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Crédito: Hugo Vicente Ferreira

Resenha de Shows

Maria Sil no Sesc: o show e os poemas que empolgam

A cantora Maria Sil apresentou no último sábado (14), no Sesc Santos, seu mais recente lançamento A Carne, A Língua, O Vírus. Fruto de uma produção independente, a cantora transita por assuntos como a aids, travestilidade e contexto político. E assim foi seu show, composto pelo que denomina de “camadas”.

Além das músicas, ilustrações, vídeos, iluminação, poemas e arranjo musical. Tudo isso conta para a experiência. Antes da apresentação, me recebeu em seu camarim, a entrevista consta no final da resenha do show.

O que posso adiantar é que me senti em contato com uma artista que tem um potencial imenso nas mãos e como ela mesmo diz “acho que ainda estou no início da carreira”. Que seja o primeiro de muitos.

O show teve músicas autorais do recente lançamento e do seu EP Húmus (2017), além de composições de outros artistas como Rita Lee, Gilberto Gil Belchior e uma homenagem para o MC Duda do Marapé. O público era mais adulto, muitos conheciam as músicas escolhidas.

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O show-manifesto

Às 20h18 de sábado (14), Maria Sil iniciava a apresentação do EP A Carne, A Língua, O Vírus, no Sesc Santos. Os aplausos da plateia antecederam manchetes de jornal ditas por ela. Todas relacionadas a aids.

Posteriormente, ela cantou Manchete de Jornal. De início, o público acompanhou os dizeres com palmas. Atrás, um vídeo com informações e dados sobre a aids.

Maria estava acompanhada de Dom Lino e Gustavo de Albuquerque nos instrumentos- os diretores musicais do EP. Eles utilizam o recurso de base eletrônica e tocam por cima do som pré-gravado fazendo as melodias ecoarem alto.

No meio tempo no qual descrevo o que estou vendo, Maria desce do palco, acompanhada do jogo de luzes, parte muito importante para a composição de suas denominadas “camadas”. No final da música, com o dizer Positivas Vivas, arranca aplausos da plateia e diz ser a primeira vez que apresenta o show completo.

Cazuza

Apresenta os músicos que a acompanham no palco e explica o seu show divididos em três etapas: aids, travestilidade e manifesto da política contemporânea.

A segunda escolha, O Tempo Não Para, conhecida pela voz de Cazuza. Nessa a plateia cantou alguns trechos. Ao terminar, abriu seus sentimentos.

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“Eu estou nervosa, mas estou muito feliz porque achei que não teria gente”.

E ainda explicou sobre a composição da letra de o Tempo Não Para. “Às vezes as pessoas cantam essa música numa brisa meio filosófica, refletindo sobre a vida, sobre a existência, como se a letra fosse sobre toda vida. E é importante lembrar que essa letra é sobre aids, sobre um tempo histórico muito específico, no qual as pessoas não tinham alternativa de tratamento. Onde elas estavam de fato caminhando para a morte. E outra coisa que poucas pessoas sabem é que uma mulher, que não vive com HIV, produziu muitas músicas sobre o assunto: Rita Lee. E eu vou cantar Vírus do Amor, uma música de 1985″.

Aí foi a vez de Silêncio, de A Carne, A Língua, O Vírus. Com o trecho “o caminho se faça se não abro com faca”.

Não consegui notar diferença na voz entre o ao vivo da gravação do EP. A voz era a mesma. Não desapontou. O clima era intimista. Ao final, pediu para a plateia cantar junto alguns trechos. Avisou que o som chega nas plataformas digitais nesta quinta-feira (19).

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Poemas

Posteriormente, ela falou que iria ler o poema Marias, de autoria própria. “De quantas Marias é feita uma caminhada? Os meus pés têm terra vermelha e areia branca. Têm mar de água transparente e rio de água barrenta. E ao meu lado tem Marias. Tem Maria que é virgem e tem Maria que é puta. Tem Maria das ervas e tem Maria dos Santos. Tem Maria das enxadas e Maria das palavras.Tem Maria que é sábia, tem Maria que é burra. Tem Maria dos ditados, e tem Maria dos melados. Tem Maria cangaceira, tem Maria da feira. Tem Maria José, e Maria João. Tem Maria que é ingrata e tem Maria que é do caralho. Tem Maria à frente de tanto macho”. Aplausos, aplausos.

