O duo novaiorquino Machine Girl se apresenta pela primeira vez no Brasil neste sábado (26), a partir das 18h, no Hangar 110, em São Paulo. Liderado por Matt Stephenson, o grupo promete um show intenso e caótico, que reflete sua sonoridade explosiva e difícil de categorizar. Ainda há ingressos disponíveis para a apresentação.
Em entrevista ao Blog n’ Roll, Matt Stephenson contou que prefere não criar expectativas sobre a estreia em solo brasileiro. “Sempre que vamos para uma cidade nova como esta, é emocionante para nós estar em um lugar novo. Tento não ter expectativas porque cada show pode ser muito diferente”, explicou.
O Machine Girl surgiu como um projeto pessoal paralelo enquanto Matt Stephenson ainda fazia parte de outra banda. Após a dissolução do grupo, o projeto tomou forma e se expandiu, mas sem perder sua essência independente. “Sempre houve uma hesitação em deixar mais pessoas participarem, mas também é um alívio envolver mais gente e ter mais ajuda”, comentou.
A estética sonora do Machine Girl mistura punk, hardcore eletrônico, breakcore, noise e metal, criando uma identidade única. Stephenson descreve o processo criativo como algo natural: “Gosto de encontrar onde me sinto dentro desses gêneros que às vezes se sobrepõem e tentar fazer algo novo e único”.
O álbum MG Ultra, trabalho mais recente do duo, reflete o caos da sociedade contemporânea e busca, mais do que denunciar, traduzir sensações. “Não tentei fazer os sons refletirem temas específicos, mas o caos presente em nossas músicas é um reflexo da cultura do TDAH nas redes sociais”, comentou Stephenson.
Durante a entrevista, Matt Stephenson também revelou sua admiração pelo funk brasileiro, que chegou com força aos Estados Unidos. “A música fica tão distorcida que beira o noise, e ainda assim é algo mainstream no Brasil”.
Confira a entrevista completa abaixo.
Como estão as expectativas para o show?
É emocionante para nós estar em um lugar novo. E, além disso, tento não ter nenhuma expectativa de como será o show, porque pode ser tão diferente de um lugar para outro.
O Machine Girl surgiu como um projeto profundamente pessoal, quase como uma hiperfixação. Como esse impulso inicial evoluiu ao longo dos anos até se tornar esse universo sonoro tão expansivo e coletivo?
Sim, começou só comigo e foi quase um projeto paralelo meu enquanto estava em outra banda. Quando essa banda acabou, Machine Girl se tornou meu projeto principal. Mas sempre quis expandi-lo para onde está agora.
No entanto, queria meio que levar meu tempo fazendo isso e, em vez de me apressar para adicionar mais duas pessoas ao grupo, ir mais devagar.
Como você disse, é definitivamente um projeto pessoal, sempre houve um pouco de hesitação da minha parte em deixar mais pessoas participarem, mas também é meio libertador. De certa forma, é um alívio envolver mais pessoas e ter mais ajuda e tudo mais.
Vocês trabalham com uma estética sonora que desafia classificações. Como é o processo de criar algo tão caótico e, ao mesmo tempo, tão coeso?
Acho que tudo vem do mesmo lugar para mim, e gosto de encontrar onde me sinto, embora alguns desses gêneros se sobreponham, e aprimorar esses elementos e tentar fazer algo novo e único é o objetivo.
A cultura DIY parece estar no DNA do Machine Girl. De que forma esse espírito “faça você mesmo” ainda guia suas escolhas criativas e de produção?
Fui influenciado por muitos artistas de subculturas “faça você mesmo” que vieram antes da Machine Girl. E isso me inspirou a sentir que não preciso esperar por uma gravadora ou por alguém que venha me ajudar a concretizar minha visão. Acredito que com o poder do seu laptop, você pode fazer praticamente qualquer coisa agora. Isso tem sido basicamente verdade nos últimos 15 anos, mais ou menos, quando comecei a mexer com música eletrônica. “Faça você mesmo” nem era uma escolha. Era simplesmente a única opção para começar a fazer música.
