Todos Nós 5 Milhões: filme retrata abandono paterno
Chegamos numa das principais datas do ano: o dia dos pais, comemorado anualmente no segundo domingo de agosto. Representatividade não falta para a festividade, afinal, os homens estão presentes em diversas campanhas. Portanto, vamos falar no outro lado da moeda. De acordo com um dado divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça, existem, pelo menos, 5,5 milhões de crianças sem o reconhecimento paterno no Brasil. Lançado pela produtora O BAILE em agosto de 2019, o longa documentário Todos Nós 5 Milhões aborda o assunto colocando o dedo na ferida. Dirigido pelo cineasta Alexandre Mortágua, a obra é uma mistura de ficção e documentário, tendo a narrativa baseada nos dados citados acima. Por meio de depoimentos, inúmeras mulheres compartilham os sentimentos de uma mãe solo. Algumas foram abandonadas pelo parceiro assim que assumiram a gravidez. Outras, no entanto, sentiram a culpa e o peso da maternidade nas costas, sem o apoio paterno, familiar e estatal. Também há um depoimento forte e sensível de uma mulher que viu a mãe ser criada para cuidar das tarefas domésticas enquanto os irmãos pequenos foram para um internato. E ainda ser expulsa de casa quando engravidou. Em algum momento de sua vida, a filha passou por situações semelhantes à mãe, tendo que criar seus próprios filhos sozinha. Diferentes perspectivas em Todos Nós 5 Milhões Da mesma maneira, homens contam sobre a lacuna paterna em suas vidas, o apreço pela liberdade e falta de responsabilidade, e até a mesmo a criação de filhos não biológicos. História é o que não falta no longa. O filme é irretocável, explícito e tocante. Além deste tema, reflete sobre masculinidade, responsabilidade, feminismo, luta social, papéis de gênero, amor e criação. “A paternidade é sempre vista como uma opção a exercer. E a maternidade é olhada como uma função social. Caso você seja mãe, existe uma série de restrições sociais e situações que você passa, simplesmente, por você ser mãe. O pai tem esse direito de ir e vir, e principalmente de dizer ‘não quero’. (…) O aborto paterno… – odeio essa expressão – não é um aborto. É um abandono”. Fala de personagem do longa documentário Todos Nós 5 Milhões (2019) Mais de 11 milhões de mulheres no Brasil fazem o papel de mãe e pai De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2005, o Brasil tinha mais de 10 milhões de lares compostos somente pelas mães, sem cônjuge. No último levantamento, feito em 2015, os números mostraram 11,6 milhões nesse arranjo familiar. O levante das mulheres diante dessa realidade é notório, tendo em vista também que 5,5 milhões de brasileiros não tem o nome do pai no registro de nascimento. Segundo especialistas, existe uma dificuldade em mensurar qual faixa etária é mais prejudicial por conta das particularidades de cada ser humano. Porém, os impactos do sumiço paterno podem ser mais severos para crianças. Isso porque neste período ocorre a construção de identidade e personalidade, fatores determinantes em seus comportamentos futuros. Para assistir o filme, clique aqui.
Expresso do Amanhã, a série que você precisa assistir na Netflix
IN_CÔMODO: Santistas criam websérie sobre a vida durante a pandemia
Desde que as medidas de isolamento social foram adotadas no Brasil, a vida de todos não tem sido a mesma. Boa parte das produções audiovisuais do país foram interrompidas, mas em momentos como este, a criatividade é um diferencial para enfrentar a crise. Diante do “novo mundo”, dois santistas, profissionais do audiovisual, criaram uma websérie adaptada para o WhatsApp, chamada IN_CÔMODO. A produção retrata um grupo de vizinhos que lidam com a quarentena de diferentes maneiras. O material foi produzido à distância, utilizando equipamentos de celular. Assim, garantem respeito às normas e determinações da Organização Mundial da Saúde. Produção remota de IN_CÔMODO A iniciativa surgiu com Betinho Neto, de 35 anos, que viu no isolamento uma oportunidade de desenvolver um conteúdo dinâmico e engraçado, explorando os estereótipos que estão em alta na internet. “Todos que trabalham com arte estão em casa com a cabeça fervilhando. Nos grupos de WhatsApp, várias mensagens chegam com memes da quarentena. Nisto, pensei em produzir uma história baseada nos personagens da vida real”, conta. O