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Arkie do BRock #10 – 45 anos do raro e obscuro Sociedade da Grã-Ordem Kavernista

Renegado pela gravadora, rodeado de lendas e atirado ao ostracismo comum aos trabalhos inclassificáveis à sua época, o obscuro Sociedade da Grã-Ordem Kavernista Apresenta Sessão das 10 completa 45 anos do seu semi-lançamento. O prefixo fracional deve-se à (ilógica) recolha dos discos 15 dias após terem deixado as prensas. O fato contribuiu para aflorar a mitologia que envolve o experimental e único registro a reunir Raul Seixas, Sérgio Sampaio, Mirian Batucada e Edy Star.

Exemplo do momento criativo e de vanguarda da produção musical brasileira de então, o álbum permaneceu décadas nas empoeiradas prateleiras da CBS (atual Sony Music). E só chegou às novas gerações graças a cópias piratas, arquivos digitais e reedições (mambembes) por selos independentes.

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Sem qualquer tipo de celebração pela data histórica, o disco comparável ao Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, e Freak out!, de Frank Zappa e The Mothers of Invention, ainda é um diamante bruto perdido da história do rock tupiniquim e, claro, da música popular brasileira. O desterro que o trabalho percorreu conflita com a sonoridade talhada nos sulcos e liberdade criativa para desafiar o Status Quo, mesmo que para isso o quarteto recorreu ao deboche e ironia – sutis armas para resistir aos anos de Chumbo; como na faixa Todo Mundo Está Feliz, que contrasta com o clima de horror após o AI-5.

A Grã-Ordem Kavernista

Até as sessões de gravação desse álbum, a carreira artística de Raul Seixas se limitava ao desconhecido álbum Rauzito e os Panteras – um roquezinho ingênuo e despretensioso que pendia mais a cópia da primeira fase dos Beatles e da Jovem Guarda. E a composições esparsas para artistas populares. O futuro rei do Rock tupiniquim ganhava a vida como um produtor musical da “fábrica de sonhos” da CBS. Discos de Jerry Adriani e da (popular) Diana passaram pelas mãos do baiano.

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Foi na função de produtor que ele “descobriu” o gênio Sérgio Sampaio, artista alocado à margem da MPB, ao lado de Jards Macalé, Luiz Melodia, Itamar Assumpção e Walter Franco. A afinidade musical transformou os dois em parceiros. A amizade (e veneração) entre os marginais da discografia nacional era tamanha que Raul foi o produtor do primeiro álbum do compositor capixaba; ocasião que o baiano já era rockstar e havia estourado nas rádios com Let Me Sing, Let Me Sing, Ouro de Tolo, Metamorfose Ambulante e Mosca na Sopa.

Antes disso, em 1971, os quatro kavernistas ainda desconhecidos do grande público finalizaram um disco antológico, recheado de humor ácido e criatividade ainda incomum às produções nacionais. A ironia está presente desde a capa (Raul como um hippie alienado; Sérgio demonstrando ultranacionalismo, afinal era época do Ame-o ou Deixe-o; Miriam de Super Homem; e o porraloca Edy de forma blasé) e passa pelas vinhetas a costurar as faixas, que flertam com o pop universal e o cafona debochado. A utilização de faixas curtas experimentais entre as músicas não era novidade; Ronnie Von se valeu delas para o clássico disco de 1968.

Documentário sobre o semi-desconhecido disco

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Diz a mitologia que as sessões de gravação aconteciam de forma clandestina, quase sempre de madrugada e longe das vistas dos diretores do estúdio. E que, por falta de músicos, mendigos, bêbados e vadios fizeram o coro em algumas faixas. Também que Raul aproveitou uma viagem do gerente da CBS para distribuir o disco, que fora vetado dias antes. E, após o regresso do executivo, foi ordenada a recolha de todas as  cópias nas lojas. A ousadia teria rendido sua demissão prematura da gravadora e abriria as portas para a carreia artística.

Edy Star, único kavernista vivo, desmente algumas das fábulas que ajudaram a construir a fama do álbum. Ele sustenta que o trabalho foi profissional. As gravações levaram 15 dias, com hora marcada no estúdio e anuência do diretor artístico da gravadora. Raul não foi demitido de imediato, permaneceu pouco mais de um ano nos bastidores de álbuns populares. Mas a posição da CBS desgastou a relação com o até então bem-sucedido produtor musical. Fato é, que no Sociedade, o baiano assumiu o nome artístico Raul Seixas – até então, assinava suas composições como Rauzito.

Depoimento de Raul sobre o trabalho 

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Inspirado pela obra-prima do quarteto de Liverpool, o disco abre num clima alegórico e circense, fio condutor que permeia as faixas até a descarga de um vaso sanitário que encerra a aventura anárquica.  Experimental ao extremo, o trabalho soa estranho e deslocado a unir fagulhas de rock com universo de folhetim, linguagens urbanas e o popularesco num mesmo caldeirão. Cada artista defendeu duas canções, sendo que Raul e Sérgio cantaram juntos outras três. E o baiano tocou praticamente todos os instrumentos e assinou quase a totalidade das composições.

Sinergia a dinamitar elementos estéticos. Embora ainda embrionário, o álbum deixa pistas dos trabalhos futuros de Raul Seixas e Sérgio Sampaio – Miriam Batucada diria, anos mais tarde, que o disco atrapalhou suas ambições artísticas e Edy lançaria apenas dois compactos e um LP, mas sem grande repercussão. Destaques para Sessão das 10 (única faixa regravada posteriormente por Raul, mas, aqui, lembra a Nelson Gonçalves), a empolgante Etâ Vida, Quero Ir, Todo Mundo Está Feliz, Aos Trancos e Barrancos (único genuíno samba gravado por Raul), Eu vou botar pra ferver, a emblemática Eu Não Quero Dizer Nada e a semi-progressiva Dr.Pâxeco. Mais uma pérola perdida do roque tupiniquim.

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