Única e imperdível foram dois adjetivos certeiros para descrever a passagem da Mega-Monsters Tour – formada pela banda norte-americana Mastodon e a francesa Gojira – pelo Brasil nesta terça-feira (14), no Espaço Unimed, em São Paulo.
Aliás, o público de 8 mil pessoas, quer estivesse presente para ver o Gojira ou Mastodon, aproveitou essa oportunidade e deu um show próprio, seja entoando praticamente o setlist inteiro a plenos pulmões, seja entrando em catarse nos mosh pits.
Mastodon abriu o evento às 20h20 ao som da plateia bradando o nome da banda, que foi seguido pela faixa Pain With an Anchor, primeira de seu álbum mais recente Hushed and Grim (2021). Essa foi uma das poucas diferenças do setlist do show da semana passada na Cidade do México, que abriu com The Wolf Is Loose (single de Blood Mountain, 2006). Mas a escolha de Pain With an Anchor foi certeira e empolgou o público logo de cara, que foi à loucura com os solos de guitarra.
A plateia voltou a bradar “Mastodon!” a plenos pulmões na introdução da segunda faixa, Crystal Skull. Fãs se espremiam uns entre os outros para a formação de um dos vários mosh pits que se sucederam, música após música, na apresentação do Mastodon, incluindo a canção seguinte, Megalodon, do álbum de sucesso Leviathan (2004).
Os gritos de apoio continuaram. A banda pouco precisou fazer para animar o público, que já sentia sua falta após nove anos sem uma apresentação no Brasil. “Isso é inaceitável”, declarou o baterista e um dos vocalistas, Brann Dailor, ao fim do show.
Dailor brilha tanto na bateria quanto nos vocais e no carisma, mas toda a banda merece méritos: a qualidade dos vocais e a performance instrumental parecem sair diretamente do álbum do estúdio e, ao mesmo tempo, soam orgânicos – uma combinação perfeita para uma performance impecável. E entre os responsáveis por tal performance está o brasileiro João Nogueira, tecladista da banda, que brincou: “brasileiro só se mete em rolê aleatório!”
Seja pelo show envolvente, seja pelo amor mesmo, o público não esmaeceu por um segundo em sua própria performance. Cantaram junto em Divinations, foram embalados por Sultan’s Curse, mais um mosh pit na faixa seguinte, Bladecatcher, além de pulos e gritos em Black Tongue.
Entoaram The Czar e iluminaram a pista do Espaço Unimed com a lanterna dos celulares. Praticamente dividiram os já vários vocais da banda em Halloween. A seguir no setlist, o sucesso High Road e a outra faixa do álbum mais recente, More Than I Could Chew.
O bis contou com as canções Mother Puncher, Steambreather e, para fechar com chave de ouro, Blood and Thunder, um dos maiores sucessos da banda – a escolha perfeita para dar um último gás no encerramento do primeiro show.
Gojira para fechar a noite
Talvez tão aguardada quanto – na fila de espera, era difícil dizer se haviam mais fãs trajados com camisetas do Gojira ou do Mastodon -, a banda francesa iniciou o set com uma contagem regressiva de 180 segundos e abriu com Born for One Thing, primeira faixa de seu álbum mais recente, Fortitude (2021). A energia do show anterior não se dissipou no público nesta canção, que entoou, em uníssono, We were born for one thing!.
O setlist foi o mesmo do show da Cidade do México e bem parecido com o da última passagem da banda pelo Brasil, no Rock in Rio do ano passado, quando substituíram o Megadeth no lineup, mas agora com mais algumas músicas.
Enquanto Mastodon trouxe um setlist mais variado, incluindo apenas duas faixas de seu álbum mais recente, o setlist do Gojira possuiu conhecidas do público desde From Mars To Sirius (2005) até agora, mas investiu mais em Fortitude (2021), com cinco canções no total.
Gojira foi bem mais interativo com o público ao longo do show, pedindo para fazer (ainda mais) barulho, o que foi atendido nas faixas Backbone e Stranded – a segunda, um dos maiores sucessos da banda, levou um belo coro da plateia, que mostrou conhecer bem a letra.
