Guitarrista e vocalista do black midi, uma das grandes sensações do último Primavera Sound no Brasil, Geordie Greep lançou recentemente o primeiro álbum solo, The New Sound.
O disco traz uma sonoridade alt pop divertida que não se ouvia há muito tempo, com bastante influência da música brasileira. Aliás, o álbum foi gravado em São Paulo e Londres, com músicos brasileiros.
Depois de três álbuns surpreendentes com o black midi e turnês mundiais quase ininterruptas por quase cinco anos, Geordie Greep conseguiu gravar algo que tivesse 100% seu DNA, sem ninguém discordando de suas ideias.
“Ao gravar The New Sound, foi a primeira vez que não tive ninguém a quem responder. E com cada impulso que tive, pude segui-lo completamente até o fim. Estando em uma banda (black midi), muitas vezes temos essa sensação de ‘podemos fazer tudo’, mas também somos um pouco limitados nessa abordagem e, às vezes, é bom fazer outra coisa, deixar as coisas de lado”.
Quase 30 músicos estiveram envolvidos na produção do álbum. “Metade das faixas foi feita no Brasil, com músicos locais reunidos no último minuto. Eles nunca tinham ouvido nada que tivesse feito antes, estavam apenas interessados nas demos que tinha feito. A gravação foi feita em um, talvez dois dias. Depois, fizemos os overdubs, em Londres”.
Em entrevista ao Blog n’ Roll, Geordie Greep comentou mais sobre a produção de The New Sound, o futuro do black midi, lembranças do Brasil, além da influência brasileira no trabalho.
Você está animado com o resultado de The New Sound?
Sim, com certeza. Está indo muito bem. É bom porque já foi lançado, então as pessoas estão se divertindo.
Como surgiu a ideia de gravar o álbum em São Paulo e em Londres?
Bem, já tínhamos começado a fazer algumas músicas em Londres e sabíamos que precisávamos de uma abordagem diferente para as outras músicas que tinha, as outras ideias. E até tentamos gravar algumas dessas músicas em Londres, e elas soaram bem, mas faltaram algumas coisas.
Então, estava procurando por músicos que tivessem experiência tocando música brasileira e latino-americana também, coisas como salsa ou cha-cha-cha, seja lá o que for. E estava procurando por caras que tivessem experiência tocando esses gêneros, e eles também fossem muito técnicos, para fazer uma sessão no final do ano passado em Londres.
Mas então lembrei que íamos fazer uma turnê no Brasil com o black midi, e tínhamos dias de folga. Logo pensei, vamos fazer isso lá. Tinha um amigo no Brasil, o Fernando, e perguntei a ele se conhecia algum músico, e ele respondeu positivamente: “vou chamar todos os músicos e montar o estúdio”.
E nós fomos lá, foi ótimo, muito mais fácil do que esperava, um ambiente muito mais agradável, atitude. Foi ótimo, perfeito.
E essa equipe parecia ser bem grande. Você poderia falar sobre o quão importantes essas pessoas foram para o álbum?
Sim, quero dizer, ao longo do álbum, há cerca de 27 músicos diferentes. Meu objetivo era realmente encontrar o padrão de musicalidade que nunca foi tão alto.
Você pode ir ao Instagram e encontrar um virtuoso assim, sabe, há tantos músicos incríveis por aí. Mas, para mim, você geralmente não os ouve tocando músicas tão interessantes.
Meu objetivo era fazer uma música que fosse mais experimental, mais interessante, um tipo diferente de coisa, e colocar esses grandes músicos nela e fazê-los realmente brilhar e entender para que você possa realmente ouvir neste álbum. Essa música sendo tocada por pessoas, realmente virtuosos e dando a essas pessoas uma oportunidade de tocar com seus pontos fortes, sabe.
Essa é apenas a visão que tinha para essas músicas. Sabe, no dia em que começamos a tocar Holy Holy com esses caras no Brasil, e estávamos gravando imediatamente, eram, sabe, apenas algumas tomadas dessa música. Imediatamente, foi como, ah, sim, esse é o som que queria que a música tivesse, essa é a sensação que queria para ela.
