O cantor e compositor paulistano Johnny Monster lançou o álbum A Nova Era do Só Você, no fim de novembro. O disco, o mais orgânico e conceitual da carreira, possui dez faixas autorais.
Em conversa com o Blog n’ Roll, o cantor disse acreditar que este trabalho é o melhor em seus quase 40 anos de carreira. Além disso, também comentou sobre a produção do álbum, planos para shows no ano que vem e desafios para os músicos na era digital. Veja a entrevista na íntegra abaixo.
Como foi o processo de produção do álbum A Nova Era do Só Você?
Ele foi feito de uma maneira bastante intuitiva, ele quase não foi programado para ser feito. No final da pandemia estava esfriando um pouquinho e dei uma ligada para o Carlos Eduardo Freitas, que é um dos proprietários do estúdio Aurora, um dos melhores aqui de São Paulo, uma sala linda.
Liguei para ver se ele estava bem, o estúdio estava muito ruim e sem trabalho, quase fechando. Eu disse “vou te visitar aí de máscara e vamos aproveitar pra gravar umas 11 músicas que tenho aqui comigo, num estilo mais folk, country”. Fomos lá bem displicentemente, de forma mais informal.
Ele gostou muito, falou que tínhamos que fazer os overdubbing porque as músicas estavam muito bonitas, aí a gente se empolgou e ficou um disco meio grandioso e conceitual. Quem escutar, vai perceber muitas camadas e muitos layers de instrumentos.
O álbum é muito vintage porque lá é um estúdio que você aproveita a sala, os amplificadores, os instrumentos, então fica tudo muito moderno, mas você consegue extrair aquela sonoridade dos anos 1960, 1970. A gente fez ali um all of sound.
E suas inspirações? Alguns artistas têm inspirações de outras bandas, outros referenciam a própria vida. Essas músicas, mesmo sem intenção de virarem disco, tem um toque pessoal?
Claro que tem, estou há quase 40 anos na música, no rock alternativo e tal, então assim, já não penso mais na influência quando vou fazer a minha música, elas estão permeando ali, elas me indicam o caminho.
Óbvio que gosto de música inglesa, Beatles, Noel Gallagher, Smiths, mas também gosto muito de coisas brasileiras, elas permeiam. Acho que o principal das minhas músicas é contar o que estou vivendo, as letras na maioria são na primeira pessoa. Conto das fases da minha vida, uso a música para me expressar e expressar o que estou sentindo em relação ao mundo, essas músicas eram bem especiais.
Essas dez músicas são bem pessoais, foram feitas naquele momento duro da gente, um momento político, então acho que todas elas têm questões muito pessoais, são muito verdadeiras. Não costumo usar personagens nas letras, são as músicas dos meus pensamentos perante a vida.
Essa época de pandemia foi muito difícil para todos, ficar trancado em casa, o momento político, as pessoas perdendo parentes. Você conseguiu expor isso em suas canções?
É muito bom, salva a gente, se não fosse a música e a arte… Passei a pandemia inteira fazendo lives com a minha mulher, mudando a casa, minha casa parecia um teatro e foi isso que nos salvou viu. A gravação deste disco também, por isso que considero esse meu melhor disco até agora. A gente deu tudo nesse disco, porque podia ser o último, né? A situação estava tão difícil que a gente deu toda nossa energia para ele ser forte como acho que ele saiu.
Teve alguma música favorita de gravar e produzir?
Acho que sim, acho que a música mais poderosa do álbum é Armadilhas do Pensamento, uma canção bem resolvida. Os Pássaros é o épico que abre o disco e tem sete minutos e meio de duração, realmente é uma música marcante.
Mas acho que a grande faixa do disco é a dois, Cidade Grande, que não tem refrão, não tem uma parte A, B ou C, ela só vai crescendo, não crescendo até explodir no final, é uma letra pungente também. Então, essa música toda vez que ouço, penso: “essa foi pro gol”. Cidade Grande, eu recomendaria assim, se a pessoa quer escutar uma música do álbum, pode começar com essa que acho que essa ganha a pessoa, creio eu.
Pretende excursionar com o álbum, fazer shows, especialmente aqui em Santos?
