fest proporcionaram uma verdadeira imersão no rock alternativo dos anos 1980. Riffs e solos de guitarra criativos, intensificados por efeitos como o Wah-Wah, acompanhavam a distorção visceral característica do gênero. A cozinha soava firme e despretensiosa, como se a banda ainda estivesse nos seus primeiros anos. Um público entregue, revivendo até o esquecido crowdsurfing. Alguns exageros, como o som alto e até mesmo um fã invadindo um palco. E claro, a alegria de todos os que se permitiram viver um show do Dinosaur Jr. Edit this setlist | More Dinosaur Jr. setlists
Water From Your Eyes traz novas nuances para o palco do Balaclava Fest

Water From Your Eyes, uma das atrações do Balaclava Fest 2024, lançou, em 2023, um dos discos mais celebrados pela crítica musical alternativa. O Everyone’s Crushed tem pouco mais de 30 minutos de duração, divididos em nove faixas de um indie pop com riffs de guitarras repetidos, que dão uma textura excêntrica ao som da dupla Nate Amos (guitarra e produção) e Rachel Brown (vocais). Em turnê, porém, eles contam ainda com o auxílio de Bailey Wollowitz na bateria e Al Nardo criando outra camada de guitarra. Justamente esse essa encorpada no som trouxe ainda mais ritmo e nuances para a apresentação em São Paulo. Destinado ao pequeno Palco Hall, atraindo um número modesto de público (que já partia para o palco principal, onde iria se apresentar o headliner Dinosaur Jr.), a banda criou um clima de boate indie moderna. Alguns dos presentes dançavam embalados pelos sons repetidos e marcados da guitarra de Amos. Outros, porém, pareciam mais hipnotizados pelo canto melancólico e pelas guitarras distorcidas de Nardo e Amos, que revezavam nos improvisos, enquanto o baterista Wollowitz marcava o tempo como um competente baterista de rock. A iluminação, com uma tendência ao vermelho, e o palco improvisado próximo ao público, ajudaram a tornar o ambiente propício para que músicas como Barley, criassem uma experiência envolvente. Qualquer grito ou reação do público era notado por Brown, que chegou a conversar com a plateia em vários momentos. Apesar de elogiada pela crítica especializada, a Water From Your Eyes ainda é conhecida por poucos no Brasil, mas fez uma importante carta de apresentação em um show onde o intimista e o enérgico se confundiram, mas sempre encontram ouvidos prontos para apreciar a arte ora rock, ora pop, da banda.