Se a praia foi a opção na tarde da véspera de feriado, cerca de 1,2 mil pessoas optaram pelo rock para fugir do calor na noite desta terça (14), em Santos. Melhor casa de shows da cidade atualmente, a Arena Club recebeu o Ira! para uma plateia que praticamente lotou o espaço: maior, por exemplo, do que a apresentação dos Titãs em novembro de 2022.
Edgar Scandurra (guitarrista) e Nasi (vocalista), os remanescentes da formação clássica, mais Evaristo Pádua (baterista) e Johnny Boy (baixista), subiram ao palco pouco após a meia-noite de quarta e, durante cerca de 1h30, nos presentearam com um set list repleto de hits, canções históricas do grupo e algumas versões.
O som perfeito valorizou os riffs de Scandurra, dos guitarristas mais prolíficos do país – aliás, é abissal a diferença de estrutura para shows do Arena Club em relação ao centro de convenções da Ponta da Praia, onde o espectador precisa lidar com dezenas de pilastras e péssimo som. Ao menos foi assim nas vezes que estive lá, no Santos Rock Festival 2022 e no último show de Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá. Nessas ocasiões, pessoas deixaram as apresentações no meio, frustradas, guitarra, baixo e bateria pareciam zumbidos de liquidificador e mal ouvíamos o que saía da boca dos vocalistas.
Por outro lado, com o Ira! no Arena, houve a celebração da boa música ao vivo. Experiência essa reforçada por um público que pouco levantava os celulares. Talvez pela média etária acima dos 40 anos, de uma geração acostumada a ver shows para apreciar as canções ao invés de ficar de aparelho móvel em punho o tempo inteiro – algo detestável e que transforma a experiência musical em tortura nos tempos recentes.
Nasi e Edgar se revezaram nas falas entre as canções. Entre elas, o primeiro homenageou Chorão antes de Vida Passageira, cujos versos dizem: “E quando seus amigos te surpreendem. Deixando a vida de repente
E não se quer acreditar. Mas essa vida é passageira. Chorar eu sei que é besteira. Mas, meu amigo, não dá pra segurar”.
O cantor, mais de uma vez, afirmou que Santos faz parte da história do Ira! E recordou quando tocaram na casa noturna Heavy Metal e no Clube Caiçara. Esses shows eram produzidos por Toninho Campos, o proprietário do Cine Roxy. Marcaram época e ajudaram as bandas do Rio e de São Paulo que davam seus primeiros passos musicais nos anos 1980. Não à toa, por gratidão, quando o Cine Roxy passou tempos difíceis durante a pandemia do coronavírus e quase fechou as portas, Nasi atendeu o meu pedido e gravou, prontamente, um vídeo sobre a importância do cinema para a cultura santista.
Os pontos altos da noite ficaram, obviamente, por conta dos hits Envelheço na Cidade, Núcleo Base (as duas últimas antes do bis), Tarde Vazia, Flores em Você, Gritos na Multidão, Dias de Luta, Eu Quero Sempre Mais (aquela com participação da Pitty no Acústico MTV).
Em Girassol, Edgar cantou a primeira parte. Faz sentido. A música, feita pelo compositor em homenagem a uma antiga namorada, já havia sido lançada pelo grupo sem fazer sucesso. Quando gravariam o Acústico MTV, o produtor Rick Bonadio sugeriu a canção para ser a música de trabalho. Acontece que a garota havia trocado Edgar por Nasi. O clima na banda não era dos melhores. E o “midas” do rock brasileiro preferia que Nasi a cantasse. Precisaram superar o climão. Nasi a gravou. Virou hit. O resto é história…