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Double Fantasy, John Lennon, 1980 – Não Precisava ser Assim

RICARDO AMARAL
Foto: Kishin Shinoyama/Divulgação

Double Fantasy. O disco que me fez chorar.

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Era 1980 e eu tinha 16 anos. Me preparava que nem um louco para o exame do First Carticate of English, mais conhecido como Cambridge. Sim, na minha apresentação oral, cantei Hurricane, de Bob Dylan. Inglês era minha alegria, minha diversão, mas, naquela época, o exame oral se dava com a vinda de um examinador da Inglaterra, no meu caso, da Nova Zelândia.

Era uma segunda-feira. Eu me tranquei no quarto da Rua Ceará, 40, desde a quarta anterior, com aquele calor de dezembro que a gente não tem mais, pelo menos religiosamente e me pus a falar sozinho. Na vitrola, o meu presente de Natal. Finalmente John Lennon gravava um disco. Novamente. Double Fantasy havia sido lançado em julho daquele ano e, desde então, não saiu mais da agulha.

Acordei no dia 8 de dezembro de 1980 ansioso e meio nervoso. Aquele exame era o resultado de oito anos de dedicação ao inglês. Papai me acordou às 6h e com uma cara amarrada me disse: entre; faça o exame e não pense mais em nada.

Quando cheguei na Cultura (ainda aquele casinha na esquina da Conselheiro Nébias) todos choravam. E eu, sempre envolvido com o pessoal da escola, fiz então a pergunta… John Lennon estava morto! Cara, parte do meu equilíbrio se foi e parte de minha vida morrera naquele momento. Fiz o exame e passei com B+ o que era muito mais do que esperava.

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Naquele Natal, fim de ano e Réveillon de 1981, todas as rádios não paravam de tocar – Our life, together, is so precious, together, we have grown…”: Aquela capa não saia dos jornais, da TV e nunca mais saiu da minha memória afetiva.

Double Fantasy não atraiu a crítica ao seu lançamento, mas o assassinato de Lennon transformou-a em uma poção mágica para os fãs e, obviamente, para mim.

Nunca sabemos se a reabilitação crítica teria ocorrido quando ultrapassado o “choque” inicial. Primeiro, porque se tratava de um retorno, após cinco anos e, em segundo poque vinha o álbum dividido entre composições de John e de Yoko Ono, oficialmente detestada pelos admiradores do ex Beatles.

Diga-se que Lennon já não demonstrava qualquer interesse em viver de sua imagem de revolucionário do rock. Tranformara-se em marido e pai de família e, surpreendentemente, algumas composições de Yoko Ono são tão boas quanto as de seu marido, como Kiss Kiss Kiss; Beautiful Boys e Every Man Has a Woman to Love Him.

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Mas Double Fantasy é muito mais do que Starting OverClamp Time é um primor de arranjo e letra, como outrora, confessando que o peridodo fechado em copas foi um “período de limpeza”. I’m Losing You é um blues que, se estivesse no álbum branco do Beatles, teria atingido o sucesso que merecia.

Watching the Weels é um desabafo àqueles que julgavam-no morto artisticamente, severamente criticando-o por seu afastamento do mundo artístico. Mas o disco traz duas obras prima de John Lennon.
Duas canções eternas: Woman e Beautiful Boy.

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Woman talvez seja a mais linda e humana declaração de amor e adoração de um homem por sua mulher.
Aliás, aproveito esta oportunidade para tentar desfazer a maior ingratidão jamais cometida a figura de uma mulher na história. Yoko Ono não foi destruidora dos Beatles. Não senhor! Quando Yoko apareceu na vida de John Lenon, os Beatles já se consumiam num desgaste muito grande. Ringo havia deixado a banda logo após o álbum branco, tendo retornado a pedido de Lenon e de Harrison. Logo após Let it be, foi a vez de Harrison sair fora. A causa: Paul James McCartney.

Paul havia submergido numa fase totalmente capitalista, interessado mais em lucros e em assumir o espaço deixado por Brian Epstein, desde sua morte em 1967. Quando a banda se reuniu para gravar Abbey Road, já havia uma clara intenção de que aquele fosse o epitáfio dos Beatles.

Logo após o lançamento de Let it be, Paul dá o golpe final, processando seus companheiros na divisão da Apple Records. Logo, Yoko Ono está para a separação dos Beatles como Pilatos para o credo. Não altera nem o teor nem a impotância da reza.

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Yoko resgatou o homem John Lenon de todas as maneiras que uma mulher pode resgatar um homem de seu inferno. Isso esta em cada frase de Woman.

Beautiful Boy é absolutamente linda!! Em uma canção feita para seu filho Sean, Lennon cria uma carta de despedida, sem saber que não mais conviveria com seu filho, ainda tão pequeno.

Em parte da canção, ele filosofa e cria uma dessas suas frases que, para sempre, servirão como guia de vida e felicidade com fizera em dezenas de suas músicas. “A vida é o que acontece com você, enquanto você está ocupado fazendo planos”.

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Simplesmente um axioma ou um truísmo eterno!!! Neste natal, ao contrário de ouvir Merry Xmas (War is over), que não foi feita para o Natal, mas para a primeira chegada de veteranos do Vietnã, no aeroporto JFK, em Nova Iorque, no ano de 1971, ouça Double Fantasy e sinta o vigor de John Lennon e Yoko Ono, no auge de sua felicidade como casal e como parceiros de uma vida inteira. Feliz natal…. a guerra não acabou…!

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