Entrevista | Adi Oasis – “Qualquer pessoa com bom gosto musical conhece e respeita a música brasileira”

Entrevista | Adi Oasis – “Qualquer pessoa com bom gosto musical conhece e respeita a música brasileira”

Adi Oasis inicia um novo capítulo na carreira com o EP Silver Lining, um trabalho que reflete maturidade artística, renovação criativa e um olhar mais consciente sobre o presente. Conhecida pelas linhas de baixo marcantes, vocais potentes e uma fusão elegante entre soul, funk e R&B contemporâneo, a artista franco-caribenha apresenta um projeto que nasce da vivência. Entre novas parcerias, como a colaboração inédita com o produtor Carrtoons, e uma abordagem mais ousada em estúdio, o EP traduz um momento de evolução natural, sem rupturas, mas com claras expansões sonoras e emocionais em relação aos trabalhos anteriores.

Em entrevista ao Blog N’ Roll, Adi Oasis fala sobre esse período de transformação, impulsionado por experiências pessoais, pela maternidade e pela busca por esperança em tempos turbulentos. A artista comenta o processo criativo por trás de Silver Lining, a construção de faixas como “Stuck In My Head”, a importância de manter uma conexão honesta com o público e a relação cada vez mais forte com o Brasil, hoje um dos mercados mais relevantes da sua carreira. Entre reflexões sobre identidade, presença de palco e futuro, Adi reforça sua posição como um dos nomes mais consistentes e expressivos da nova cena soul contemporânea.

Falando sobre o seu novo EP, Silver Lining, esse trabalho marca um novo capítulo na sua jornada. Como você descreveria esse momento em comparação aos lançamentos anteriores?

Eu não sei se gosto de comparar. Para mim, é mais sobre evolução. Eu sempre falo sobre o que estou vivendo, e agora estou em um novo capítulo da minha vida. Desde o último álbum, me tornei mãe, conheci novas pessoas, vivi experiências diferentes e simplesmente coloquei tudo isso na música. Gosto de pensar em evolução porque é sempre algo muito especial.

Já que você mencionou a maternidade e o fato de escrever sobre suas próprias experiências, como isso afetou sua composição?

Afetou muito menos do que eu imaginava. Fiz recentemente uma entrevista com a Kadhja Bonet, que é uma das minhas artistas favoritas e também mãe de uma menina. Ela me lembrou que você não é apenas uma mãe, e isso é algo que estou aprendendo. Ser mãe me ensinou a fazer várias coisas ao mesmo tempo, mas também a focar completamente em uma coisa de cada vez.

Hoje eu escrevo mais rápido porque tenho menos tempo. Quando estou com meu bebê, sou totalmente mãe. Quando estou no estúdio, sou totalmente artista. No fim das contas, continuo sendo a mesma pessoa que eu era antes.

Esse EP marca sua primeira colaboração com o produtor Carrtoons. Como essa parceria começou e de que forma ela mudou seu processo criativo?

Eu entrei em contato com ele porque realmente gostava da música que ele fazia e também porque ele é baixista. Tive a sensação de que nós nos entenderíamos. Eu adoro como ele constrói as bases. Nos encontramos em um festival em Londres, eu vi o show dele, ele viu o meu, e sentimos que precisávamos colaborar. Fomos direto para o estúdio. Ele tem um processo muito diferente do meu, e foi exatamente por isso que quis trazer essa parceria para o EP. O resultado é algo bem único em relação ao que eu costumo fazer.

Normalmente, eu gravo tudo de forma muito rápida e ao vivo. Faço instrumentação ao vivo nos meus álbuns. Com o Carrtoons, ele trabalha muito mais como um beatmaker. Eu queria experimentar isso nesse projeto e confiei totalmente nele para conduzir esse processo.

Stuck In My Head é um dos destaques deste trabalho e traz uma energia muito particular. Qual é a história por trás dessa música e o que ela representa para você hoje?

Stuck In My Head foi, na verdade, a primeira música que fiz com o Carrtoons. A ideia veio para mim de forma muito espontânea, como geralmente acontece. Às vezes as músicas surgem quando acordo ou antes de dormir. Eu simplesmente ouvi “Stuck in my Head” na minha cabeça e pensei: e se eu escrevesse uma música assim?

Foi um momento muito mágico. Criar arte é se conectar com uma frequência e capturar um momento. Sem que eu precisasse explicar, ele parece ter sentido exatamente o que eu estava ouvindo na minha cabeça. Tudo se encaixou perfeitamente com o que eu imaginava.

Eu queria fazer algo mais agitado, algo que pudesse performar de forma intensa no palco. Eu amo cantar alto, amo essas notas grandes, no estilo da Chaka Khan. Essa música, para mim, representa exatamente isso: capturar quem eu sou como cantora em uma gravação.

