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Os mistérios de Michael Gira (e do Swans)

Poucas vozes, no universo da música, possuem a versatilidade ambígua de adequar-se tanto aos fones de ouvido quanto ao enterro do seu tio avô. Essa virtude, adquirida no momento em que o indivíduo de voz privilegiada nasce (ou seja, incapaz de ser desenvolvida por conta própria), pode ser observada de forma controversa em alguns nomes da música semi-popular, como Nick Cave e Ian Curtis, e acende os mais puros sentimentos de existencialismo e desespero em almas fracas e despreparadas.

Brincadeiras à parte, Michael Gira, do Swans, parece ter subido do inferno com o exclusivo propósito de iluminar e desprezar a sociedade com uma voz neblinosa e mensagens iconoclastas.

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Quando formou o Swans, em 1982, pretendia formular na cena pós punk um jeito ainda mais excêntrico de produzir música. Multi-instrumentista e dotado com uma voz grave (ainda que controversa em questões técnicas,) Gira escandalizou, em letras, toda a podridão que o ser humano tende a exalar, distorcendo aquilo que é mundano e orgânico em algo caótico e autodestrutivo.

Essa visão de mundo pessimista, trazida à tona por Gira na maioria dos álbuns niilistas do Swans, no entanto, figura como um agregado importante na sonoridade da banda, que se apropria do experimental para criar canções incrivelmente densas e imersivas. Álbuns como White Light From The Mouth Of Infinity, de 1991, e até o To Be Kind, de 2014, são experiências que, se não entendidas, são, no mínimo, sentidas pelo ouvinte – que passa a figurar uma ambientação soturna e nebulosa, independente do recinto onde realmente se encontre.

Tal sentimento, apesar de deprê, é bastante enriquecedor se você gosta de música, e entender o que o personagem bizarro do Swans quer dizer em cada canção intensa, – porém pouco inteligível -, é sempre um exercício instigante. Tente entender Screen Shot e tire suas próprias conclusões.

O estigma de gênio peculiar se auto fortalece ainda mais quando botamos em mesa algumas das últimas faixas do Swans. Bring The Sun e The Knot, pra citar alguns exemplos, ultrapassam os 30 minutos de duração com métricas que pouco variam. Vale a pena? Sim. Mas tem que ter coragem e disposição para entender que, ambas as canções, pertencem a algo maior do que a canção em si.  Tem que ter coragem.

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No entanto, é importante frisar que quando não berrando desprezo e pessimismo de forma grave e extensiva, o vocalista do Swans nos apresenta também canções bonitas e acessíveis – ainda que disfarçadas. Love Will Save You, You’re Not Real, Girl e Song For The Sun são alguns excelentes momentos da carreira da banda que fogem da linhagem atmosférica popularizada pelos últimos trabalhos do grupo, e alimentam o argumento de que, com um background folk ou dançante, qualquer verso mórbido fica bonitinho.

Dividindo a banda em duas fases, recomendo os dois discos citados previamente: White Light From The Mouth Of Infinity e To Be Kind. O primeiro representa o Swans em sua essência, um misto introspectivo de folk com pós punk. O segundo, lançado já após o revival do projeto, representa a nova fase da banda, com faixas ainda mais extensivas e de um flerte pesado com o noisy.

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Tratado como gênio por um grande número de artistas contemporâneos, Michael Gira (e sua voz) é, inegavelmente, um dinossauro do underground. Seu estilo de prosa e canto é um dos resquícios mais sagrados do falecido pós punk, e merece ser apreciado a cada lançamento novo do Swans – que segue implacável e com trabalhos excelentes.

Um excelente final de semana a todos!!!

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