artista chamou então o roteirista e montador Nildo Ferreira, de 31 anos, que começou a escrever as cenas e pensar na dinâmica da gravação. “Fomos convidando atores e conhecidos. Realizando a comunicação inteiramente pelas redes sociais. Fomos inspirados com o que víamos de notícia, seja ela de amigos próximos ou jornalísticas”, relata o profissional. A etapa de pré produção foi organizada num curto período de tempo, por meio de mensagens de texto e vídeo chamadas. Em apenas três dias, o conteúdo já estava pronto para ser visto. “Os personagens existem, estão em todos os grupos do WhatsApp e até mesmo na nossa família. Foi fácil diagnosticar esses estereótipos e trazê-los à tona. No final, IN_CÔMODO é uma observação do que acontecia nesse mundo louco do Zap Zap”, finaliza Betinho. À distância, atuam na produção Rosane Paulo, Priscila Calazans, Camila Baraldi, Digo Maransaldi, Bia Maran, Anna Castanha e Betinho Neto. A pandemia está deixando todo mundo maluco A história é pra lá de engraçada, chegando a lembrar a série brasileira Sai de Baixo (1996). Na história, seis pessoas completamente diferentes lidam com o avanço da Covid-19, mas os reflexos da pandemia afetam suas rotinas de formas diferentes. IN_CÔMODO é uma série sem papas na língua, com personagens realistas. A sátira se passa no momento em que vivemos, ou seja, todos estão confinados dentro de casa (ou não). Com o fim das aulas presenciais, um professor de educação física realiza as atividades por meio de lives. Os alunos tentam adaptar a rotina e praticar os exercícios no aconchego do lar. Paralelamente, em virtude do cancelamento de eventos, dois músicos precisam pagar a conta do aluguel e esforçam-se para conseguir o dinheiro. Para isso, realizam shows pela internet. Só que essa algazarra toda incomoda uma mulher, que está paranoica com o novo coronavírus. No mesmo condomínio, uma jovem busca manter a sanidade através da prática zazen. Entretanto, para complicar a vida de todos, uma senhora religiosa decide criar um culto clandestino. O músico Digo Maransaldi, de 45 anos, é um dos personagens da narrativa. Ele interpreta nada menos do que a própria vida. “ Os produtores da série viram as lives que faço com a minha esposa (Bia Maran) e tiveram a ideia de inserir na história os trabalhadores autônomos, em especial os músicos. Está sendo bem interessante desenvolver este lado da atuação, já que profissionalmente não sou ator, numa história divertida e atual”, comenta. Com cinco capítulos de no máximo seis minutos, o conteúdo está sendo disponibilizado em um grupo do WhatsApp. Entretanto, futuramente, os idealizadores do projeto pretendem lançar o material em alguma plataforma de vídeo. Por ora, você pode conferir a comédia acessando aqui.
Coraline: uma animação cheia de mistérios
Uma menina de cabelos azuis e gosto excêntrico por roupas coloridas chega à uma cidade monótona e cinza. Não satisfeita com o que vê, busca no vilarejo alternativas para acabar com o tédio. Esta é a premissa de Coraline e o Mundo Secreto (2009). Lançado há mais de dez anos, é até hoje um dos maiores sucessos do gênero fantasia e animação em stop-motion do mundo. O que muita gente não sabe é que o filme baseado no livro homônimo, escrito por Neil Gaiman, esconde mais mistérios do que possamos imaginar. Hoje vamos desbravar cada porta, janela, buraco e personagem da obra do cineasta norte americano Henry Selick, mesmo diretor de O Estranho Mundo de Jack (1993). A vida cinzenta de Coraline O filme começa com uma cena emblemática, embora a trilha sonora enigmática seja animada. De uma janela aberta, podemos ver uma boneca girar até chegar à mãos pontiagudas, formada por agulhas. Aos poucos, o objeto é aberto e transformado numa nova versão. Desta vez, uma menina de cabelo curto vestida com um sobretudo amarelo. Voltando a vida real – quer dizer, dá para diferenciar o imaterial neste filme? -, um caminhão de mudança chega até um casarão chamado Palácio Cor de Rosa, localizado longe do centro da cidade. O imóvel abriga mais três moradores, o senhor Bobinsky (Ian McShane), e as amigas Spink e Forcible (Jennifer Saunders e Dawn French). Os pais (Teri Hatcher e John Hodgman) da curiosa Coraline Jones (Dakota Fanning) são escritores e nem dão bola para a filha, que implora por atenção. Para que ela os deixe em paz, sugerem que ela