Reconhecido pelo seu trabalho como tecladista do Maroon 5, PJ Morton lançou o seu nono álbum solo, Cape Town to Cairo, uma viagem pela África que começa na África do Sul e segue através da Nigéria, Gana e Egito, envolvendo artistas africanos como Fireboy DML, Mádé Kuti, Asa, Ndabo Zulu e Soweto Spiritual Singers, além de produtores como P.Prime e The Cavemen.
PJ Morton conversou com o Blog n’ Roll sobre suas experiências ao escrever e gravar enquanto pesquisava a música e os artistas locais durante sua viagem, com o objetivo de completar o álbum em 30 dias. Ele também falou sobre o que o motivou fazer a viagem, os aprendizados e as principais influências. Confira abaixo!
O QUE TE MOTIVOU A FAZER ESSA VIAGEM PELA ÁFRICA??
Foi uma combinação de coisas. Inicialmente, começou como uma ideia pequena. Meus parceiros, a Empire (selo), perguntaram se eu queria colaborar com alguns artistas africanos, e foi aí que tudo começou. Então, minha equipe e eu começamos a conversar. Eles sugeriram fazer um álbum na África, o que achei interessante.
Comecei a fazer algumas pesquisas e olhei para todas as coisas sobre Paul Simon e Graceland e o como isso ficou enorme na África do Sul. Mas também vi algumas críticas, como ele foi lá e pegou os sons, mas os trouxe de volta para os EUA e usou para criar músicas que não necessariamente se conectavam com a África.
Então, pensei que talvez quisesse fazer isso, mas decidi que ficaria 30 dias e criaria tudo lá. E não iria apenas para um país, o que na época eu não percebi, era um pouco louco. Mas eu disse: “vamos para quatro países”. Vamos para a África do Sul, Nigéria, Gana e até o Egito.
Estou feliz por não ter percebido o quão grande seria essa empreitada, porque provavelmente teria reduzido um pouco. Mas estou muito feliz por termos feito dessa forma. Porque isso me forçou a lidar com as verdadeiras consequências. Fez com que fosse uma experiência real. Criei algo belo.
QUAIS FORAM OS ALTOS E BAIXOS DA SUA VIAGEM??
Bom, sobre os altos, assim que pousei na Cidade do Cabo (África do Sul) foi maravilhoso. Acho que, sendo dos Estados Unidos, muitas vezes não nos mostravam imagens da beleza. Sempre vimos as piores partes da África, as mais pobres, nada realmente mostrando a riqueza e a beleza. Então, isso foi realmente um ponto alto para mim.
Ficar na casa de (Nelson) Mandela, estar em seu quarto e me apresentar lá certamente foi um outro destaque.
Por fim, pousamos em Lagos (Nigéria) no aniversário de Fela Kuti. Então, a última noite da comemoração do festival dele estava acontecendo e pudemos ver seu filho Femi Kuti se apresentar. Aliás, Máré Kuti está no álbum. Houve tantos altos.
Eu não diria que isso foi um ponto baixo, mas como uma realidade, foi visitar a Costa do Cabo, em Gana, e ir às masmorras onde meu povo foi escravizado e levado para o novo mundo. Foi certamente pesado. Como eu disse, eu não chamaria isso de ponto baixo, mas isso ainda está aqui, a cena do crime ainda está aqui. Então, isso foi revelador, mas acho que tudo isso foi necessário para a viagem.
DURANTE SUA PESQUISA PELOS SONS, HOUVE ALGUM RITMO ESPECÍFICO QUE TE EMOCIONOU MAIS DO QUE OS OUTROS??
Muitos. Acho que, para mim, o highlife ganense fala comigo. Sinto que talvez haja algo com New Orleans. Algo aconteceu onde eles compartilharam essas coisas e foi assim que chegamos à música de New Orleans. Porque isso me toca de forma tão natural. E a maneira como os metais tocam, há algo que não precisei decifrar. Eu simplesmente entendi imediatamente.
Certamente com o afrobeat também, com a conexão do funk com o afrobeat de Fela [Kamuti]. Sempre me conectou. Fomos aos clubes e experimentamos tudo. Até fui com pés de galinha, está me entendendo? Me envolvi em tudo e deixei todas essas coisas me inspirarem. E depois filtrei tudo para ver o que significou para mim.
