Quando vemos o “ciborgue” Geo nos palcos, mostrando seu lado virtual, não imaginamos que por trás existe Geovanna Mantovani, tímida, batalhadora e determinada, gente como a gente.
“Eu era muito tímida no palco e depois que criei esse ‘persona’ de robô da internet, ficou mais fácil. É um pouco de mim com um pouco do personagem na lógica, mas quando me ponho na pele do robô, me solto mais”.
A timidez de Geo era uma barreira criada por conta das críticas que ouvia. “Me falavam muito que só podia ser cantora quando ficasse magra e fosse bonita. Então fiquei muito tempo sem me expor com medo de ser julgada, tanto pela gordura quanto pelo meu estilo diferente. Hoje em dia estou nem aí! É meio brega dizer isso, mas você vai ficando mais velho e vai ganhando mais experiência, percebendo que certas coisas como seu corpo, não importam tanto assim, afinal é só um corpo”.
Hoje em dia, encontrou seu papel e se sente mais segura para dominar o palco, coisa que faz muito bem! “No geral eu venho sem apego, só quero dar meu melhor sempre”.
“Ano passado entrei em um processo grande de ganhar palco. Eu era muito contida e passei por essa etapa para conseguir chegar aqui e ver que dá para apresentar um trabalho legal. Junto com a equipe conseguimos usar projeção, visual, performance, testar coisas novas”.
De Santos para o Brasil, Geo acredita que graças ao caminho que ela tomou, conseguiu o destaque que vem conquistando. “Sair de Santos no fundo foi bom, pois a vida noturna não existe muito para o meu som. É legal que eu tive que ir para São Paulo, fazer tudo o que fiz, para conseguir tocar no Sesc em Santos. Muito louco isso”.
Criando o ciborgue
Ao acompanhar um pouco do backstage de Geo, vi que ali se encontrava um grupo de amigos, como qualquer outro. Em um ambiente descontraído, eles se arrumavam e conversavam sobre tudo.
Desde piadas à assuntos cabeças, a conexão entre eles é forte e necessária. “Temos várias reuniões para essa parte criativa. Pensamos juntos o que vamos usar, por exemplo, cada música temos cores específicas e acabamos adicionando algumas coisas novas com o tempo. Vamos compartilhando referências, temos uma boa comunicação. Todo mundo pira junto”.
“Às vezes parece algo muito fácil quando já estamos no palco, mas acho que muito vem da figura do artista essa ilusão de que tudo é lindo e perfeito. Porém, existe um trabalho gigantesco por trás”. Realmente, Geo conta com uma equipe grande que ajuda a transformar o complicado em glamouroso.
No total, são mais ou menos dez integrantes e o curioso é que quase todos se conheceram pelo Twitter. “É a banda do Twitter”, brincaram. A parte instrumental é composta por Gui no baixo (responsável também pela produção musical), Aécio na bateria, Larieva no trompete e Geo, claro, nos vocais.
Gui foi o primeiro a se juntar a banda. “A gente se conheceu pela internet e eu comecei a produzir umas coisas para ela. Estamos juntos desde o começo, eu produzo os beats e no show eu toco baixo e vou soltando os sons feitos com a programação”.
A produção geralmente acontece de forma bem interativa. Geo compõe e grava na sua casa, manda o material para Gui e ele constrói o instrumental por cima. “No final das contas todo mundo dá um pitaco e tempo depende muito. Às vezes, em uma semana já está pronto, como foi o caso de Comunicação. Ela me mandou, deu três dias eu já enviei uma demo e depois de uma semana estava pronta”, comenta Gui.
Na bateria, eles contam com Aécio. “Desde de 2016 tem shows no meu estúdio Aurora, em São Paulo. Um dia a Geo foi se apresentar e começou a ensaiar por lá. Depois de um tempo, eu já sabia todas as músicas, então comecei a participar dos ensaios, até que resolvi mandar uma mensagem pedindo para entrar”, conta ele.
“O último robô que eu comprei foi a Lari”, brincou Geo. Larieva tem um papel pouco visto em bandas de rock e entre mulheres: ela toca trompete. “Cresci em meio de orquestra e sempre fui a única menina. Quando entrei na faculdade de música fiz trompete clássico e comecei a enjoar do meio clássico, por ser muito machista. Percebi que gostava de rock, música popular, até que comecei a fazer contatos”.
“Colocar o trompete em uma banda mais de rock ou pop é diferente, geralmente vemos em jazz, ou axé. No rock é meio raro, acho que é porque as pessoas não ousam tanto. Existe um estereótipo do trompetista, mas com tanta coisa nova, eletrônica, referências, a gente também tem que ter a mente aberta. Isso é empreendedorismo na música”, diz ela.
Lari e Geo se conheceram em um grupo feminino, criado para colaborarem entre si. “Nos conhecemos no Circuito Das Mina Tudo, um grupo colaborativo só de mulheres, onde todas se ajudam nos projetos musicais. O legal é que as meninas da música sempre foram muito unidas e estão cada vez mais”, conta Larieva.
Além de Lari, o grupo conta com Camila (assessora e produtora) e toda sua equipe técnica, composta só por meninas. Laura faz a luz e Roberta cuida do som.
“A gente percebe que os técnicos da casa são geralmente homens. Já aconteceu comigo de pedir para o cara meu som mixado e ele falar ‘não, o jeito que eu to fazendo aqui é melhor’ e eu ter que explicar que meu som não é esse. São micro-agressões, micro machismos que a gente sofre”, comentou Geo.
Existe também a parte da produção que conta com Edu e Lucas, namorado da Geo, responsável por criar o efeito de palco 3D. Na parte estética, eles trabalham com a marca de roupa “Marca que Fala”. “São peças minimalistas de todos os tamanhos, inclusive linha plus size!”.
Gabriel é o responsável pela maquiagem e juntos, criam um conceito para cada show. “Figurino e maquiagem são coisas bem conceituais, gosto de deixar bem caracterizado. Ainda mais agora que eu sou um robô, dá para testar minhas coisas!”.
O robô de Geo foi criado com pedaços de sua essência, talento e algumas inspirações. “Me inspiro no pop clássico como Madonna, a própria Lady Gaga, e também na galera que trabalha comigo. Sou fã do Gabriel por exemplo. Eu procuro trampar com pessoas que admiro”.
A ciborgue Geo, junto com seu time, vive em testes, mudando visual, palco e conceitos, sempre em busca de aprimorar o sistema.
Hora do show
É impressionante ver a mágica acontecer. Depois de dias de trabalho, todo o processo e conceito se transforma em uma hora e meia de um show intimista e futurista.
Em um momento, a plateia chegou pertinho do palco, como pedido pela artista. Claro que os fãs aproveitaram o espaço pequeno para se conectar nesse mundo cibernético criado ali. Outro instante, a cantora desceu do palco e andou pela platéia, interagindo com o público.
No fim do show a conexão foi maior ainda, quando Geo tirou fotos e conversou com quem estava lá. Em um setlist de 15 músicas, apresentadas no Sesc de Santos, todos estavam em pura sincronia, mostrando a verdadeira essência de sua música.
Parece até fácil, olhando da platéia, mas ao passar algumas horas conhecendo a equipe e vendo um pouco da preparação, é possível perceber que para as engrenagens funcionarem, existe um processo árduo por trás.
Geo, Gui, Aécio, Larieva, Camila, Laura, Roberta, Edu, Lucas, Gabriel e todos os outros robôs, compõe um show de simpatia, talento e dedicação, com suas loucuras e mecanismos. “Eu sou louquinha mas tenho um coração bom”.