Flying Whales, do álbum From Mars To Sirius (2005), considerado por vários críticos o melhor da banda, foi um dos pontos altos da apresentação. A cada canção, a iluminação mudava de acordo com a paleta de cores do álbum. Durante esta, as luzes azuis, o canto da plateia e o som das baleias transmitiram a sensação do oceano – calmo a princípio, mas com águas que logo se tornaram cada vez mais agitadas com um dos maiores mosh pits da noite.
O show seguiu enérgico com The Cell e The Art of Dying. Na sequência, o solo de Mario Duplantier, considerado um dos melhores bateristas do mundo, exibiu seu estilo intenso (visto em todas as músicas) e hábil. O público seguiu o pedido quando o músico exibiu uma placa escrito para que gritassem “Mais alto, p*rra!”, em portugês, e foi recompensado com outra escrito, “Aí sim, car*lho!”
A oitava canção foi Grind, e na sequência, uma breve fala do vocalista Joe Duplantier sobre como é difícil encontrar outro mundo que seja apropriado para a humanidade, e que “é melhor ficar por aqui”, que introduziu a faixa Another World. A letra fala, justamente, sobre a aflição do protagonista de encontrar outro mundo, pois crê que o fim do nosso já está próximo – em referência aos problemas climáticos sem precedentes na história da nossa sociedade, tema recorrente em suas composições e que é uma das maiores bandeiras do Gojira.
O público cantou junto em Oroborus, faixa de abertura do álbum The way of all flesh (2008), e Silvera (Magma, 2016). Não houve tanta movimentação física do mesmo durante todo o setlist do Gojira como em Mastodon, ou seja, menos mosh pits – talvez pela menor intensidade de algumas canções -, mas os fãs mostraram que continuavam sim, bastante animados, com gritos de torcida “Olê, olê olê olá, Gojira!”, que renderam um agradecimento do vocalista.
The Chant é o tipo de canção que foi feita para shows. Joe Duplantier mais uma vez falou ao público, brincando: “A letra só vai aaaaaah! Viram? Já é a primeira nota da canção!”, e adicionou em seguida, falando a cada presente no público. “Se você está passando por um momento difícil na vida, esta é a hora de colocar para fora… e cantar junto”.
Este foi, talvez, um dos momentos mais emocionantes do show e mostrou a sintonia da banda com o próprio público. O entoar da canção, do ponto mais alto ao mais baixo da nota, preencheu a casa e continuou mesmo após o fim da música, com uma performance à capela de arrepiar.
“Vocês são o show!”, bradou Joe ao microfone, e ele não podia estar mais correto.
A última canção foi a clássica L’enfant sauvage, do álbum homônimo lançado em 2012. Mais gritos de torcida, e no bis, The Heaviest Matter in the Universe, talvez uma das melhores representantes do estilo mais pesado do Gojira, que contou com o coro do público mais uma vez.
Amazonia foi um espetáculo por si só, especialmente no refrão, “There’s fire in the sky”, quando labaredas de fogo ilustraram a tela. A canção tem um peso especial. Como o vocalista Joe Duplantier explica ao público, ela foi inspirada pelo povo indígena Guarani Kaiowá e, em seu lançamento, fez parte de uma campanha de arrecadação de fundos para a APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil). O refrão, “The greatest miracle / is burning to the ground” faz referência aos incêndios que se espalharam pela floresta amazônica em 2019.
O Gojira tem grande envolvimento com a causa indígena e Joe Duplantier, inclusive, já participou de protestos em Brasília contra o projeto de Lei 490, do Marco Temporal, que ameaça a demarcação de terras indígenas.
O show fechou com um dos maiores sucessos da banda, The Gift of Guilt, que rendeu outro grande e intenso mosh pit.
Antes do encerramento, Mario Duplantier mostrou por que além de exímio baterista, é divertido: com uma bandeira do Brasil e um bote inflável, ele remou pela plateia, que o levou para um longo passeio por um mar de braços.
Setlist
Mastodon
Pain With an Anchor
Crystal Skull
Megalodon
Divinations
Sultan’s Cruse
Bladecatcher
Black Tongue
The Czar
Halloween
High Road
More Than I Could Chew
Bis:
Mother Puncher
Steambreather
Blood and Thunder
Gojira
Born for One Thing
Backbone
Stranded
Flying Whales
The Cell
The Art of Dying
Solo de bateria
Grind
Another World
Oroborus
Silvera
The Chant
L’enfant sauvage
Bis:
The Heaviest Matter of the Universe
Amazonia
The Guift of Guilt