3 de agosto de 1996: The Palace – Los Angeles, Califórnia. Nessa data, os Ramones realizaram o show número 2263, a última apresentação da carreira. Esse momento histórico ficou registrado no disco ao vivo We’re Outta Here!. Foram 32 músicas, grandes clássicos e convidados especiais. Uma despedida em grande estilo.
Apesar de terem nascido e se criado nos clubes de Nova Iorque, o último show do quarteto de Forest Hills aconteceu na Califórnia. Uma exigência do Comandante: Mesmo com os empresários planejando diversas possibilidades de realizar uma apresentação na casa da banda, Johnny Ramone estava morando em Los Angeles e desejou que o final da turnê fosse lá. Mesmo rebatendo as “acusações” na sua biografia.
Muitos fãs e os próprios integrantes da banda não gostam da forma na qual o show foi filmado, mas estou aqui para falar nos sentimentos de ouvir esse trabalho. We’re Outta Here! define bem o que eram os Ramones em 1996. O material não tem a energia vista em It’s Alive (1979) e perdeu um pouco a velocidade do Loco Live (1991). Mas a essência ainda continua por meio das letras e o jeito direto de tocar, sem enrolações ou “conversinhas”.
A clássica introdução de The Good, The Bad And The Ugly de Enio Morricone emendada em Durango 95 mostra que é um show dos Ramones. E assim começa uma sucessão de clássicos com Teenage Lobotomy, Psycho Therapy e a suprema Blitkrieg Bop. Não há descanso, apenas CJ Ramone gritando os famosos “One, Two, Three, Four”, quando necessário.
Um setlist recheado de canções que representam o que era a banda. I Believe in Miracles, I Wanna Be Sedated, The KKK Took My Baby Away, Commando, Sheena Is A Punk Rocker são alguns clássicos que entraram para o repertório de despedida. Músicas que não ficam de fora de nenhum “Best Of” feito por fãs ou especialistas.
A banda foi uma grande influenciadora da cultura pop, da mesma forma que foi bastante influenciada por ela. Stephen King era fã de Ramones e os integrantes eram admiradores do escritor; por isso a música Pet Semetery não ficou de fora. A versão punk rock para Spider-Man foi uma homenagem às histórias em quadrinhos e a própria cidade de Nova Iorque, afinal os escritórios da Marvel ficam na Big Apple.
A segunda parte do show teve alguns convidados e isso foi uma dor de cabeça para os técnicos que cuidavam do palco. As canções dos Ramones eram curtíssimas e eles não faziam grandes pausas entre uma música e outra. Ou seja, os roadies tinham que deixar tudo pronto e praticamente empurrar as pessoas para o palco quando era o momento certo.
Love Kills, uma homenagem ao emblemático casal punk Sid Vicious (Sex Pistols) e Nancy Spungen, teve a participação do ex-baixista Dee Dee Ramone. Ele foi responsável por compor boa parte das letras de todos os álbuns da banda, mesmo após a sua saída em 1989. Mas no meio da apresentação ele esqueceu as frases da música que ele mesmo escreveu. E sua resposta, ainda em cima do palco, foi: “Esse sou eu, esse é o meu jeito”. Sim, um músico fantástico e insano.
Os Ramones não estavam restritos ao mundo do punk rock. Muitos fãs de metal e de outros gêneros os admiravam. Em duas décadas na estrada, eles construíram amizades com outros artistas, como Lemmy Kilmister do Motorhead. Ele que compôs R.A.M.O.N.E.S. em homenagem aos companheiros de Nova Iorque. O baixista fez uma rapidíssima participação durante a despedida tocando a música feita por ele.
Apesar de viver relativamente no underground durante os anos 80, os Ramones foram exaltados e chamados de padrinhos da explosão do punk rock em 1994. Para criar essa relação entre “os criadores e as criaturas”, a banda convidou Tim Armstrong e Lars Frederiksen do Rancid. Juntos, eles tocaram uma excelente versão de 53rd & 3rd.
As bandas grunges dos anos 90 possuíam uma grande admiração pelo quarteto. Soundgarden e o Pearl Jam saíram algumas vezes em turnê com os Ramones. E alguns membros destes grupos participaram da apresentação final. Chris Cornel e Ben Shepherd fazem uma discreta participação em Chinese Rocks. Entretanto, muitas pessoas devem invejar Eddie Vedder por cantar Anyway You Want It de Dave Clark Five, a última música que eles tocaram ao vivo.
https://youtu.be/SgNjMirc0PE
Foram 22 anos rodando o mundo dentro de vans. Incontáveis “One, Two, Three, Four”. E após a noite de 6 de Agosto de 1996, o legado dos Ramones continuou até hoje. Os integrantes da formação original não estão mais entre nós. Os remanescentes continuam usando o sobrenome para divulgar seus trabalhos e são bem recebidos em todos os lugares do mundo. Anualmente, pelo menos um dos integrantes do grupo faz uma turnê pelo Brasil, por exemplo.
Lógico que em alguns casos, a grande marca da banda está sendo perpetuada de forma meio estranha. O símbolo de revolução desenhado por Arturo Vega está estampado em camisetas das lojas de departamento e sendo consumidas por pessoas que nunca sequer ouviram um disco completo da banda.
Por outro lado, muitos artistas surgiram após o “Adios Amigos” de Joey, Johnny, CJ e Marky. Foram massivamente influenciados pelos quatro acordes simples e diretos. E dessa maneira surge belas homenagens como We Don’t Want the Airwaves dos israelenses do Useless ID.
*Algumas informações desse artigo foram retiradas dos livros: Na Estrada com os Ramones (Monte A. Melnick e Frank Meyer) e Commando (Johnny Ramone)