MG Ultra é descrito como uma “antítese surrealista” da sociedade atual. Como vocês traduzem essas ideias complexas, como tecno-feudalismo, vida algorítmica ou pós-verdade, para o som?
Essa é uma boa pergunta. Não diria que necessariamente tentei fazer os sons em si refletirem esses temas específicos, além talvez do caos que isso envolve, como algumas das músicas do MG Ultra, que são loucas e confusas.
Acho que é um reflexo da cultura do TDAH nas redes sociais à qual todos estamos sujeitos. Em algum nível, como alguém que tem TDAH, no geral, foi meio fácil para mim fazer música muito louca e caótica.
O álbum novo tem um lado quase distópico, mas também soa como uma forma de resistência ou catarse. Você enxerga a música de vocês como uma espécie de “arma” contra o colapso mental e social do presente?
Não sei se a descreveria como uma arma. Mas acho que definitivamente não é um remédio, mas algo que pode aliviar alguns dos sintomas de viver. Estamos vivendo uma época muito distópica, cada vez mais distópica. Acho que, no mínimo, esse era meu objetivo.
Estava um pouco hesitante em fazer algo totalmente específico como o Rage Against the Machine, com exatamente os problemas que tinha e como lidar com eles, como uma espécie de apelo à ação.
Estava mais tentando pintar um quadro e criar um sentimento que acho que a maioria das pessoas tem no momento. Mesmo seis meses depois que o disco foi lançado, as coisas ficaram ainda mais loucas. Nem sei se o MG Ultra está à altura ou a par de como, pelo menos na América, as coisas estão meio sombrias atualmente.
O Machine Girl parece operar como um portal de universos paralelos, palavras discretas onde é possível escapar da vigilância e do controle. Como você visualiza esse mundo na prática?
Você quer dizer como se um mundo melhor fosse possível? Espero que sim. Não sei se haverá um longo período de dificuldades antes de chegarmos a esse momento melhor, mas parece que muito do que está acontecendo no mundo é um ataque a velhas formas arcaicas de poder, como tentar desesperadamente assim.
É como um último empurrão para reprimir qualquer forma de resistência contra os capitalistas globais. Tipo horas dessa elite de combustíveis, gente superpoderosa e rica que você conhece, infligem tanto sofrimento. É quase como se a única razão de viver deles fosse infligir sofrimento aos outros.
E parece que eles, lá no fundo, sabem também que é interessante porque, com toda essa tecnologia, a rapidez com que tudo muda, ela pode ser usada como uma forma intensa de bem ou uma forma intensa de mal. E parece que eles estão tentando usar o máximo possível dessa tecnologia para nos vigiar e controlar o máximo possível.
Mas sinto que isso só vem do medo de que eles saibam que chegará um ponto em que as pessoas vão reagir. Acredito que esse momento está chegando, mas não sei se já chegamos lá.
Resumindo a história, acho que um mundo melhor, um universo alternativo muito melhor do que o que estamos vivendo atualmente, é possível de ser alcançado. Às vezes sinto que estou num episódio de Black Mirror, sabe? Não sei porque eles ainda fazem a série, a realidade é pior.
Pra encerrar queria saber se você conhece algo de música brasileira?
Não posso dizer que estou super antenado em tudo o que acontece no Brasil, mas ouvi muita coisa de “baile funk” que chegou aos EUA. E, sabe, tem todos esses vídeos de DJs tocando suas músicas em volumes absurdamente altos, a música fica tão distorcida nos alto-falantes. É basicamente tipo noise, o gênero, mas ainda parece que no Brasil é uma música bem mainstream, o que acho muito legal.
Preciso conhecer mais, mas tem um DJ que estava ouvindo bastante, era bem louco. É o DJ K, não sei se vocês conhecem, mas é bem louco, o som dele é muito legal.