Essa semana, resolvi trazer alguns dos lançamentos imperdíveis que estão rolando aqui na baixada santista. Em época de pandemia mundial, os artistas, produtores e toda a galera do meio cultural usam a criatividade para sobreviverem . Vamos conferir as alternativas que a banda Noite Cinza, as artistas Gabitopia, Luna e Kryartura encontraram.
Noite Cinza
Equinox é uma versão reimaginada da música equinócio do primeiro EP da banda noite cinza. A banda sempre ansiou reimaginar uma música própria pois, apesar de terem muita influência do rock alternativo e post rock, as integrantes possuem influências músicas variadas como a guitarrista Amanda que curte bastante lo fi, eletrônica e a vocalista Isis, que caminha pelo pop.
Assim, reimaginar Equinócio foi um meio de transparecer a identidade dos membros fora da caixinha do rock e mais do que isso, uma saída para lançar algo inédito em tempos de isolamento social uma vez que não possuíam as condições normais como bateria acústica e estúdio para lançamento de um novo EP por exemplo. Isis ( Vocalista e guitarrista) conta que o clipe foi gravado totalmente na improvisação, com cada integrante em sua casa. Dá pra acreditar que elas utilizaram seus celulares pessoais (Iphone 6s e iphone 7), soft box (papelão e papel alumínio) e uma lâmpada do banheiro?
Equinócio
Propositalmente, a música Equinócio foi escolhida para ser reimaginada uma vez que a composição trata dos efeitos que o isolamento social traz: noites iguais e questionamentos até mesmo de cunho filosófico como no trecho a seguir:
Pra onde iria se pudesse ir?
(Noites iguais)
O que diria se tivesse voz?
(Uma vida pra pulsar)
O que seria se pudesse ser?
(Tudo se vai)
Logo vem o anoitecer
(O vento levará) (…)”
As composições da banda vagam pelo campo abstrato e andam de mãos dadas com a metáfora uma vez que o Equinócio é um fenômeno astronômico que marca o início da primavera e do outono, especificamente durante apenas dois dias no ano o dia e a noite terão quase a mesma duração: 12 horas.
O nome equinócio, do latim significa noite iguais, o que marca o refrão da música. Paralelamente, a banda possui uma música chamada Solstício que as integrantes classificam como um som mais pesado assim como o fenômeno natural, e seguindo essa mesma lógica, a música Equinox traz a pegada branda dos Equinócios. Algo que não pude deixar de reparar foi essa ficha técnica lindíssima:
Música: Produção: Noite Cinza
Mixagem e Masterização: Lucas Souza (@lucasviniciuz)
Imagens: Captação: Victor (Irmão da Amanda) e Agostinho (Pai da Isis)
Direção de Arte: Amanda Ferreira e Isis Tomaz
Edição e Finalização: Isis Tomaz
Gabitopia e Luna
Em meados de 2017, quando comecei minhas estadias entre a Universidade Federal de Uberlândia e a baixada santista conheci através do Prof.Dr. Sergio Bento a polifonia da poesia marginal, e nessas minhas idas e vindas tive o imenso prazer de conhecer a batalha do CAOZ, o que pessoalmente foi um marco em minha vida. A batalha do CAOZ, foi uma batalha para mulheres, mulheres mães e pessoas LGBTQIA+, era um lugar seguro, como uma escola de rimas e que entre incentivos e momentos catárticos saiam produções incríveis.
O CAOZ era um grupo que, embora atualmente a maioria dos MC’s tenham seguido carreira solo, por vezes nós somos presenteados com feats como “Conselho” que é um trabalho da Gabitopia e da Luna. Vejo fortemente que Conselho trata não desse empoderamento que o capital prega, mas sim um empoderamento de classe, o reconhecimento de ser pertencente de uma classe de artistas que se fortalecem, um reconhecimento de ser mulher mãe, reconhecimento de ser mulher negra e periférica ocupando espaços. Parafraseando Carolina Maria de Jesus, apesar de não termos força física…nossas palavras…Ah! Nossas palavras…ferem mais do que espada. Gabitopia nos conta um pouco dessa potencia de Conselho:
Conselho
“Comecei a escrever essa letra depois que um outro Mc me propôs um feat sem tema, escrevendo sobre o que sentíamos naquele momento. Me mandou um beat de referência e eu comecei a escrever. Naquele momento eu não estava num momento muito bom, muito pois dava pra perceber que eram questões relacionadas a auto estima. Chorei muito ao escrever o começo da letra e foi como se eu tivesse tirado um grande peso das minhas costas, do meu coração. E então comecei a pensar em todas as pessoas que estavam ao meu redor e que eu tenho com quem contar. Foi quando escrevi a segunda parte da música que é a virada. O fato de ter “comprado” roupas de show não é apenas pelo comprar mas por me vestir de uma forma que eu me sinta bem.
