Pra gostar de Tim Maia (uma introdução à discografia)

Pra gostar de Tim Maia (uma introdução à discografia)

Todo mundo conhece o Tim Maia (ou ao menos deveria). Comentar de sua importância para a música popular brasileira soa, por vezes, até redundante e dispensável, visto que o alcance do músico e de sua história já atingiu até os mais leigos e desligados de música.

No entanto, me contradigo: nem todo mundo conhece o Tim Maia, e sua discografia, fugindo dos hits óbvios, talvez não seja tão conhecida do novo público que procura por música hoje em dia.

Aqui vai uma pequenina lista de recomendação para quem quer ouvir Tim Maia, conhece os hits, mas não sabe por onde começar no âmbito discográfico.

Tim Maia Racional (volume 1 e 2) – 1975

Dois dos mais controversos discos brasileiros de todos os tempos, os dois volumes de Tim Maia Racional são a representação sonora da alienação dogmática vivida pelo artista ano de 1975. Foi nesse periodo que o cantor conheceu a Cultura Racional, seita liderada por Manoel Jacintho Coelho que tinha como bíblia simbólica o livro Universo em Desencanto.

Repleto de bonitas melodias, os dois volumes pecam pelo marketing de uma doutrina vazia e pelo culto a um charlatão. São defeitos graves, e se não viessem de Tim Maia poderiam ocasionar em um enorme desastre na cronologia da música. Não foi o caso, e qualquer equívoco lírico pode ser ignorado quando posto em contraponto com a excelência vocal nunca antes explorada pelo cantor. A filosofia, que impôs um falso puritanismo que evitava qualquer vício carnal, ao menos colaborou com o auge de uma das melhores vozes que o Brasil já teve – proporcionando momentos como Guiné Bissau, Moçambique e Angola.

Outros momentos, como No Caminho do Bem e Que Legal (presentes no segundo volume) são representações fiéis e amadurecidas do soul raiz que consolidou o cantor. No primeiro volume, o destaque fica para a clássica Imunização Racional (Que Beleza) e para os grooves de Bom Senso.

Os dois volumes são tidos como dos mais emblemáticos da música popular brasileira, e merecem sua atenção – nem que apenas por curiosidade.

https://www.youtube.com/watch?v=xg1d1A_meDc

Tim Maia Disco Club – 1978

Já longe de alienações filosóficas, Tim Maia deixou sua marca no glorioso período da Disco Music. Tim Maia Disco Club, que não carece de hits em potencial, foi lançado em 1978 e amplificou os já eficientes grooves que acompanharam o artista nos anos anteriores – somando-os a malícia das pistas de dança pré-oitentistas.

Entre os principais destaques, encontram-se Vitória Régia, All I Want e Sossego – faixa marcada no subconsciente de qualquer brasileiro.

Além de ser disparadamente o mais dançante, é também o mais coeso da discografia de Tim Maia, seguindo à risca os demais modismos da disco music, da primeira até a última faixa.

Tim Maia – 1970

Visto por grande parte da fandom como o magnum opus do artista, seu debute homônimo traz um Tim Maia jovem, mas já experiente – à essa altura sua busca pelo sucesso já havia passado bons e maus bocados fora e dentro do país -, despontando de cara como um dos grandes nomes da música brasileira no início da década.

Sua construção é uma intercalada de arranjos característicos da MPB com forte influência do soul norte americano, mistura que elevou Tim Maia ao posto de rei do soul brasileiro algum tempo depois.

Longe de ser um disco a parte, o trabalho sintetiza bastante a discografia do cantor, e é dele que brotam clássicos como Azul da Cor do Mar e Primavera. Outras faixas mais obscuras, como Cristina e Padre Cícero, também merecem atenção especial em caso de escuta na íntegra.

Tim Maia – 1971

O segundo álbum do cantor é, talvez, um dos mais recomendados para quem deseja, de fato, entrar de cabeça na sua discografia. A fluidez de seu repertório – agora ainda mais mergulhado no groove e funk – tenta por ser de longe um dos mais acessiveis de sua carreira.

Hits como Você e Não Quero Dinheiro dialogam com outros grandes momentos, como os american swings I Don’t Know What To Do With Myself e Broken Heart e o rock tuttifruttiano Nao Vou Ficar – com aquele solo de guitarra ligada direto no amplificador. Meu País, por sua vez, se destaca por ser um quase relato da experiência ruim do músico em solo norte americano. Indispensável.

Tim Maia (1973)

O quarto disco do síndico não é menos consistente que seus anteriores, e nos presenteia um Tim Maia muito mais romântico que o habitual. Foi nesse  trabalho, por exemplo, que ele imortalizou suas dores na universalmente famosa Gostava Tanto de Você, uma das músicas mais simples e bonitas de todos os tempos.

Simples, inclusive, é um adjetivo que conversa bastante com a arte de Tim Maia, diálogo tem seu apogeu nesse trabalho. No vasto menu de artistas que flertavam com cabecismos e mensagens criptografadas (o que é justíssimo, afinal vivia-se uma ditadura), Tim Maia optou de vez pela poesia popular. Impossivel não frisar que algo que o síndico aprendeu com a jovem guarda e acabou por fazer excelentemente ao decorrer da sua carreira foi como cantar a simplicidade de poemas sobre amor sem soar cafona (ou pretensioso) – habilidade que se aplica em excesso saudável nesse disco.

No mais, o álbum fecha, pra muitos, a fase de ouro do artista. Sua ficha técnica é extensa, e curiosamente um dos grandes momentos do disco acaba ficando apenas por conta da banda de Tim Maia, na instrumental Amores.