NUNO MINDELIS
Olá pessoas antenadas !
Na última coluna escrevi sobre o álbum Blue & Lonesome, dos Rolling Stones. Ali dei um toque sobre como alguns consagrados artistas de ‘fígado Blues’, que resvalaram para sonoridades mais pop ao longo da carreira, tendem a voltar para o gênero agora que estão mais velhinhos. Provavelmente para sobreviverem às agruras e torturas psicológicas, preço imposto pela maldição da encruzilhada.
Será que é aquela quase infalível volta do exílio? Todo o exilado, sem exceção, quer voltar para o local onde nasceu. Um exilado sem volta enlouquece. Van Morrison aborda o tema no seu álbum Too Long in Exile, de 1993. Aliás, se me lembrarem falarei sobre ele adiante, é um dos melhores do bardo em 40 anos, na minha humilde opinião.
Voltando aos velhinhos (-: Robin Trower entrou numas em 2015 com o seu Something’s About to Change. As 12 faixas escancaram bem o estilo definitivamente muito peculiar do seu blues. Nada soa como o surrado “same old blues”, que não muda uma vírgula há mais de 40 anos, mesmo tendo sido aplicados exatamente os mesmos fundamentos; shuffles de Chicago, slows, swings etc. É que vêm embrulhados de outra forma. Para presente, eu diria.
O timbre da guitarra é algo que congelará o sangue nas veias dos que se ligam nessas filigranas. Ponto uma vez mais para Leo Fender (embora, cá para nós, soe mais para uma Gib Flying ‘Albert’ V) . Robin, que sempre usou Lespauls no Procol Harum, usa Stratocasters há muito tempo. Desde que trombou numa que Martin Barre (que só usava Gibson) tinha encostada só para slide guitar, num ensaio com Jethro Tull. Na época experimentou e gritou “é isto !!” E nunca mais largou. Se eu fosse venenoso e pudesse, perguntaria a caras como Trower , Gilmour, Jeff Beck e outros por que usam Fenders se as regulam até soarem como Gibsons. Reparem. Nenhuma delas soa como SRV, Jimi, Robert Cray ou Mark Knopler (em Sultans of Swing) que é o timbre central do protótipo. (A Jeff darei desconto, sei que o faz por causa do peso menor, ele mesmo disse isso lá nos anos 1970).
Em Fallen, segunda faixa, ficam bem evidenciadas as assinaturas blues e timbre de Robin Trower. Que sonzeira! Ao ouvir com atenção What You Never Want to Do (faixa 6) percebe-se a mesmíssima levada rhythm and blues eternizada por Junior Wells para Messing With The Kid. No mesmo sentido, Up And Gone também é um ‘Shuffle” de Chicago, a expressão maior do blues, o seu samba digamos.
Mas Robin Trower não quer pagar pau para a sonoridade original. E precisa? Não! Not the same old blues. Ainda bem. Até porque Trower é inglês, Chicago é bem longe dali e não colheu algodão como Muddy Waters ou BB King. Cada um no seu galho e cada resultado é igualmente importante e delicioso.
Em alguns momentos o álbum soa repetitivo dada a boa dose de melancolia que permeia a coisa toda. Ingleses são bons nisso de forma geral, melancolia, especialmente os mais velhos. E envelhecer reduz o metabolismo. A coisa pode ficar arrastada, como se se estivesse atravessando um rio com água pela cintura. Mas logo chega a margem redentora!
Se você quer saber o que anda fazendo um dos mais importantes guitarristas da história do rock e de onde veio esse seu rock, confira este trabalho.