Foto destaque: Marcela Mattos
Antes de seguir com a leitura desse texto, saiba que hoje (3) é o último dia para quem quer contribuir no financiamento coletivo do documentário Faça Você Mesma, da diretora Leticia Marques. O filme busca pelos desdobramentos do movimento punk feminista Riot Grrrl, a partir da trajetória de mulheres que foram e são atuantes na cena brasileira, resgatar a história do movimento através de imagens de arquivo de diferentes épocas e entrevistas com diferentes mulheres que viveram na cena punk desde a década de 1990. Para contribuir, acesse o Catarse.
Ok, quem acompanha a página do Blog n’ Roll em A Tribuna, aos domingos, quinzenalmente, sabe que esse espaço é exclusivo para histórias do cenário santista, certo? Pois bem, o movimento Riot Grrrl tem uma importante parte em Santos. Seja em fanzines ou bandas exclusivas de mulheres.
A fotógrafa Marcela Mattos, que editava o fanzine santista Descarga, no final dos anos 1990, é uma das entrevistadas do filme, tal Gigi Louise, do Hitch Lizard, banda de punk rock que fez história com suas duas demos, lançadas entre 1997 e 2001, além da professora de muay thai Andressa Saboya e as integrantes do Anti-Corpos, Adriessa Oliveira e Helena Krausz.
“Não dá para falar apenas em cenário santista. O Riot Grrrl era algo muito interligado com o que rolava em São Paulo. Nós subíamos direto para ver os shows do TPM e Dominatrix. Depois, o Hitch Lizard passou a se apresentar junto com elas. Como éramos da Baixada, fomos nos juntando e viramos amigas”, comenta Marcela.
O Hitch Lizard iniciou da paixão de um grupo de amigas pelo punk rock e o hardcore. Elas não queriam estar à frente do palco, segurando a mochila do namorado, enquanto ele saia para pogar com os outros. Elas queriam ser protagonistas também. E isso deu resultado rapidamente.
“Fizemos alguns shows e quando a gente percebeu ter uma banda de punk rock formada só por meninas era algo muito mais incomum do que pensávamos, isso nos deu uma certa visibilidade e nos impulsionou a ter contato com o feminismo e ganhar apoio de outras meninas que tinham bandas e projetos”, relembra a baixista, Gigi Louise.
Além da relevância obtida pelo Hitch Lizard, outras integrantes se destacavam no cenário. Elaine Campos, sempre muito ligada aos movimentos anarquista e anarcafeministas, foi vocalista da emblemática Abuso Sonoro, de Cubatão, um dos nomes punks mais importantes do cenário nacional.
Se não eram militantes, as meninas do Skalibur (Mariana Rezek Moruzzi e Letícia Alcover) mostravam a importância de se fazerem presentes no cenário. Dividiam os eventos com nomes regionais e nacionais, como a carioca Staples.
Diferente das bandas citadas acima, a região ainda mantém uma representante forte na ativa, a Anti-Corpos. Formada por Helena Krausz (bateria), Rebeca Domiciano (voz), Adriessa Oliveira (guitarra) e Marina Pandeló (baixo), a banda chegou a passar temporadas na Europa, com turnês pela Alemanha, Finlândia, entre outros países. Hoje está baseada em Berlim.
Da Praia Grande, a Anti-Corpos tinha influência de bandas do cenário nacional como Bulimia, Dominatrix e Menstruação Anárquica. “A cena riot foi importante pra mim porque comecei a tocar, descobri o feminismo, criei minhas amizades, aprendi tudo, me criei lá. Não tinha amigas da escola, da faculdade, tinha dos rolês, das bandas”, comenta a bateria Helena, em uma parte do documentário Faça Você Mesma.
Fanzines
Ao mesmo tempo em que a Hitch Lizard representava bem as meninas no palco, uma infinidade de fanzines feitos por mulheres despontava nas banquinhas dos shows. Foi justamente durante o período em que a banda se manteve ativa (1997-2001), talvez uma coincidência (ou não), o período foi bem produtivo. Nessa fase podemos destacar o Descarga, da Marcela Mattos, já citado acima, Alienação, da Camila Eleutério, Girl’s Renovation, da Andressa, Sasami, da Dani, Paranoia, da Isabela Carrari, Carina Boldi, Juliana Rocha e Lara Povia, Eclipse, da Helena, só para citar alguns.
Entre resenhas e entrevistas com bandas, muitas delas formadas apenas por homens, textos sobre feminismo marcavam presença. Na terceira edição do Sasami, por exemplo, um texto sobre meninas que geram seus filhos nas ruas dava uma amostra do que era debatido nesses fanzines.
Já a quarta edição do Alienação trouxe uma reflexão sobre a legalização do aborto. No número zero do Eclipse, um texto livre sobre as vantagens de ser mulher chamava a atenção. “Uma das grandes vantagens que as mulheres têm é o poder de se emocionar. É esse envolvimento que nos faz ter energia para sair em ajuda de uma amiga, defender uma causa, brigar por alguma coisa”, dizia o texto.
Hitch Lizard
Montar uma banda de hardcore composta só por mulheres, em 1997, em um cenário formado em sua maioria por homens, muitos deles machistas, parecia algo impensável para a Baixada Santista. Mas a Hitch Lizard segurou bem a bronca, com muita personalidade, presença de palco impecável e canções marcantes, além da influência e apoio de bandas do cenário paulista como TPM e Dominatrix, por exemplo.
“Éramos cinco amigas que tínhamos afinidades musicais. Duas faziam aula de guitarra, uma de bateria e eu nunca tinha tocado baixo, mas estudei violão por alguns anos na adolescência. Então, tivemos a ideia de fazer uma banda só de meninas e a amiga que não tocava nenhum instrumento e gostava de cantar foi para o vocal. Começamos ensaiando covers e aprendendo a tocar e a tocar junto com outras pessoas porque até então nenhuma de nós tinha tido banda. Mas logo nos primeiros meses de banda a gente já tinha algumas músicas próprias”, relembra a baixista Gigi Louise.
A formação original foi a mesma de 1997 até 2001, ano de término das atividades: Sachais (guitarra), Sunessis (vocal), Caroline (guitarra), Tatiane (bateria) e Gigi (baixo). As influências da Hitch Lizard eram bem variadas, iam da L7 até Nofx, passando por Green Day, Bad Religion, Bikini Kill entre outras que passavam mensagens semelhantes.
Alguns clicks da Marcela Mattos na região com bandas que representaram bem o espírito Riot Grrrl