Tatá Aeroplano e sua música de resistência

Tatá Aeroplano e sua música de resistência

VINICIUS HOLANDA

Alma de Gato é um pássaro chamado assim porque, ao pular de galho em galho, costuma fazer malabarismos – à semelhança de um felino. Não por acaso, Tatá Aeroplano batizou seu quarto álbum solo com o nome do bicho. O músico paulistano, um dos expoentes da neotropicália com o extinto grupo Cérebro Eletrônico, já integrou a Jumbo Elektro, gravou em parceria com a cantora Bárbara Eugênia e mantém ativo seu projeto Frito Sampler.

O compositor diz que a mudança, no final de 2016, de Santa Cecília, Centro de São Paulo, para a Vila Romana, foi determinante na construção do novo disco. “Respirei novos ares, lá tem um ar meio interiorano”. Como já ocorria em seus trabalhos anteriores, ele continua captando o que se passa em volta para elaborar suas letras – ora intimistas, ora bem-humoradas, ora repletas de ironia.

Ironias, aliás, que não poupam nem a si próprio. Como mostra um trecho da faixa de abertura de Alma de Gato (Voador Discos) Cores no Quarto: Não tenho que escutar hoje/ que eu não tenho mais o moral/ que eu tive no passado/ de fazer canções assim/ tão deslumbrantes. “Nunca fui de me levar a sério”, admite o músico.

O tom confessional, uma de suas marcas registradas, permanece. Algo que o artista garante não ser premeditado. “Capturo passagens, escrevo e, depois, na hora de montar as canções, levo essa loucura toda para o trabalho. Como se fosse um quebra-cabeça”.

Aeroplano afirma que sua obra tem uma relação forte com os sonhos. “Muitas vezes, quando começo a arranhar o violão, jogo meu consciente para o inconsciente. Várias letras surgem assim. Eu estou acordado, mas é como se tivesse pensando dentro de um sonho”.

O som que emoldura os versos espertos – e, às vezes, non sense – acompanham as viagens. Por vezes beirando a mais pura psicodelia, algo que o aproxima de outro compositor outsider, Jupiter Maçã, morto em 2015. “Isso é um baita elogio. Ele é uma referência para mim”.

O músico lembra que realizou alguns shows em que tocava de ponta a ponta o clássico A Sétima Efervescência, primeiro álbum solo do gaúcho. “Era um trabalho absurdo reproduzir as mudanças de vozes e nuances do disco. Um grande aprendizado”.

Santos
Um dos trabalhos do paulistano encontra ligações com a Baixada Santista. Usando seu alter ego Frito Sampler, ele fez a trilha sonora do longa-metragem De Menor, de Caru Alves de Souza, em 2013. O filme, com forte temática social, foi rodado em Santos. “Compusemos tudo de uma vez. O que esboçamos encaixou perfeito com as cenas”.

Ainda que em fase solo, Aeroplano não dispensa as contribuições artísticas. Na bela Vida Inteira, do compositor João Sobral, ele divide os vocais com a cantora Malu Maria, de quem produziu o álbum Diamantes na Pista. “Gosto de interagir. Até compusemos uma canção juntos (Os Novos Baianos Sapateiam na Garoa dos Sex Pistols, uma das oito faixas de Alma de Gato)”.

O artista não para: diz que já tem uma parceria com o artista Borboleta Psicodélica na gaveta. “Música é uma forma de resistir a tempos difíceis”.