ALESSANDRO ATANES
“Rimbaud Rock” é um poema que parece ter o nome feito especialmente para esta seção do Blog’n Roll. É do livro “Tratado dos anjos afogados” (2008), de Marcelo Ariel, autor que também contribui para o espaço. Curto, segue na íntegra para algumas considerações posteriores:
RIMBAUD ROCK
É o nome da banda
No auge
do centésimo show
os músicos tocam
fogo no próprio corpo
no meio
de uma versão de ‘Purple Haze’
com trinta segundos.
Logo após a plateia
de onze mil adolescentes vai embora
mascando chicletes de cocaína.
Um deles de 13 anos comenta:
“Não eram eles, era um show holográfico.”
“E o cheiro de carne queimada?”
Outro comenta.
“Era o pessoal da primeira fila”
alguém responde.
Agora, às considerações: o título se refere a Arthur Rimbaud (1854-1891), autor de “Uma temporada no inferno” e “As flores do mal”, obras que lhe garantiram espaço entre os grandes da modernidade. Sua vida pessoal fez com que fosse interpretado como um pré-roqueiro, um predecessor do que seriam Bob Dylan e Jim Morrison, seus leitores. A ideia de clássico volta no sétimo verso, em que a música que a banda Rimbaud Rock toca é “Purple Haze”, de Jimi Hendrix.
Mas o poema avança negando os clássicos: a versão da música de Hendrix tem trinta segundos, tornou-se quase uma vinheta, e os integrantes da banda tocam não música, mas fogo em seus próprios corpos, performance que emula os grandes shows pirotécnicos de hoje com suas toneladas de efeitos e eletricidade que tornam-se mais atrativas que o próprio som. Tocar fogo em si mesmo não é o que falta para um monte de gente sem talento fazer?
Nesse tempo de chicletes de cocaína do poema, um futuro próximo pré-apocalíptico, até a própria performance nem de fato é de verdade: a banda é um holograma (uma analogia com o Gorillaz?)e o fogo não a atinge de verdade, mas queima, sim, quem chegou com quatro, cinco dias de antecedência e ficou na primeira fila.
Não está aí uma crítica ao rock que se transformou em simulacro de si mesmo?