Mas sim, muitos desses sons realmente me inspiraram e me conectaram nesses 30 dias de experiências em tempo real. No dia seguinte ao meu desembarque na Nigéria, fui à celebração e senti toda essa música de Fela. E no dia seguinte, fui ao estúdio e comecei a trabalhar. E pensei, peraí, isso é funk, mas peraí, isso é afrobeat, e então pensei, bem, eles são primos, eles são conectados. Mas então foi como uma engenharia reversa porque não assisti ao documentário de Fela até depois de sair da África onde percebi que Fela chegou ao afrobeat combinando o highlife ganense com o jazz. E com o funk de James Brown. Quando ele viu James Brown, isso conectou com ele. É assim que posso ter a energia.
Então, sempre foi uma troca e não percebi que isso seria uma troca. Pensei que iria para a África fazer um álbum africano porque estou na África. Mas não. Foi realmente eu trazendo um pouco de New Orleans também e misturando essas coisas, e tendo meus metais de Nova Orleans sobre esses ritmos africanos, e criando algo fresco e novo, mas tudo conectado. Então, isso estava acontecendo em tempo real e realmente me surpreendendo. Eu nem sabia disso no momento, processei isso depois.
VOCÊ JÁ PENSOU EM VIR AO BRASIL E EXPLORAR A MÚSICA DE RAÍZES AFRICANAS AQUI??
Já pensei. E eu amo isso. Toda vez que estive no Brasil, senti essa mesma conexão. Agora simplesmente não consigo deixar de ouvir e ver a África. Está em tudo. Mesmo como All the Dreamers no álbum, tem uma sensação de algo afro-cubano ou brasileiro. É quase como se essas coisas sempre estivessem lá e eu só não percebia.
Em New Orleans há uma conexão tão grande com essa música, essa linha, toda essa música está na música de New Orleans. E foi um grande centro onde tudo isso estava presente. Adoraria ir ao Brasil. Talvez pudesse fazer outro projeto de 30 dias.
Com o Maroon 5, fomos a outras partes do Brasil e, em certos lugares que visitamos, vi pessoas com pele mais escura. E eu pensei, uau! Vejo tanta de África aqui que normalmente eles não costumam mostrar do Brasil, mas em certos lugares que você vai, você realmente começa a sentir isso.
VOCÊ JÁ OUVIU FALAR DO FUNK BRASILEIRO?
Não, acho que não ouvi o funk brasileiro, não.
VOCÊ ESTÁ PLANEJANDO VIR AO BRASIL PARA PROMOVER SEU ÁLBUM?
Sim, estamos conversando sobre isso. Sei que havia uma data em mente. Nada foi confirmado ainda. Sei que deve ser no final deste ano. Não tenho certeza se vai acontecer, então não quero prometer nada, mas certamente está em nossos planos e queremos ir.
Tive a chance de tocar em São Paulo no ano passado, apenas um show de piano. E cara, os fãs brasileiros, como sempre, são amantes da música, também me lembram de casa. Isso é algo que sempre percebi, que faz parte da cultura, da mesma forma que em New Orleans. Você não precisa ser músico. A música é apenas uma parte de tudo que fazemos, então não tem como não ser inclinado pela música. O Brasil sempre me faz sentir assim. E então, mal posso esperar para voltar, especialmente com minha banda e com Afro Orleans, e realmente trazer tudo isso para o Brasil. Mal posso esperar.
VOCÊ SE DISSOCIA POR COMPLETO DO MAROON 5 NA CARREIRA SOLO OU TEM SEMELHANÇAS SONORAS PARA VOCÊ?
Não, acho que é uma coisa bonita. São apenas duas partes da minha vida. Elas não se sobrepõem muito. É como se fossem duas coisas totalmente diferentes, mas isso me permite fazer coisas como eu fiz em São Paulo, que foi fazer um show de piano. Foi isso que me levou ao Brasil e, porque eu tinha tempo lá, pude fazer minhas próprias coisas também.
Além disso, somos tão amorosos e apoiamos uns aos outros, isso realmente não atrapalha e não há necessidade de me dissociar. Amo tudo o que faz parte de mim e que me permitiu ter essa vida e essa carreira. Então, estou orgulhoso do meu trabalho solo, estou orgulhoso do Maroon 5, orgulhoso de qualquer outra coisa à qual eu esteja conectado.
VOCÊ ACHOU QUE A PERSONALIDADE DOS NEGROS SUL-AFRICANOS É DIFERENTE DAS DOS AMERICANOS?