Você diria que a influência brasileira está na mesma linha do jazz?
Um pouco, sim. Definitivamente tem essa mesma coisa de elegância, certo? O objetivo é ter algo que seja bem elegante e refinado e soe caro. Sabe, gosto desse tipo de música onde o objetivo não é fazer soar ruim.
Sinto que muita música, o objetivo, a música indie, às vezes é fazer soar uma porcaria. As pessoas ficam tipo, “sim, vamos tentar fazer soar realmente decadente”. Como se não pudéssemos realmente tocar nossos instrumentos e essas coisas. Mas queria fazer soar como o futuro ou soar grande, elegante, enorme.
Pensei que isso funcionaria bem com as letras engraçadas e outras coisas para ter essa música com som elegante.
Você já foi influenciado ou ouviu música brasileira antes dessa experiência?
Sim, absolutamente. Todo tipo de coisa. Acho que o cara principal foi Egberto Gismonti, multi-instrumentista brasileiro, meio jazz, meio clássico moderno. Comecei a gostar dele quando tinha 18 anos e pensei que isso era realmente incrível, apenas ser aquele nível virtuoso no piano e violão, mas também ter um som, estilo e abordagem composicional completamente únicos.
Comecei a gostar dele, mas também descobri Milton Nascimento, João Bosco e Naná Vasconcelos.
Tenho que comentar algumas das letras, especialmente a que mais gostei, Walk Up, que parece um roteiro de série de TV. Isso poderia literalmente ser uma história. Até a guarda está grávida. De onde você tira a ideia dessas letras? É alguma experiência pessoal?
Não é realmente experiência, só queria fazer uma música com o black midi e com o que eu estava fazendo antes. Quando você está fazendo uma música, o ponto de partida é tentar torná-la o mais única possível e tentar fazer algo completamente diferente ou completamente obtuso ou estranho, algo assim. E quando fiz essa música, pensei, não, vamos tentar fazer uma música que seja mais, apenas vamos tentar e fazer como se tivesse quase uma estrutura azul. É quase como uma sequência de acordes de blues que satisfaz as mudanças normais de acordes clássicos.
Mas de vez em quando, ir a essas coisas é mais único. E o tipo de som que escolhi para a música era imaginar se houvesse uma música que fosse como um cruzamento entre Steely Dan e AC/DC. Mas essas coisas são meio parecidas, na verdade, em sua abordagem.
E para a letra, sim, só queria fazer isso desse jeito, que fosse da perspectiva de um tipo de diabo no ombro. Muitas vezes você tem essa coisa onde o personagem olha como um diabo e um anjo.
E quero meio que incitar um personagem a fazer esse tipo de aventuras de antes, dizendo que poderia ser essas coisas de novo e de novo. Vamos lá!
Queria que você falasse sobre a crítica em Walk Up?
É sobre esses caras desprezíveis, empresários desprezíveis e tudo isso. Gosto daquela música do Frank Zappa, Cocaine Decisions. É basicamente como se a música fosse sobre essas decisões que esses caras corporativos tomam que afetam milhões de pessoas. E eles estão fazendo isso enquanto estão chapados de cocaína, meio que brincando na sala de reuniões.
Essa é uma música desses caras que estão em um arranha-céu fazendo essas reuniões grandes e importantes, coisas assim. E eles nem conseguem. É simplesmente excitante.
Você planeja vir ao Brasil para promover o álbum?
Realmente quero. Ainda não recebi nenhuma oferta de promotor ou agente de reservas, mas acho que eles estão procurando organizar isso, provavelmente no segundo semestre do ano que vem.
Fora da música, o que mais te inspirou e influenciou na concepção do álbum?
Sim. Muitos filmes. Meus filmes favoritos são Era Uma Vez na América. Aliás, todos os filmes de Sergio Leone.