Na escolha seguinte, Maria Ninguém, faixa composta por Carlos Lyra. Maria Sil convidou uma amiga para dançar no palco. Segundo ela, era “uma das homenageadas em Silêncio”. Na música, apareceu uma ilustração de uma mulher atrás.

Luiz Melodia

Pérola Negra (Luiz Melodia) foi a próxima escolha. O som do baixo e do violão com o jogo de luzes deu um ar muito sofisticado para a apresentação. Atrás, a ilustração de uma mulher.

Posteriormente, ela disse. “Bom, eu tenho uma reflexão sobre a sorte, sobre o privilégio que é colocar um trabalho no mundo. Infelizmente o ingresso é cobrado e eu tenho muita reflexão sobre isso. Minha mãe é uma poeta e até hoje não tem uma obra publicada. São mais de 300 poemas escritos. Foi em contato com essas mulheres que não estão na arte validada que aprendi muita coisa”. Em seguida, leu o poema Pobreza, escrito por sua mãe Vani dos Santos. No vídeo, uma mulher lendo seus escritos.

“Quando o Tancredo fala da pobreza, acho que ele não sabe o que ela faz na alma. Acho que ele não sabe o que significa o seu povo. Ser povo na alma. Quem vai pagar o que me deixou estreita demais? Caibo num cantinho e ainda me encolho. Sobra tanto espaço. Sobra tanto mundo. E eu aqui pequena”.

A música seguinte condiz totalmente com o assunto, Húmus, título de seu primeiro EP. “Com meu choro puro faço melodia, minha mãe é poeta e eu sou poesia”.

A plateia acompanhou alguns trechos. Em um certo momento, sentou no palco e uma melodia começou a tocar, outra música autoral (2017): Lacre In Tristeza. “Ninguém sofre nesta vida? Ninguém leva tapa na cara? Neste jogo de espelhos vai ficar quem se importar”.

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Duda do Marapé

Em seguida uma homenagem ao MC Duda do Marapé, morto com nove tiros em Santos, em 2011. Ela cantou Caí Lágrimas, que tem uma letra muito bonita. As luzes amarelas acompanhavam a batida do funk. Uma hora ela puxa o refrão com a plateia. Quando acaba, comenta “Brother, essa música é linda demais, eu fico chocada”…

Outro poema de sua autoria é recitado: Sobre a Pele. “É preciso respirar. Deixar o Sol. Beijar a pele. É preciso reparar. Sentir o som. Vibrar “no pelo”. Que sorte estamos vivas. Que sorte somos o agora. Entre pares e Paris. Entre a carne e a língua. Entre o vírus e a aids. Estamos vivas. Entre goles e golpes. Entre fardas e pragas. Entre falos e calos. Estamos vivas. Nossos pés caminham com as veias abertas. Nossas filhas nos miram com um olho. Nossas vias queimam e pedem socorro.Que sorte estamos vivas. Que sorte somos o agora”.

Chegando ao fim

Maria avisa que está nas últimas músicas. “Acho que vocês deviam levantar porque são bem dançantes, quem quiser né”.

Um rock envolve o ambiente é a chamada Cérebro Eletrônico, de Gilberto Gil. A ilustração de mamadeiras de pirocas passa enquanto a música é cantada.

Posteriormente falou das ilustrações feitas por Kako Arancibia, um mineiro que também vive com HIV e traz as referências para arte. Agradeceu a Hugo Vicente e Andrey Haag pelos vídeos usados no show, as 57 pessoas que apoiaram a construção desse EP. E a equipe que montou o show.

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“Desejo muito que a gente circule com esse show. Agradecer ao Fernando Henrique de Goes pela iluminação”.

Cantou Sujeito de Sorte e pediu para as pessoas “se achegarem”. Em seguida, foi a vez de Comportamento Geral, de Gonzaguinha. “Você deve rezar pelo bem do patrão, esquecer que está desempregado”. O jogo de luz foi intercalado pelas cores vermelha e amarela.

“Muito obrigada, agradecemos muito”, disse. Desceu do palco e começou a cantar Olhos Amarelos, do seu primeiro trabalho. O público acompanhou a música, principalmente o trecho. “Do segredo, da vergonha, e do medo de ser assim: Positivo”.

Era a última música, mas a plateia pediu mais uma. Nesse momento, Maria acatou o desejo e pediu para o pessoal gravar e postar nas redes sociais para ajudar na divulgação. Era proibido gravar no local, mas ela conseguiu que “a regra fosse quebrada”. Cantou Silêncio novamente.

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