Para ser honesto, senti que eles são aparentemente pessoas mais doces. Simplesmente acolhedoras, pessoas calorosas. Não diria tão diferentes. Isso me lembra o sul dos EUA, de onde sou, onde somos pessoas calorosas. Falamos com você, mesmo que não o conheçamos, andando pela rua. É quem somos. Parecia estar em casa.
Eu continuo dizendo isso. Não quero ser clichê, mas em todos os lugares que fomos e quando me disseram “bem-vindo a casa” quando cheguei à África do Sul, eu realmente senti isso. As pessoas pareciam realmente acolhedoras, até mesmo os amigos com quem colaboramos. Xivonaki Manzini, que é co-produtor de algumas músicas como Count On Me e Thank You, é sul-africano e se tornou um amigo, um amigo para a vida toda. Nós nos conectamos dessa maneira. Achei que as pessoas eram simplesmente calorosas e acolhedoras. Eles estavam felizes que eu estava lá e deixaram isso bem claro.
NA MÚSICA SIMUNYE (‘SOMOS UM’ NA LÍNGUA ZULU), VOCÊ CANTA “VAMOS FECHAR A LACUNA DE ÓDIO ENQUANTO AINDA HÁ TEMPO”. VOCÊ ACHA QUE ISSO ESTÁ ACONTECENDO? OU QUE VAI ACONTECER ALGUM DIA?
É aspiracional. Eu não posso parar de ter esperança. Não posso parar de acreditar que isso é possível, porque senão, o que nos resta? Certamente acho que seguimos na direção errada mais recentemente do que há muito tempo. Eu sempre penso que não há outro caminho a não ser subir.
Está ficando tão ruim que só posso imaginar que vamos nos cansar disso e dizer: “Chega, por que não tentamos nos unir? Nunca tentamos fazer isso antes. Vamos ver o que acontece se apenas nos unirmos“. Sei que há tanto ódio por aí, mas tenho que acreditar que isso ainda é a minoria. O ódio ainda fala mais alto, então sempre parece maior porque é o mais barulhento, mas não acho que seja a maioria.
Acho que, no final das contas, todos queremos as mesmas coisas: ser felizes, não ser machucados, amar, ter uma ótima vida e ver nossos filhos e as gerações futuras terem ótimas vidas. Não acho que isso seja divisório. Acho que a maioria de nós acredita nisso. Eu simplesmente acredito que somos um só e somos melhores quando estamos juntos.
AGORA FAREI UMA BRINCADEIRA RÁPIDA. VOU MENCIONAR ALGUNS NOMES E VOCÊ FALA O QUE VEM À MENTE SOBRE ESSAS PESSOAS, OK?
MÁDÉ KUTI
Para Mádé, legado é o que vem à mente, vindo de uma linhagem incrível com Fela Kuti. Mádé é filho de Femi Kuti e AMO vê-lo mantendo vivo o espírito de Fela. Ele é tão talentoso e está mantendo isso vivo. Fiquei feliz de poder me conectar com ele.
STEVIE WONDER
Meu mentor, meu herói. Um sonho que se tornou realidade. O fato de eu ter feito qualquer música com Stevie Wonder está além do meu sonho mais selvagem. Isso é literalmente o que pedi quando era criança. Não é sempre que você vê um sonho se tornar realidade. Isso é literalmente um sonho que se tornou realidade. Sim, esse é o meu cara.
LIL WAYNE
Lenda de New Orleans. Assisto Wayne desde que ele tinha 14 anos e não podia usar palavrões em suas músicas. Ele arrumou meu primeiro e único contrato com uma grande gravadora, me deu uma chance. Sempre serei grato à Young Money por isso. Ele é uma lenda. Ele é uma lenda de New Orleans
ADAM LEVINE
Um dos meus melhores amigos. Meu colega de banda. Passo mais tempo com ele do que com minha própria família. Esse é meu irmão para a vida toda. Sou muito grato. Outra pessoa que me deu uma chance e sempre cuidou de mim e mostrou amor por mim. Esse é meu irmão.
PRA FECHAR, ME FALE SOBRE UM ÁLBUM RECENTE QUE VOCÊ AMOU E ME INDICA.
Ótima pergunta! Eu diria algo de Kendrick Lamar. Gosto de ouvir coisas que são diferentes do que faço para me inspirar. Acho que esses últimos álbuns de Kendrick me inspiraram a pensar fora da caixa e trazer isso para o meu mundo. Sempre vai soar diferente. Essas coisas me influenciam.