faça um “tour” pela casa e vizinhança. Nos arredores do jardim, enquanto procura um poço, é surpreendida por um garoto da mesma idade, chamado Wybie Lovat (Robert Bailey Jr.). Dias depois, ele a entrega uma boneca idêntica à jovem. Com isso, a nova amiga começa a acompanhá-la nesta aventura. Sonho ou pesadelo? Em casa, os dias de Coraline não são fáceis. A comida do jantar não é boa, as amizades estão longe e não há nada que ela goste por ali. No entanto, durante uma avaliação crítica do casarão, encontra uma pequenina porta trancada. Claramente ela não a deixaria fechada por muito tempo. Por causa da grande insistência da menina, a mãe abre a porta e as duas se deparam com uma passagem, que um dia existira, mas no momento está fechada por blocos de concreto. Assim, não resta nada a fazer, a não ser dormir e esperar que os demorados dias passem logo. Ao ser acordada por camundongos uma noite, Coraline é levada pela abelhudice até a porta. Entretanto, desta vez a porta está aberta,abrindo uma longa passagem em tons violeta e azul. Aventureira do jeito que é, caminha pelo apertado espaço até chegar ao outro lado. Porém, não encontra nada menos do que sua própria residência. Mas de uma maneira bem diferente! Tudo parece ser mais alegre e divertido, até mesmo seus “outros” pais. Isso porque Coraline descobre que possui outra mãe e pai. Esses, na porta misteriosa, são mais atenciosos, carinhosos, alegres e prestativos do que os biológicos. No meio deste sonho quase encantado só existe uma coisa diferente: os olhos. No lugar deles, todos os habitantes do outro mundo possuem botões. Os olhos de botões O local utópico atrai a atenção da jovem, que vira e mexe vai visitá-lo. Contudo, o carinho desses novos pais começa a se transformar em pesadelo! Afinal, querem que Coraline costure botões nos olhos, e viva para toda a eternidade no casarão alternativo. – Você poderia ficar aqui pra sempre, se quisesse. – É mesmo? – Claro! A gente vai cantar e brincar. E a sua mãe vai fazer seus pratos prediletos. Só tem uma coisinha de nada que precisa fazer. – O quê? – É uma surpresa!” Diálogo de Coraline e o Mundo Secreto (2009) O lado bom é que a jovem percebe as mensagens subliminares do lugar. Tudo parece perfeito demais; o que garantiria que este mundo seria assim para sempre? A dificuldade é saber que embora diga não para a proposta dos olhos de botões, os novos pais não aceitariam a resposta. As ações aparentam ser em vão, dado que o mundo encantado não é tão imaterial quanto ela imaginava. Dormir e almejar que este pesadelo acabe não é suficiente, pois já faz parte do que sonhara um dia. Até porque, dentro de si, pedia começar uma nova vida – e sabe muito bem disso. Quem são e como sabiam da infelicidade de Coraline? Quando não havia mais nada a esconder, a outra mãe assumiu sua verdadeira forma, parecida com um aracnídeo. Ela é a cabeça de todo o sistema, que apesar de ser encantado, foi idealizado justamente para agradar integralmente suas novas presas: as crianças. Coraline seria a quarta vítima, já que as outras teriam se rendido aos encantos e costurado botões no lugar dos olhos, tendo suas almas aprisionadas no outro mundo. Através de bonecas feitas a partir da fisionomia das crianças, a outra mãe espia a infelicidade. Tudo indica que as outras presas viveram no casarão onde mora Coraline. A mãe dos olhos de vidro Teorias apontam que o filme foi baseado no conto A Outra Mãe, escrito na época vitoriana pela jornalista britânica Lucy Clifford. A história fala sobre duas irmãs, Olhos Azuis e Turquia, que viviam numa modesta casa perto da floresta. Apesar de serem felizes morando com a mãe, certo dia no caminho de volta à casa encontraram uma mulher que despertou a curiosidade e rebeldia das jovens. Esta figura disse ter nas mãos uma caixa onde viviam um pequeno casal. A mulher só poderia mostrar os minúsculos cidadãos caso elas fossem malcriadas em casa. Porém, a mãe das irmãs às alertou que se elas fossem birrentas, as abandonaria. E em seu lugar, uma outra mãe com olhos de vidro aparecia para cuidar delas. No final deste conto, as crianças são abandonadas pela mãe biológica e fogem para o bosque. Porém, sua nova figura materna é uma mulher com longos braços e olhos de vidro. “E a nova
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Transceda reflete sobre a realidade LGBTQIA+ no Brasil
