Em comemoração aos 25 anos do primeiro álbum da Penélope, Mi Casa, Su Casa, Érika Martins está de volta com o seu principal projeto após 20 anos. No último sábado (14), ela cantou com o Pato Fu, no Palco Sunset, no Rock in Rio.
De acordo com Érika, o momento é propício para produções novas de sua carreira solo. “Estou mais verdadeira do que nunca no palco”.
A Penélope surgiu no final dos anos 1990, em Salvador, e chamou a atenção de público e crítica com uma formação majoritariamente feminina e um rock doce, cheio de atitude e letras que abordavam temas do universo feminino.
Após um show histórico no Abril Pro Rock, a banda assinou com a Sony Music e lançou Mi Casa Su Casa. Produzido por Tom Capone e Antoine Midani, o álbum teve arranjo de cordas de Eumir Deodato e trouxe os sucessos Teen, Holiday e Namorinho de Portão, que logo atingiram os primeiros lugares nas rádios e na MTV.
Holiday e Namorinho de Portão também fizeram parte da trilha sonora de Malhação, da Globo, além de diversas coletâneas. Em 2001 a banda participou do Rock in Rio III.
Até sua dissolução em 2004, a banda lançou mais dois elogiados álbuns: Buganvília (2001) e De Rock, Meu Amor (2002), ambos com faixas que marcaram época nas rádios e novelas da Globo.
Em entrevista para o Blog n’ Roll, Érika Martins revelou detalhes da nova turnê com a Penélope, além dos motivos que a levaram a investir no retorno do grupo. Confira abaixo a entrevista na íntegra.
Como surgiu essa ideia de retornar com a Penélope?
Era uma coisa que não imaginava, sabe? Voltar com a Penélope. Estava super bem ali minha carreira solo, já preparando novos lançamentos, mas, no período da pandemia, comecei a sentir pelas conversas o quanto a Penélope era importante e mexia com essa memória afetiva de todo mundo.
Comecei a escutar uns relatos muito emocionados sobre a Penélope. “Poxa, me salvou em determinado momento. Saí de uma depressão”, histórias muito emocionantes. Fico até arrepiada aqui toda vez, sabe? E comecei a revisitar o repertório, fazendo vídeos, lives.
O pessoal pedia muito para tocar a música da Penélope. A maioria das músicas são composições minhas ou parcerias minhas com algum outro compositor, e aí fui revivendo esse repertório. E aí me deu saudade de mexer nisso de novo. Realmente me senti novamente. Consegui me encaixar de novo naquele repertório.
Fico brincando hoje em dia que fiz as pazes com rosa de novo porque lembro que quando terminei a Penélope, resolvi partir para a carreira solo e não conseguia mais nem usar rosa.
Queria preto, uma coisa mais rock’n’roll e aí de repente consegui de novo me sentir à vontade tocando aquelas músicas.
É algo pontual ou pretende gravar inéditas?
A ideia era ser só um projeto de fazer alguns Sescs. Mas, de repente, a coisa também foi tomando uma dimensão maior. A primeira amostra do que seria essa volta da Penélope foi com um show em São Paulo, quando abrimos para o Pato Fu.
Achei que tinha a ver também, a gente já tinha feito muitas coisas juntas, eu e a Fernanda temos uma composição que fizemos ano passado juntas, além de um feat na minha carreira solo.
Foi tão emocionante, pessoal chorando na frente, gente que veio de Manaus, gente que veio de Belém, gente que veio do Brasil inteiro pra poder ter acesso àquele repertório ao vivo.
E o que as pessoas falavam era: ‘Caramba, nunca imaginei que fosse escutar essas músicas ao vivo’. Fui também percebendo que o mais forte, o mais importante de tudo na carreira da Penélope, é o repertório, encaixa perfeitamente.
E aí foram pintando outras coisas. A gente já fez o Sesc em São Paulo, Santo André. E aí rolou o lance do Rock in Rio, encaixado junto ali com o Pato Fu, que tem tudo a ver.
A gente está super aberto para novas músicas, novos shows, vamos cair na estrada, mas também vamos para a gravação. A gente está seguindo esse fluxo. Aí tá muito legal de revisitar tudo. Uma delícia!
Volta com a mesma formação de 20 anos atrás?
Quando resolvi realmente voltar com esse projeto para comemorar os 25 anos do Mi Casa, Su Casa, que foi o primeiro disco da banda, acionei alguns ex-integrantes, só que muitos já estão afastados da música há muito tempo, não tocam mais. Por exemplo, o Mário Jorge, que é o baterista que gravou o Mi Casa, Su Casa. Hoje em dia ele é veterinário, tem a clínica dele. Ele está direcionado para outros assuntos, então seria mais complicado até de conseguir conciliar. Ele ainda mora em Salvador.
Aí a Constança está no Rio de Janeiro, trabalhando com a Toca do Bandido, o estúdio, como produtora, entre outras coisas. Tem a Fifi também, que foi a baixista da Penélope e está morando nos Estados Unidos. A gente perdeu também o Luizão, que era o guitarrista, faleceu há pouco tempo. Então, todo mundo estava com uma vida que não se encaixava.
É uma coisa também que costumo falar, a estrada é pra poucos, não é todo mundo que se encaixa neste way of life de viagem, de estrada, amo, sempre gostei, sempre fui de viajar muito.
No período do Autoramas, por exemplo, era pauleira também, viajando, turnê no exterior, voltava. Fiz também na minha carreira solo, quando fiz turnê lá fora. Acho que é pra quem gosta. Não é todo mundo que gosta, dentro da Penélope já tinha um pouco disso. A galera ficava meio na preguiça de viajar, ter que passar muito tempo fora de casa.