E isso também vai para o tipo de coisa exagerada, a coisa operística. Então, todas as coisas como The Red Shoes ou do cinema chinês, como My Concubine. Também tem espaço para os livros de Georges Simenon, explorando esses personagens do submundo e tipos de ambientes, mas sem meio que sensacionalizar, apenas colocando lá.
Javier Marías, grande escritor espanhol que tinha esses livros brilhantes, inspira com cada frase. Essa é uma maneira ruim de explicar, mas como se nada fosse superficial. Nada nunca é valor nominal.
Sempre há outra maneira de olhar para algo. Você frequentemente descreverá a mesma cena dez vezes e como quando você se lembra de algo e repassa algo dez vezes para tentar chegar a maneiras diferentes das coisas. Ele faz romances que são apenas uma frase para 200 páginas, mas são livros brilhantes, brilhantes, brilhantes, brilhantes, Javier Marías.
Li em algum lugar que você tinha medo de exagerar. Você sentiu que se conteve, especialmente em termos do tema desespero?
Definitivamente. Quer dizer, eu estava preocupado em fazer muitas músicas sobre o mesmo assunto, meio que se cancelaria em um certo ponto e se tornaria menos eficaz ou talvez se tornaria um pouco chato.
Mas, conforme foi acontecendo, pensei, na verdade, acho que é bom ter um álbum onde quase todas as músicas tocam em um tema semelhante, apenas para dar uma espécie de atmosfera uniforme e consistente. E acho que fiz o suficiente para meio que diferenciar, introduzir coisas novas aqui e ali.
Mas sem isso se destacaria mais se houvesse algumas músicas que fossem sobre coisas completamente diferentes, se houvesse algumas músicas sobre o Mágico de Oz ou algo assim.
Geordie, é inevitável não perguntar sobre o black midi. A banda deixou uma ótima impressão aqui no Brasil. Vocês se separaram ou é apenas um hiato?
Tive uma experiência tão boa (com o álbum solo). Foi a primeira vez que fiz tudo, do tipo de concepção de uma música à realização. Muitas vezes você tem uma ideia para uma música e vai gravá-la, mas em algum lugar ao longo do caminho, sente que ela perdeu algum tipo de mojo. Mas dessa forma, a música ficou cada vez mais agradável. Amei muito o processo e tem sido uma atmosfera tão positiva.
Acho que às vezes em bandas pode ser também. É só uma questão de tempo até que haja um pequeno elefante na sala ou um pequeno tipo de tensão, enquanto essa maneira de fazer isso tem sido tão transparente. Todos têm sido tão legais, então só quero continuar com isso o máximo que puder.
Você pode mencionar três álbuns que mais influenciaram você como artista?
Talvez se tivéssemos que nomear um álbum de Frank Zappa, o escolhido é You Are What You Is (1981). É meio que essa coisa de ter algo que é intensamente complexo e tem todas essas reviravoltas, ambição, mas ainda são todas músicas curtas de três minutos e ainda muito cativantes, muito viciantes. Por fim, ainda tem letras memoráveis, mas letras que também são bizarras. Esse é um ótimo álbum.
Depois, algo como Léo Ferré, o cantor francês. Ele fez tantos álbuns excelentes, o meu favorito é Il N’Y a Plus Rien (1973). Este é um álbum incrível, realmente fantástico para este mundo, super ambicioso, super louco, mas super apaixonado, super lindo.
Pra fechar, quero incluir um álbum brasileiro: Minas (1975), do Milton Nascimento. É um álbum muito bonito. Amo que esse álbum tem essa coisa de crianças cantando no começo e depois ao longo do álbum, ele as coloca em um contexto diferente. Não consigo lembrar qual é o termo musical para isso, mas é como se fosse uma coisa melódica que está sendo recontextualizada porque está recebendo informações diferentes. Mas a coisa não mudou. É apenas uma amostra dessas crianças que não mudou. Mas em cada música, está em uma tonalidade diferente porque é diferente. Então é um dispositivo muito, muito sofisticado, muito legal.