Em 2018, o número de assassinato de pessaos trans chegou a quase 400 em todo o mundo. Os dados apontam o Brasil como país que mais mata pessoas trans no mundo. Segundo a Antra, Associação Nacional de Travestis e Transexuais, em 2019, houve 124 assassinatos no país, sendo as vítimas 121 travestis e mulheres trans e três homens trans. Vale ressaltar que a escala de assassinatos pode ser ainda maior, já que, a transfobia não é noticiada pela polícia e grande mídia. A maioria das vítimas chegam a óbito por espancamento. Diversos casos acontecem em zonas periféricas, onde há difícil acesso a informações. Projeto Transceda e documentário Viver em um mundo norteado pelo preconceito, por si só, já é difícil. Afinal, tudo que foge do padrão recebe olhares tortos. Por mais que seja complicado, encarar essa sociedade é muito mais sereno para pessoas cisgêneras. Isto é, indivíduos que se identificam em todos os sentidos com o seu gênero de nascença. No entanto, para pessoas trans, o panorama é catastrófico, pois a marginalização começa dentro da própria casa. Por isso, Bryan Henrique Faria de Souza, 20 anos, e Raphaella Silva Peixoto, de 19, decidiram criar um canal de comunicação informativo, educativo e acolhedor para a comunidade, em específico aos jovens trans. A plataforma online, nomeada Transceda, é dedicada a pautas da comunidade LGBTQIA+. O veículo de comunicação ganhou até documentário, que leva o mesmo nome. Entretanto, a ideia alcançou uma terceira pessoa, inspirada pela causa. O projeto tornou-se tema do trabalho de conclusão do curso de Jornalismo do estudante Vinícius do Carmo Almeida, de 22 anos. Então surgiu o curta documentário Transceda (2020), de quase 12 minutos, que foi gravado em apenas três dias. A ideia surgiu da proximidade do diretor com o tema ao acompanhar a batalha diária contra o preconceito. “Meu objetivo era transformar meu TCC em um canal de voz para estas pessoas. Ele tinha que ser prático, educativo e sensível”. “Uma ferramenta para os entrevistados contarem um pouco de suas histórias e sensibilizarem o espectador ao mesmo tempo, combatendo o preconceito a partir do conhecimento sobre o assunto. Eu, como jornalista, acredito muito na profissão como uma aliada das causas sociais, o que também foi fundamental na escolha do tema”, relata Vinícius. O filme também contou com a participação da estudante de Cinema e Audiovisual Isabella Graça. A equipe decidiu seguir um caminho informativo, explicando ao espectador sobre os conceitos de gênero. Além disso, abordam empregabilidade, marginalização, saúde mental e relacionamentos amorosos das pessoas trans. Tudo a partir do depoimento do casal de ativistas e agentes sociais. Um canal essencial para a comunidade LGBTQIA+ Neste ano, o projeto Transceda completa dois anos. Além de atuarem nas redes sociais, possuem uma sede física em parceria com o projeto Tia Egle, na Zona Noroeste, em Santos. O projeto também consiste em palestras sobre a temática em instituições e eventos. Em entrevista exclusiva ao Blog’n Roll, o casal fundador conta sobre o relacionamento, criação do Transceda e também o processo de amor próprio. “Nosso maior processo de aceitação foi juntes, pois quando começamos a namorar tínhamos muitos problemas com nossos corpos: bloqueios e inseguranças. O fato de sermos trans ajudou bastante para que houvesse uma grande empatia entre nós dois”. “Isso desenvolveu uma desconstrução dos nossos corpos. Agora fazemos coisas simples do cotidiano que antes não tínhamos coragem, como ir à praia ou andar com as roupas que sempre quisemos. Percebemos também a aceitação e respeito com o corpo do outro”, confessam. Nossos corpos são plurais. Existem várias maneiras de ser e estar. Existem várias maneiras de ser quem a gente é. A gente não precisa se limitar a uma coisa só. Raphaella Silva Peixoto Esse processo pessoal também afetou a produção do documentário. “Nós nos sentimos muito acolhides em todo o processo de gravação. Conseguimos compartilhar muitas experiências e vivências”. “Fizemos questão de mostrar o lugar onde moramos, de que além de sermos pessoas trans, somos pessoas periféricas, que estão em mais vulnerabilidade”, revelam. A busca pela reflexão, portanto, torna-se ainda maior. Ainda refletem juntes sobre a importância da informação e representatividade nos meios de comunicação. Confira o documentário Transceda, disponível na íntegra no YouTube:
