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Arkie do BRock #18 – ‘Depois do Fim’, um novo capítulo do Prog brazuca

Talvez farto pelo excesso de escalas, virtuosismo exagerado, longas e enigmáticas trilhas, o Punk regressou o rock ao seu espírito mais simples, brutal e agressivo. A autonomia do ‘faça você mesmo’ e os três acordes básicos empurraram, também, os fãs e as bandas do progressivo ao período jurássico da história musical. Foi justamente nessa janela transitória de mudanças comportamentais, regado pelo niilismo e subversão ao Statos-Quo, que um vendaval encheu de inspiração aos (novos) dinossauros em terras brasileiras.

E criou um dos mais elogiados trabalhos do gênero, comparável às obras de Pink Floyd, King Crimson, Soft Machine, Premiata Forneria Marconi e Focus. Depois do Fim, álbum inaugural da banda Bacamarte, é para muitos fãs e críticos um dos classudos registros mundiais do rock progressivo. O disco ocupa a posição número 38 dentre os 100 melhores trabalhos do gênero de todos os tempos, conforme análise do portal Progarchives. Está à frente, por exemplo, de papas como Emerson Laker e Palmer, Camel, Frank Zappa e Gentle Giant. E é o único disco em língua portuguesa e do Hemisfério Sul incluído na nata progressiva.

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O petardo começa de forma orgânica, numa bela teia sonora que remete à música árabe; e que cresce exponencialmente ao longo dos mais de seis minutos num duelo inspirado de sintetizadores e instrumentos de sopro. Apenas na faixa seguinte surge uma afinadíssima voz feminina, que faz um contraponto ao pesado tema: Smog Alado antecipa em alguns anos a apocalíptica preocupação ambiental. Nas composições seguintes, intercalam-se ricos arranjos sinfônicos puramente instrumentais com a suavidade da potente e cristalina voz. Obra-Prima!

Depois do Fim, obra-prima da Bacamarte

Gravado de forma independente – numa época que isso era aventura rara destinado aos poucos desgarrados e descontentes da submissão quase escravocrata imposta pelas gravadoras; vide Tim Maia e Antônio Adolfo – o álbum é de uma estrema riqueza sinfônica, com enraizados teclados, sintetizadores, violões e flautas. Mágico casamento entre maestria instrumental e uma das mais fantásticas vozes femininas em terras tupiniquins. As complexas composições fazem uma conexão direta entre a MPB e as escolas do rock sinfônico italiano e alemão.

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O trabalho foi o debute para a carreira solo de Jane Duboc. Então casada com Jay Vaquer, guitarrista norte-americano que acompanhou a segunda fase da carreira de Raul Seixas (após sua saída da Phillips), ela era figurinha carimbada nos estúdios profissionais. Emprestou sua voz em gravações para inúmeros artistas do primeiro time da MPB.

E após a breve duração da Bacamarte e a bem recebida crítica do discaço, foi arrebatada para o universo emepebista, afastando-se assim da verve mais roqueira. Jane Duboc soma mais de 30 álbuns gravados, que flertaram com diversos movimentos e gêneros musicais.

O super-grupo nasceu no Rio de Janeiro, em 1974, quando em terras cariocas pipocavam bandas interessadas pelas longas e intrínsecas tramas musicais. Começou como um trio de amigos, ainda em idade escolar. Ganhou novos membros, timbres e instrumentos às complexas teias musicais com o passar dos anos.

E criou, assim, uma (fantástica) simbiose entre os elementos da música erudita com a MPB e experimentações da fase mais psicoativa dos Beatles. Cinco anos depois de sua fundação, e já como septeto, entrava nos estúdios para o registro do Depois do Fim. Os integrantes racharam os custos da produção e horas de estúdio. A fita demo rolou por gravadores, com inúmeras recusas apesar da qualidade do material

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Sete Cidades, segundo e derradeiro álbum do grupo

O trabalho ficaria engavetado até o final de 1983 sem que despertasse o interesse das majores, que encontraram no ‘Ursinho Blau-Blau’, ‘Você não soube me amar’, ‘Vamos invadir sua praia’ e afins formas mais lucrativas de negócio.

Porém, no início daquela década, entrava no ar uma experiência anárquica até então nas programações radiofônicas brasileiras. Também conhecida como a Maldita, Fluminense FM teve inspiração nas flutuantes rádios piratas inglesas, que foram fundamentais para transformar o rock´n roll num fenômeno de massa. E adotava a inédita política nacional de divulgar bandas novas sem jabá; numa experiência similar às trocas de arquivos digitais décadas depois. A ordem era jogar nas ondas sonoras bandas desconhecidas do grande público.

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A fitinha demo da Bacamarte teve amplo espaço na grade da emissora primordial para a (re)descoberta do som voltado ao público mais jovem. E se apresentava com regularidade no (mitológico) Circo Voador, palco que fomentou o BRock nos anos 1980. Foi o estopim para o grupo tirar a poeira que caíra sobre o master e trabalhar o petardo sonoro. Sem espaço nas grandes do setor, o álbum teve distribuição (limitada) pela nanica Som Arte Discos.

O disco teve boa repercussão por terras tupiniquins, cativando os poucos “fósseis” que ainda apostavam nas longas teias progressivas. A bolacha desapareceu das lojas. E caiu como uma bomba na Europa e Japão, mercados os quais o álbum se tornou um item de colecionador. Depois, caiu num limbo.

O relativo sucesso – mesmo sem divulgações televisiva ou radiofônica oficiais – foi incapaz de manter que a banda unida, encerrando, assim, as atividades no ano seguinte. Não foram as tradicionais brigas que jogaram a pá de cal sobre o grupo. O afastamento entre os integrantes se deu pela diminuição de espaços para a divulgação no quase inexistente cenário independente – exceção apenas à Lira Paulistana, que ainda engatinhava no minúsculo porão da Praça Benedito Calixto, em São Paulo.

Apresentação completa na Virada Cultural

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Na década de 1990, a fonografia da Bacamarte ganhava o (belo) álbum Sete Cidades. O disco contou apenas com o guitarrista Mario Neto da formação original. E num processo comum à primeira dentição do roque nacional, a banda foi redescoberta por novas gerações anos após seu lançamento. Graças às trocas de arquivos MP3 – o admirável novo mundo na virada do atual século que tornou acessível rico conteúdo cultural – Depois do Fim passou a ser venerado e fonte de inspirações a novos músicos.

O trabalho ganhou algumas reedições em CD a partir dos anos finais da década de 1990. A última foi a dantesca versão jogada às lojas pela Som Livre, que alijou a (fantástica) faixa bônus Mirante das Estrelas, que encerrava as primeiras versão digitalizadas.

Em setembro de 2012, a banda se reuniu novamente para uma apresentação especial no Teatro Rival do Rio de Janeiro. O show, que teve ingressos com antecedência esgotados, foi a atração principal do Rio Prog Festival daquele ano. Era a redenção após três décadas de ostracismo dos palcos. A ótima recepção de público e crítica especializada foram então desculpas para breve turnê em São Paulo. E, vez ou outra, a trupe se reencontra para o deleite dos fãs; com na Virada Cultural paulista do ano passado, quando tocaram na íntegra a obra clássica do grupo.

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