Aí pensei, poxa, então já que vamos analisar e vamos reformular tudo, o mais importante é o repertório. A primeira pessoa que lembrei foi o Luiz Lopez, a gente se conheceu fazendo o VMB com o Erasmo Carlos. Ele era da banda do Erasmo Carlos.
Naquela ocasião, cheguei no estúdio e pensei: ‘meu Deus, vou cantar com o Erasmo Carlos’. E ele olhando pra mim e falando: ‘Caramba, Érica Martins, Penélope’. Naquele momento também me caiu a ficha do quanto tudo é cíclico. É uma geração que influencia a outra.
Eu pensando isso naquele momento e, de repente, o Luiz Lopez veio falar comigo. ‘Poxa, Érica, eu fui muito influenciado pela Penélope’. A gente manteve esse contato desde então. E toda vez que encontrava com o Luiz, ele falava pra mim: “Ó, se tiver volta da Penélope, tô dentro, quero nem saber, me inclui nessa”. Na hora, lembrei disso.
Além dele ser genial, é um maestro, assim, uma pessoa extremamente generosa, fácil de lidar, um querido, muito talentoso. Ainda tem essa história de ter sido influenciado pela Penélope.
Aí a baterista, a Nico, viveu a cena da Penélope lá no sul, que era super forte, onde a gente fazia muita turnê. Ela é do rock, ela é do sul, então tinha tudo a ver estar junto também com a gente.
A Fernanda Offner, a baixista, já estava tocando comigo no meu projeto solo. Então já encaixou. E o Fernando Americano, a gente como casal, tocamos o tempo inteiro, então a gente tá em casa, tem um estúdio em casa, a gente o tempo inteiro tá tocando junto, relembrando ali as músicas e adoro também o estilo dele.
Acho que ele é muito minimalista e ao mesmo tempo respeita o que a música tem. Ele era o encaixe perfeito, realmente, para estar ali. No primeiro show já foi muito emocionante, a gente já viu o quanto funcionou esse encaixe e tá uma delícia.
Os ex-integrantes da Penélope, eles vão aparecer em alguns shows. Eles vão estar por aí também aparecendo sempre que der.
O que mudou na Érika de 20 anos atrás pra cá? Acha que a experiência te ajuda de qual forma no palco?
Acho que o primeiro ponto é que estou cantando melhor do que cantava. Às vezes pego os discos da Penélope, escuto e fico até meio com vergonha, nossa, cantava tão mal, meu Deus! Vejo algum vídeo, acho que evoluí muito como cantora e no palco, isso é notório, as pessoas comentam também.
A performance também, fiquei com um pouco de medo no primeiro show. Falei: ‘será que ainda caibo, de novo, nessa personagem, que é a Penélope?’ Como já passei por vários projetos, cada um tinha uma cara, então fiquei com medo de não conseguir me achar no estilo da Penélope. Só que foi incrível, caiu, parecia aquela roupa que você veste com caimento perfeito, e aí me senti de novo muito completa. Essa personagem da Penélope sou eu mesma, é onde me encaixo melhor, onde está a minha verdade.
Então, em relação a isso, do quanto estou diferente, do quanto amadureci, estou fazendo as coisas exatamente como quero fazer, respeitando exatamente o que quero. Acho que isso o tempo me trouxe, quero viver dessa forma, quero morar onde estou morando.
Acho que depois da pandemia levei uma chacoalhada, como todo mundo, de pensar, poxa, estou vivendo a vida que quero? Não estou, não estou vivendo a vida que quero, vou lá buscar o que realmente quero, as minhas verdades, isso acho que está no palco de novo, estou mais verdadeira do que nunca no palco. As pessoas também falam isso, ‘nossa, você está brilhando muito no palco’.
Me achei tanto nas composições, estou compondo muito também, fazia um tempo até que não estava atuando ali, tanto como compositora. Dos últimos dois anos para cá, nossa, estou compondo absurdamente, estou com várias parcerias novas, a Fernanda Takai, a Virginie (Metrô), coisas novas minhas, aí tem a Lan Lanh, uma outra música que vai vir aí. Estou em uma fase muito produtiva.
O que motivou sua saída do Autoramas?
No Autoramas fiquei oito anos, até o ano passado, estava ainda levando, mas não estava. Não estava me sentindo mais parte ali, queria artisticamente contribuir mais, mas não estava achando espaço ali. O Autoramas já é muito bem definido, ele já tem uma cara muito forte, então durante um tempo, para mim, foi bom estar lá, porque também estava cansada de ter que definir tudo, queria um pouco ser levada, mas aí também chegou uma hora que falei, ‘quero de novo me encontrar mesmo’, e não estava tendo esse espaço lá dentro, estava me sentindo à vontade mesmo.
Meio que resolvi sair, mas achei também que se não resolvesse sair, ia meio ser empurrada para isso, então foi natural também, de todos os lados, porque o Autoramas é isso, ele tem a coisa muito bem definida.
Pretende trazer a turnê da Penélope para Santos?
Quero muito tocar em Santos. Fiz uma palestra no Sesc, um bate-papo sobre o pioneirismo das mulheres no rock brasileiro, além de um pocket também. Foi muito legal de fazer. Com o Autoramas fiz algumas coisas, fiz o Festival Geek, um outro show também numa praça grande. Quero muito chegar com a Penélope, estou tendo muito pedido da galera aí para Santos.
Quais os três álbuns que mais te influenciaram como artista?
Vou começar com o Post, da Björk. O da Nico também, que é o que tem a música The Fairest of the Seasons, o Chelsea Girl.Saúde, da Rita Lee, fecha esse top 3.