Crítica | O Poço, de Galder Gaztelu-Urrutia
Um filme que começa sem pé nem cabeça, mas dialoga com a natureza humana e o extinto de sobrevivência. Este é O Poço (2019), longa que está em segundo lugar entre as produções mais vistas no Brasil na Netflix. O filme de ficção científica relaciona suspense e terror. Produzido na Espanha pelo diretor Galder Gaztelu-Urrutia, está tendo forte repercussão nas redes sociais pelos internautas. O cineasta também dirigiu 913 (2004) e La Casa Del Lago (2011). Um filme onde você se coloca no lugar da loucura! O filme começa dentro de um possível restaurante, onde um homem inspeciona alimentos e pratos prontos. Em seguida, vamos para um plano detalhe dos olhos de uma pessoa, que acorda pouco a pouco em um ambiente de confinamento. O protagonista Goreng, interpretado pelo ator espanhol Iván Massagué, olha ao redor e tudo que vê é um senhor, na faixa dos 70 anos, sentado na sua frente em um sala cinza. Quase que instintivamente, o personagem faz todos os questionamentos que o espectador faria. “Onde estou? O que é esse lugar?”. De modo ranzinza, o senhor, interpretado por Zorin Eguillor, responde as perguntas com um conhecimento de quem vive ali por muito tempo. – No que consiste o poço? – Óbvio, comer. – O que vamos comer? – As sobras das pessoas de cima. Diálogo entre os personagens de O Poço. Não demora muito para uma mesa farta de sobras descer dos andares acima. Desesperado, o senhor senta-se próximo e come de forma atípica, como quem não vê alimentos há meses. Aos poucos, Goreng descobre os mistérios do poço, assim como o espectador que o acompanha. O local possui mais de 200 andares. Cada um representa uma posição e, consequentemente, a fartura. Tudo resume-se a sobreviver. Isto é, comer para se alimentar no próximo mês. Em cada andar há duas pessoas, que dividem o confinamento enquanto estiverem vivos. Caso um deles morra, outros pares são formados. O fato é que, mensalmente, as duplas fazem uma espécie de rodízio nos andares. Neste mês, você se dá bem e fica com as primeiras posições, garantindo assim, uma boa alimentação. No entanto, no próximo, você pode ocupar o ducentésimo andar, onde não chega comida alguma. Desta forma, qual será sua opção? Como diz o ditado, um dia é da caça e outro do caçador. Um filme para quem tem estômago, literalmente O filme me deixou angustiada do início ao fim. Me coloquei nas posições dos personagens, perguntando-me o que faria se estivesse nesta situação. No começo, me senti enojada por ver as ações de alimentação das pessoas que ali vivem: algo instintivo e animal. Contudo, quanto mais o tempo passava, as coisas pioravam e pensar em um prato cuspido já não era tão ruim assim. O canibalismo neste filme é algo comum, portanto, é importante atentar-se para as cenas cruas e sanguinárias. Vai um pedacinho de fígado humano, aí?! Desigualdade e solidariedade O longa retrata a desigualdade social. Aqueles que estão nos andares de cima recebem mais alimento e, portanto, melhores oportunidades, podendo assim, gozar do benefício. Entretanto, aqueles que estão nos andares de baixo são seres esquecidos, sem nutrientes e vizinhos da loucura, comendo assim outras pessoas e a si próprios. Algo que está repercutindo de maneira negativa nas redes sociais é sobre o término do filme. O famoso final aberto, onde o público pode criar suas próprias teorias, é presente neste longa metragem. Grandes conclusões narrativas estão sendo pensadas, desde que não se passa de uma ilusão coletiva, até mesmo, falar que o poço representa um sistema insano de um jogo sanguinário. Mas, nada melhor do que basear sua conspiração na fonte. Em entrevista ao portal iHorror, o diretor Galder Gaztelu-Urrutia, de 46 anos, explica qual sua intenção com o obra de terror: “O filme não se trata de mudar o mundo, mas de entender e colocar o espectador em vários níveis e ver como eles se comportariam em cada um deles”. “As pessoas são muito parecidas entre si. […] Dependendo da situação na qual você se encontra, você vai pensar e se comportar de uma maneira diferente. Então, estamos provocando o público para entender os limites de sua própria solidariedade”, confessa. Você pode conferir o longa O Poço, que está disponível na Netflix.