Adoraria, já toquei tantas vezes em Santos, uma cidade tão roqueira. Na verdade, hoje o artista já faz tanta coisa, né? Mesmo tendo a super ajuda de tanta gente, como a For Music, o Pedro, o Nando, a equipe da minha gravadora e tantas outras pessoas, ainda me sinto sobrecarregado com os shows. Realmente precisava ter um agente ou algo assim.
Nesse momento faço as coisas por mim mesmo, acho muito complicado o artista ter que ser o artista e ainda vender o show, porque nas mídias sociais você tem que atacar e fazer, mas quero muito.
Fizemos um show de lançamento espetacular, a galera adorou, estou com uma puta banda, uns caras fodas mesmo, dos melhores aqui de São Paulo. Então já tenho na cabeça que ano que vem quero fazer muito mais shows do meu trabalho solo, porque faço shows de outros projetos para ganhar dinheiro e viver da música, mas preciso realmente me puxar mais para fazer os shows desse álbum.
Mídias sociais demandam muito mais trabalho e atenção com tudo que você está fazendo e que expõem na música, certo?
Muito, demanda uma atenção quase obsessiva, se você sai por um tempo, você já fica preocupado de estar perdendo espaço ou algo assim. É uma coisa bem desgastante, mas é necessária, essa coisa do ao vivo voltou com muita força, né? As pessoas se conectam muito, estão lotando shows, festivais e tem os editais de música rolando também, você tem que ficar realmente ligado. Tem que ter muita garra para trabalhar com música, gostar muito, porque se bobear, você desencana e desiste.
É um mercado cada vez mais difícil e nichado, mas é muito bom trabalhar com isso.
É muito legal, a gente tem que entender onde que a gente tá, qual é o seu caminho, sem querer derrubar o carrinho de ninguém, mas entender. Como você falou agora, as coisas estão muito nichadas e estão mesmo, então quem são os seus 1.200 fãs que seja, está mais por aí do que pelo mainstream. Acho que a coisa do mainstream só acontecerá com artista que tiver injeção de grana, sem o qual fica muito difícil.
Sabe como era nos anos 1980? Pinta uma banda muito especial e de repente as coisas começam a acontecer, acontecer e acontecer. Óbvio que o Nirvana e o Oasis tiveram grana envolvida também, mas acho que hoje é muita informação, então cada um está no nicho com seus fãs ali, tentando entender qual é o seu caminho na música. A gente está descobrindo ainda nesse momento.
Cite três álbuns mais importantes na sua formação como músico.
Não tenho como não citar o primeiro álbum dos Secos e Molhados. É um disco que até me arrepio quando falo. Sou de 1971, então quando faço nove, dez anos, fui fuçar nos discos dos meus pais e achei esse disco “das cabeças na mesa”, o primeiro disco do Secos e Molhados. Fiquei deslumbrado com as máscaras, o visual, a música era sensacional, um disco que considero um dos melhores da história da música, não só do rock.
Um outro álbum que é um divisor de águas na minha vida é o Head on the Door, do The Cure, um disco absolutamente perfeito. O The Cure esteve recentemente aqui em São Paulo, é um álbum que ele sai ali em 1984, 1985. Impactado pelo Rock in Rio e pelos shows que começaram a vir ao Brasil, escutei o disco, a sonoridade, aquela coisa tão artística deles é tão maravilhoso. The Head on the Door é o top 2.
O terceiro álbum é (What’s the Story) The Morning Glory, do Oasis. Primeiro que acho que as composições do Noel Gallagher são espetaculares, eles podem ser meio chatinhos e tem muita gente que torce o nariz pro Oasis. Mas em 1995, quando saiu o disco, a música estava tomada pelo eletrônico e estava uma fase péssima pro rock, o Kurt Cobain tinha morrido, o grunge tinha passado, então a minha irmã trouxe fresquinho lá da Inglaterra. Ouvi e é uma camada de guitarras, tem aquele wall of sound, que é muito inglês. Tem Champagne Supernova, Don’t Look Back In Anger, Some Might Say, composições perfeitas. Óbvio que faltam muitas outras, mas esses me representam bastante.