Por Carlota Cafiero (*)
A exposição que abre hoje (terça-feira) no Museu da Língua Portuguesa (MLP), em São Paulo, em homenagem a Cazuza poderia se chamar Cazuza Mostra as Suas Caras, pois são várias as facetas desse grande poeta da MPB. Morto precocemente, em 1990, aos 42 anos, o cantor e compositor deixou uma obra vasta, que fala das dores e amores de sua geração, e que encontra ressonância na juventude de hoje, sobretudo inspirando atitudes e novas palavras de ordem.
É a primeira vez que o museu – inaugurado em 2006 – monta uma exposição dedicada a um compositor. Antes, apenas escritores ganharam as salas do prédio da Estação da Luz, onde funciona o MLP. Autores da grandeza de Machado de Assis, Jorge Amado e Clarice Lispector, que influenciaram as letras de Cazuza.
Por que escolheram um compositor tão jovem e próximo das novas gerações para celebrar a língua portuguesa? Quem responde é o curador da exposição Cazuza Mostra a Sua Cara, o arquiteto, cenógrafo, designer e cineasta Gringo Cardia, contemporâneo do artista carioca: “Porque é um compositor que comunica aos jovens de hoje, que é o público que frequenta o museu”. O nome de Cazuza foi sugerido pelo diretor do MLP, o santista Antonio Carlos de Moraes Sartini.
Gringo conta que a exposição foi projetada duas semanas antes de estourarem as manifestações em todo o Brasil contra o aumento das tarifas de ônibus e a corrupção, em junho deste ano. O contexto altamente contestatório coincidiu com o período igualmente explosivo em que viveu Cazuza, durante a ditadura militar e o momento de abertura política do País, e essa coincidência delineou a atmosfera de toda a exposição em sua homenagem.
Ao adentrar o primeiro ambiente da mostra, o visitante dá de cara com dezenas de rostos de brasileiros de diferentes gerações, com versos de diversas canções de Cazuza estampados nas faces. São fotomontagens plotadas em papéis e tecidos que cobrem toda a sala.
O espectador também pode fazer parte dessa galeria de faces e ideias, escolher uma das “palavras de ordem” de Cazuza e se deixar fotografar com a frase estampada no rosto. Posteriormente, algumas imagens serão coladas na parede, umas sobre as outras – como lambe-lambes. As fotos também serão enviadas para o e-mail pessoal de cada fotografado.
Na sala seguinte, intitulada Mergulho na Mente do Poeta, foi criado um ambiente sensorial, com milhares de cabos de led brilhando em diferentes tonalidades, e ao ritmo das canções. As luzes refletem em um corredor de espelhos e criam imagens em 3D, como se fossem as conexões neurais do poeta.
Didatismo
Há, como em toda exposição do museu, uma preocupação didática, e isso aparece em duas salas: Poesia e Música, com telão que exibe uma arte em computação gráfica que faz correlação histórica entre literatura e canção popular, desde nomes do século 18, em Portugal e no Brasil, chegando a Cazuza, que bebia em diferentes fontes literárias para escrever suas letras; e O Tempo Não Para, com uma linha do tempo montada de maneira bastante criativa, com seis totens com animações que traçam um paralelo entre seis momentos da vida de Cazuza e as transformações políticas do Brasil.
A exposição continua por mais seis ambientes, que abordam todo o lirismo e irreverência do artista, por meio de entrevistas históricas e depoimentos em audiovisual de amigos, parceiros e parentes. Até os dois banheiros do museu foram transformados e ganharam um clima de boate, com projeções de shows de Cazuza. No último ambiente, pequenas relíquias do cantor, como escovas de dente e um par de tênis usados por ele.
Gringo conta que se baseou no espírito da época atual para criar a estética da exposição. “Inspirei-me na necessidade da juventude se comunicar e falar de tudo, assim como era Cazuza, que também falava e cantava de tudo, sobre amor, paixão, liberdade, ideologia, e que foi um ser político através de sua arte”.
O cenógrafo, inclusive, conheceu Cazuza: “Eu cuidava do visual da (banda) Blitz, desde as capas dos discos até o figurino e cenário. Ajudei a inserir a teatralidade no rock e me encontrei muitas vezes com o Cazuza nesse meio. Sempre que ele chegava, era sinônimo de confusão, mas isso era reflexo da alegria e da intensidade dele”.
Serviço – abertura hoje, das 10 às 22 horas, no Museu da Língua Portuguesa, Praça da Luz, s/n, tel. (11) 3322-0080 e no site. Visitas às terças-feiras, das 10 às 22 horas; de quarta a domingo, das 10 às 18 horas, lembrando que a bilheteria fecha uma hora antes. Ingressos: R$ 3,00 e R$ 6,00, com entrada franca aos sábados e terças. a exposição está aberta Até dia 23 de fevereiro.
Fotos: Nirley Sena / A Tribuna
(*) Reportagem publicada originalmente em A Tribuna no dia 22 de outubro de 2013