Citei minhas amigas Candy e Olho Vivo (Laisa) e o Caoz, pois eram quem estavam me apoiando mais naquele momento. Finalizei a composição quando a Luna estava passando uma temporada aqui em casa e nos incentivamos a finalizar e ir gravar na Lucci da Inferno Rec. Também citei uma das Batalhas aqui da Praia Grande que é bem grande e que eu gostava bastante de ir antes da pandemia, a Celeste. Aproveitei pra fazer uma provocação amistosa dizendo que só ia lá pra ver a Brisa, uma das únicas MCs mina que eu já batalhar sobrecarregada e não conseguia enxergar muitas alternativas para o que eu estava sentindo por lá, pois acredito que seja relevante o fato de haver poucas mulheres em batalhas de rima.
Letra
Terminamos a letra e a Lucci fez o Beat, fomos gravar e tivemos o apoio da Aleatori Mc também. Queríamos gravar um clipe mas a pandemia atrapalhou esses planos. Pedimos então pro Nero fazer uma ilustração e quem ia fazer o lyric vídeo ia ser a Ladyna, uma grande amiga nossa. Porém, por problemas pessoais ela teve que sair do projeto e encontramos o Diego quem fez o vídeo.”
Luna conta que quando escreveu sua parte do feat estava com imensa necessidade de uma imersão em seu fazer artístico embora não estivesse em uma fase psicologicamente saudável, muito disso pelos abalos que a pandemia causou na classe trabalhadora. Felizmente Luna e Gabitopia encontraram na amizade e na música apoio para passar pelas intercorrências da vida.
A MC ressalta que inspirou-se em seus sonhos para composição, e diz ser de vital importância não apenas sobreviver e sim VIVER! Ela associa viver a mais do que ter o que comer, mas sim ter uma mesa farta, ter condições materiais, tempo para o lazer e sair com as amigas por exemplo. Quanto a experiência da gravação, ela diz que se sentiu extremamente acolhida e ouvida pelas mulheres que colaboraram na gravação e elucida a importância do apoio mútuo.
Kryartura
Outro lançamento bombástico que você não pode perder, é de um conceito ambulante, sim eu estou falando da Drag Queer Kryartura . Residente da Praia Grande na Baixada Santista vem trabalhando em performances artísticas em eventos, bares e na internet com “fotoprovokações” e interação online disseminando discursos sobre questões de gênero, linguística e ressignificação da estética de beleza drag. Em suas próprias palavras, a Kryartura define a sua arte como “Uma vontade imensa de causar algo, você decide se é bom ou se é ruim”. Recentemente a Drag lançou um EP mega psicodélico que leva seu próprio nome.
Faixas
A artista conta que o EP Kryartura é uma imersão ao universo onde Kryartura habita, então Gen3ℤ¥s: fakção Drag Digital o primeiro som, vem como algo do lado de fora. Na primeira parte da música, percebe-se a agitação e a pressa em responder com ritmo agitado as vozes que a chamam de falsa e atrevida. Porém, em outro momento da música atravessamos um portal e passamos para segunda música.
Poderoza começa com uma provocação de personalidades e depois a música vai se desdobrando até terminar em uma vibe totalmente política. Ela foi produzida por Gustavo Albuquerque, juntamente com Vertuno e Mily Taormina. A música é a que mais exala a essência drag e o clipe traz efeitos visuais psicodélicos para conversar com a estética sonora enquanto apresenta alguns de seus looks clássicos, os quais a Drag aprecia muito e classifica como “algo bem EU”.
Ideia
A televisão foi ideia de Rennan Cantuario que montou o clipe. Logo em seguida, num surpreendente giro de 180º entra a terceira música Rei Arthur que apresenta uma outra faceta da drag, com um quê de lamentação e sons excêntricos, dando a sensação de estar cantando embaixo do chuveiro. Ela confessa que foi mais ou menos o que aconteceu.
Já em Vírus do Futuro há duas fases e conta sobre a transformação de coisas que nos corrompem para coisas que nos fazem fluir. Sensação essa que o som nos proporciona. O EP é encerrado com ÅPØkaL¥¶sę: fakção Drag Real
A artista conta que: “ Traz várias questões que se passaram na minha cabeça na hora de publicar o álbum, por isso o “Drag Real”, pra saberem que eu sou verdadeire.”