*FABRÍCIO DE SOUZA
Desde garoto escutava os lendários discos ao vivo de bandas clássicas de rock, como o No Sleep Till Hammersmith do Motörhead, e o Tokyo Tapes do Scorpions. Eles me marcaram no início da minha caminhada no rock.
Posteriormente, estive na gravação do disco ao vivo do Ratos de Porão, que era uma das maiores bandas do estilo no Brasil naquela época. Mas quando já estava tocando no Garage Fuzz, não imaginava fazer uma produção assim para a banda. Pois achava que seria tecnicamente e financeiramente inviável fazer uma produção desse porte com qualidade dentro da realidade da cena underground brasileira.
Mas isso ficou na minha cabeça até quando escutei um CD ao vivo do Ação Direta, que foi gravado numa tour que fizeram na Europa. O material foi gravado apenas com um MD (pra quem não sabe é um espécie de gravador digital). Achei o CD muito bom, a essência e a pegada estavam toda ali e aquilo me motivou.
O início da pesquisa
Comecei a pesquisar solitariamente como eu poderia montar uma estrutura que pudesse botar esse sonho em prática, correspondendo ao nível de qualidade que a banda sempre procurou. Então comecei essa pesquisa/estudo do zero. Me lembro que comprei um caderno para fazer todas as anotações das especificações técnicas e de orçamento.
No início eu pensei em pegar os equipamentos avulsos, alugar mesa de som de um, microfones de outro, gravador digital e aí por diante… Fui ligando e procurando donos de estúdios, técnicos, empresas de locação de equipamento. Quando me dei conta, o caderno com todas essas informações já estava passando da metade (risos). O quebra-cabeça ainda não estava montado e foi aí que fiz uma ligação que mudou todo o rumo da produção.
Nesse período, poucos meses atrás, a gente tinha gravado uma demo tape com as músicas Embedded Needs e Some Warm at Least, que eram inéditas, no estúdio do Pompeu, vocalista da banda Korzus, em São Paulo.
A unidade móvel que mudou tudo
Nessa de ligar para o pessoal que tinha estúdio, liguei para ele. Expliquei o que eu estava querendo fazer. Ele me falou que o Korzus tinha gravado um ao vivo há pouco tempo, na apresentação deles na primeira edição do Monsters of Rock. Em resumo, eles tinham contratado uma unidade móvel, que era um caminhão baú com um estúdio excelente dentro.
Então indaguei sobre o valor, já que essas unidades móveis eram caríssimas para alugar. Mas ele me falou que estavam com dificuldades financeiras e que de repente, poderiam fazer um bom preço pra mim.
Liguei para eles, negociamos e apesar de o valor ser um pouco de risco, fechei o negócio. Eu sabia que provavelmente teria a qualidade que procurava, mas ficou a pressão para a venda de ingressos, custear tudo.
Show em casa
O local do show para a gravação não poderia ser outro: o Bar do 3. Como já comentei nas outras histórias, era a casa onde fazia a maioria dos eventos dessa época. As bandas convidadas foram o Street Bulldogs, que muitas vezes dividiam o palco com a gente em São Paulo e em festivais, além das meninas do Lava, que representam bem o movimento das riot girls, que crescia muito naquele período.
Eu sabia que precisava vender ingressos para fazer a coisa acontecer. Então caprichei na divulgação, contratando até coladores de cartazes lambe-lambe para forrar a cidade. Não tinha eventos desse estilo que usasse esse tipo de divulgação em Santos naquele momento, mas arrisquei e fui seguindo nessa minha ideia.
Quando chegou no dia do show, a primeira grande notícia: os ingressos estavam esgotados. Foram quase mil ingressos vendidos antecipados, o que tirou um peso das minhas costas.
Na passagem de som, à tarde, chegou a unidade móvel. Ficamos maravilhados com aquela tecnologia de ponta, algo que nunca tínhamos visto. Parecia que tinha pousado uma nave alienígena na frente do Bar do 3 (risos). O pessoal da técnica começou a montar tudo. Quando fomos passar o som, ficou combinado que eles avisariam de dentro da unidade quando estaria “valendo a gravação”.
E chegou o grande momento: casa lotada, muitos fãs de várias cidades, surfitas, skatistas, muitos músicos santistas de bandas como Charlie Brown Jr, Cajamanga, White Frogs, músicos da noite santista. Até que de dentro da unidade móvel, os técnicos avisaram: pessoal, já tá valendo! E o Alexandre Farofa soltou a célebre frase: “AGORA TÁ VALENDO!!”
*Fabrício de Souza é baixista do Garage Fuzz e foi responsável pela vinda de vários shows internacionais a Santos.