1972 foi desafiador para Marvin Gaye. Um ano antes, manteve-se longe do sistema sanguessuga da Motown, vencendo uma batalha para o lançamento de What’s Going On contra Berry Gordy, chefão da Motown, que alegou ser “a pior merda que já ouviu”. Mordeu a língua já que a música passou cinco semanas no número #1 da parada de R&B dos Estados Unidos, vendeu um milhão de cópias, indicado para dois Grammys e redefiniu o modo de pensar e ser de muitas pessoas. Stevie Wonder foi um deles, encorajado por Gaye, também cansado da insistência e controle do selo.
Na sequência, Gaye estava cansado de cantar músicas que ele não havia escrito, sentindo-se um fantoche. “Quando você está no topo, não há mais para onde ir, senão para baixo”. O cantor já estava com um novo single embaixo dos braços: You’re The Man. Quando Gordy o ouviu, uma avaliação sombria e desconfiada da campanha presidencial dos EUA em 1972, entrou em pânico fazendo com que as rádios a tirasse de suas programações, garantindo o fracasso, podendo assim engavetar o álbum inteiro… até hoje.
35 anos após a morte de Gaye, esta coleção de 17 faixas volta à luz, sendo anunciado como um grande álbum perdido, quando realmente é uma compilação de single cancelados e outtakes de estúdios, remasterizados por Salaam Rami, produtor da Amy Winehouse. Mesmo algumas canções serem conhecidas, o entusiasmo por elas é grande. As músicas captam o som de um artista perdido em ideologias, brigas e depressões, porém com uma veia social consciente que já havia sido plantada em What’s Going On.
Sendo mais obscuro comparado com seu antecessor, You’re The Man consegue ser uma centelha em alguns momentos, como Woman Of The World, um ode ostensivo ao feminismo. Como letrista e músico, Gaye se tornou uma pessoa mais cínica em atitude, comparado com a figura de santo implorador em Save The Children,um ano antes.
O álbum ainda conta com um grande número de baladas inéditas de 1969, como Symphony que deu trabalho à Salaam Remi, com o audacioso trabalho de fazer com que a bateria soasse contemporânea.
Gaye encontrou confusão, gravando um single de Natal, I Want To Come Home For Christmas, que a Motown se recusou a lançar. O que é compreensível já que a música é uma vestígio de miséria escrito a partir da perspectiva de um prisioneiro, enquanto Christmas in The City é mais uma balada instrumental com um sintetizador fúnebre ao fundo.
As músicas que Gaye abandonou têm fascinante ideias, algumas fantásticas. Confuso, dançável, cheio de alma, saudoso, como seu criador, o álbum é perfeito.