Para encerrar esse bloco, você lançou a série Bathrobe Confessions, mostrando bastidores e conversas mais íntimas. Como essa conexão direta com os fãs se relaciona com a fase atual da sua carreira?

Eu estou em um processo constante de aprender sobre mim mesma e sobre como ser uma artista melhor. Acho importante que as pessoas saibam mais sobre quem somos de verdade. Quem escuta nossa música precisa lembrar que somos humanos, que passamos por coisas reais.

Quanto mais compartilhamos nossas experiências, mais fácil fica entender que não estamos sozinhos. Eu gosto muito quando um artista diz que quer ser melhor. Para mim, é isso que importa.

Falando sobre sua carreira, já faz um tempo que você mudou seu nome artístico para Adi Oasis. Qual é o significado dessa mudança e como ela representa quem você é hoje?

Adi Oasis é completamente quem eu sou. Eu encontrei meu som e minha imagem antes, e o nome veio depois. Para algumas pessoas é o contrário, mas para mim foi assim. Quando me encontrei artisticamente, ficou muito claro quem eu queria ser e o que esse projeto significava. Esse nome representa exatamente isso.

Sua presença de palco chama muita atenção, assim como sua identidade artística. Como você desenvolveu esse estilo? Foi natural ou teve alguma inspiração?

Eu cresci no palco. Comecei a me apresentar quando tinha seis anos de idade. É o que eu sei fazer. Eu me sinto muito mais confortável no palco do que em qualquer outro lugar, mais até do que conversando agora. O palco sempre foi meu lugar seguro.

Sua música costuma dialogar com questões sociais, identidade negra e empoderamento. O quão importante é para você usar a música de forma pessoal e também como posicionamento?

Eu não uso minha música de forma política, mas ela é definitivamente pessoal. Eu escrevo sobre o que estou vivendo. No meu último álbum, eu estava vivendo a pandemia, o movimento Black Lives Matter em Nova York e nos Estados Unidos, e era isso que eu precisava expressar.

Hoje estou vivendo outra fase. A situação política nos EUA está tão difícil que, sinceramente, eu não quero mais escrever sobre isso. Eu preciso sentir esperança. Por isso escrevi um EP sobre esperança. Silver Lining é exatamente sobre isso.

O Brasil se tornou um dos seus maiores mercados. O que essa conexão representa para você pessoal e artisticamente?

Significa muito. Tenho um amor muito profundo pelo Brasil e pelas pessoas de lá. Foi algo totalmente orgânico. Eu não estava tentando alcançar o Brasil de propósito. Foi uma surpresa linda.

Acho que essa conexão tem muito a ver com a minha história, com o fato de eu ter uma identidade cultural misturada, de ser uma mulher negra. O Brasil tem uma das maiores populações negras fora da África, e eu sinto que muitas pessoas se identificam com as mensagens que trago, especialmente no álbum anterior, onde falo sem medo sobre ser uma mulher negra, imigrante e mãe.

Falando em Brasil, como surgiu a música Cheirinho e a colaboração com o duo YOÙN?

Eu queria fazer outra música com um artista brasileiro. Já tinha colaborado com a Luedji e queria viver outra experiência. Ouvi algumas músicas do YOÙN, gostei muito e entrei em contato. Eu estava no Brasil por um mês no ano passado e fomos para o estúdio sem pressão nenhuma, só para nos conhecermos.

A música surgiu de forma muito natural. Eles já tinham a ideia e nós escrevemos juntos. Foi muito fácil e fiquei muito feliz com o resultado.

A música brasileira tem impactado muitos artistas internacionais. Você percebe isso também?

Com certeza. Às vezes sinto que as pessoas no Brasil não têm ideia do quanto a música brasileira é amada fora do país. Nos Estados Unidos e na Europa, qualquer pessoa com bom gosto musical conhece e respeita a música brasileira. Ela é enorme.

Seu último show no Brasil foi muito celebrado. Quando você imagina voltar e como seria o show ideal para esse reencontro?

O mais rápido possível. Espero que já no próximo ano. Eu toco em qualquer lugar, não importa. Amo o público brasileiro. Me convidem que eu vou. Adoraria tocar no Afropunk, por exemplo. Seria incrível fazer isso na Bahia.

Por fim, o que mais te surpreende ao se conectar com públicos de culturas tão diferentes ao redor do mundo?

O que mais me surpreende é perceber que não somos tão diferentes assim. Existem os mesmos tipos de pessoas em todos os países. Vivemos versões diferentes, mas no fim somos todos humanos.