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Entrevista | Flávio Grão & Henrique Celso – “Existe essa consciência de preservação dos espaços”

Flávio Grão se tornou um dos artistas plásticos mais respeitados do cenário independente por estar diretamente ligado ao mundo da música. Produzindo artes para bandas de nomes como Giallos, Wiseman e a emblemática capa para o Four Way Split Faces do 3º Mundo, que contou com a participação de Noção de Nada, Dead Fish, Street Bulldogs e Reffer, Flávio Grão ganhou notoriedade.

Seu irmão Henrique Celso é um dos maiores organizadores culturais da região do ABC Paulista, produzindo shows de punk rock até exposições de arte. A mais recente exposição organizada por Henrique é a Filhos e Filhas do Subúrbio Operário, que conta com a participação de seu irmão e de outros artistas.

Fui até a Pinacoteca de São Bernardo do Campo na estreia da exposição e tive uma fantástica conversa com Henrique e Flávio sobre a exposição e a cultura independente. Saca só.

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Como vocês veem a construção do cenário das artes no ABC? Não só artes plásticas, mas música, zines, filmes e etc.

Grão: Estava conversando com o pessoal aqui na exposição, e chegamos a conclusão de que o ABC tem uma cena cultural e artística que tem características muito próprias que vêm da cultura da indústria, dos sindicatos, mas também vem de uma questão geográfica, da gente viver do lado de São Paulo. Isso é uma benção e é um mal.

Uma benção porque a gente vai pra lá com facilidade, e um mal por ter muita coisa legal que acontece lá e poderia estar acontecendo aqui. Hoje a gente tem uma percepção de construir as coisas por aqui, e essa exposição tem justamente essa intenção de mostrar que os artistas tem características de organização, de estilos, de tema, de comprometimento com a arte e a questão social quem tem a identidade daqui.

Sobre o tema da exposição, Filhos e Filhas do Subúrbio Operário, como vocês acham que a classe trabalhadora impacta na nossa criatividade?

Henrique: A exposição na verdade é uma afirmação de sermos daqui. A gente nasce aqui e sempre agiu de forma coletiva, nunca de forma individual, sempre prezando a coletividade. E isso sempre esteve presente nos shows de punk rock e hardcore da região, outras exposições e esporte.

Em documentários sobre skate, punk rock, sempre tem um capítulo especial sobre o ABC, e muitos nomes daqui se destacaram por essa referência dos movimentos de contracultura. Então isso causa uma reflexão profunda na gente.

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Grão: Na época em que houve o crescimento das industrias não tínhamos muito acesso ao lazer. Se você olhar na constituição, o lazer é um direito que tem de ser garantido ao trabalhador, do contrário ele enlouquece. Então começamos a fazer bandas, andar de skate, desenhar, justamente para não enlouquecer.

Nós aqui do ABC sempre migramos pra São Paulo. São muitos ônibus até o Terminal Parque Dom Pedro II, e mais recente Terminal Sacomã. Porém, como é o feedback das pessoas da Capital em relação aos movimentos culturais do ABC?

Grão: Antes eu fazia esse caminho, hoje faço o inverso. Venho de São Paulo para o ABC e sempre trago meus amigos. O que eles sempre comentam é essa nossa capacidade de organizar e cuidar das coisas aqui, fora a autenticidade da arte da região. Em São Paulo vejo que as coisas são mais espalhadas. Um lugar legal onde rola shows, exposições, abre e fecha depois de dois anos.

No ABC você cria identidade com os lugares. Quando você vai em uma Casamarela, um 74Club, você se sente pertencente e construindo aquilo. Você se sente muito em casa, pois todo mundo que está ali sabe que é uma coisa muito importante, pois é onde se abriga as pessoas que desenham, que tem banda e que constroem o cenário do ABC. Existe essa consciência de preservação dos espaços, o que sempre chama atenção de quem vem de fora.

Henrique: Eu vejo que as pessoas de São Paulo e de outros lugares sempre observam o que acontece aqui com bons olhos. Pois aqui temos essa simplicidade, sem grandes pretensões, preocupados em apenas fomentar a arte, de movimentar e de se sentir vivo dessa forma. É o que eu falo, é um “artevismo”, somos todos “artevistas”.

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Como vocês observam o crescimento das artes plásticas de forma independente?

Grão: Sempre tem gente produzindo coisas boas. O que muda é que hoje existe uma consciência de que fazemos parte de um todo. Existe a galera que tem sua banda e produz sua arte, então tudo caminha de mãos dadas. E essa nossa coisa de suprir nossa arte é muito próxima das bandas independentes, e todos que compareceram na estréia da exposição tem alguma ligação com as bandas.

Então se cria uma percepção de que pode existir um mercado das artes independentes. O cara que faz arte não precisa ser o Picasso, mas ele pode produzir capas de discos, camisetas de bandas, etc. E não que seja aquela coisa capitalista, de vender sua arte por preços exorbitantes. Você pode trocar sua arte com a galera das bandas e todo mundo se ajudar.

Henrique: Falando desse crescimento no ABC, percebo o crescimento das artes nesses espaços que o Grão citou. No 74club, na Casamarela, na Flame, quando uma banda vai tocar sempre tem aquele amigo que produz arte e acaba as expondo, fazendo desenhos nas paredes dos lugares e isso contribui para um crescimento da arte independente. E isso vai ampliando os espaços para os artistas.

Hoje ele está no underground, mas amanhã ele está em uma Pinacoteca como estamos aqui, e depois voltamos para o underground, e por aí vai. O que tem muito a ver com o Punk Rock e as bandas independentes.

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Nitrominds Ao Vivo no 74Club

Em nome do Blog n’Roll, gostaria de agradecer o tempo de vocês. Peço que deixem a mensagem final para o pessoal que está lendo.

Grão: Precisamos manter essa consciência do coletivo e nunca produzir nada sozinho. Perceber que a gente pode se unir e construir as coisas juntos, deixar essa coisa do ego de lado e seguir o DIY.

Henrique: Nós não devemos fugir do debate da gestão pública. Tem muita gente produzindo muita coisa, mas não podemos fugir quando formos convidados ou procurar apoio público. Somos muito bons em fazer no independente, mas também podemos manter a qualidade produzindo dentro do sistema.

Serviço

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A exposição conta com os trabalhos de Daniel Melim, Felipe Gasnier, Camila Visentainer, Flávio Grão, Priscilla Fernandes, Robinho Santana, Lita Victorino, Dener de Sousa, Rayra Costa e acontece na Pinacoteca de São Bernardo do Campo (Rua Kara, 105) até o dia 29 de outubro.

Os horários são de terça a sábado das 10h às 18h, e quintas das 10h às 21h. Mais informações no telefone 11 4125-4056.

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