Após mais de uma década longe dos palcos, o Street Bulldogs volta à ativa para uma série especial de quatro shows em março de 2026. O retorno de uma das bandas mais influentes do punk/hardcore nacional passará por três capitais brasileiras: Curitiba (13/03, Stage Garden), São Paulo (14/03, Carioca Club e 19/03, Hangar 110) e Belo Horizonte (15/03, Galpão 54). As apresentações serão pontuais e marcam o reencontro do grupo com uma base de fãs que se manteve fiel mesmo após o fim das atividades em 2010.
Formado em Pindamonhangaba (SP), em 1994, o Street Bulldogs construiu uma trajetória sólida na cena independente, com discos que se tornaram referência do gênero, como Street Bulldogs (1998), Question Your Truth (2001), Unlucky Days (2003) e Tornado Reaction (2004). A sonoridade crua e direta, marcada por letras que equilibravam crítica e autenticidade, consolidou o grupo entre os principais nomes do hardcore brasileiro no final dos anos 1990 e início dos 2000.
Agora, com o vocalista original Leo vindo da Irlanda especialmente para a ocasião, o Street Bulldogs promete celebrar sua história em quatro noites intensas. A formação que retorna é a mesma que gravou o DVD no Hangar 110, em 2010: Fabio Sonrisal e Rodrigo Koala nas guitarras, Sanmy Saraiva no baixo, Guilherme Camargo na bateria e Leo Bulldog nos vocais. Em entrevista ao Blog N’ Roll, Koala fala sobre o retorno aos palcos, as memórias da banda e o impacto duradouro do Street Bulldogs.
O que motivou a volta do Street Bulldogs aos palcos depois de tanto tempo?
Fui pego de surpresa, pra ser sincero. Acho que o Guilherme, nosso baterista, e o Léo estavam conversando e eu nem sabia. Fui saber quando já estava decidido. Fiquei muito feliz, porque eu sempre quis voltar, mas o Léo era o cara que dizia que não queria mais. A gente até teve proposta no ano passado, mas ele não topou. Quando ele avisou que viria pro Brasil e que queria tocar, foi um choque bom. Acho que foi quando a gente parou de pedir que ele resolveu fazer.
Foi tranquilo reunir todo mundo e definir a formação?
Sim. A gente tem um grupo no celular e se fala direto, o que facilita muito. O que mora mais longe é o Sonrisal, em Pindamonhangaba, e o Léo, que vem da Irlanda. Então vamos deixar a banda redonda antes dele chegar. Quando ele estiver aqui, faz uns ensaios com voz e pronto. Eu e o Sonrisal estamos tocando direto, então estamos com ritmo. O Guilherme, que é batera, talvez sinta mais, ele está ativo com outros projetos, porém são músicas mais lentas.
Já dá pra adiantar algo sobre o setlist?
Ainda estamos escolhendo. Tem gente dando ideia de tocar músicas que nunca fizemos ao vivo ou que ficaram muito tempo fora. Vai ter surpresa, com certeza. E também deve ter participações. O plano é fazer algo inesquecível, principalmente no Hangar.
Com dois soldouts rápido em São Paulo, existe chance de novas reuniões ou até músicas inéditas?
Tudo pode acontecer. Hoje o Léo é muito resistente à ideia de voltar pra valer ou gravar algo novo. Fazer um show já é quase um milagre. Mas a música tem esse poder, né? Às vezes o cara pisa no palco e muda tudo. Se ele se animar, vou ser o primeiro a apoiar. Com a tecnologia, dá pra gravar à distância tranquilamente. Eu acredito que essa volta vai mexer com ele.
O punk brasileiro começou em português, com Cólera, Inocentes, Invasores de Cérebro… Mas o hardcore dos anos 90 foi majoritariamente em inglês com o Garage Fuzz, Hateen, Rivets e até mesmo Dead Fish chegou a cantar em inglês. Por quê?
A gente não tinha muita referência de como fazer hardcore em português. Parecia que o idioma não encaixava. A influência vinha toda de fora, e cantar em inglês era natural no underground. Bandas como o Sepultura também mostraram que dava pra ser brasileiro e cantar em inglês, e isso inspirou muita gente. A virada pro português veio mais pro final dos anos 90, e o CPM 22 foi essencial pra provar que dava pra soar bem cantando em português.
O Street também tem também algumas músicas em português…
Sim. Tem Padrão, Tarde Demais, Adolf… e talvez mais alguma. A gente deve tocar algumas delas nessa volta.
Qual show marcou mais, tanto positivamente quanto negativamente, na sua carreira?
Teve um com o Pulley no Volkana em São Bernardo que foi meio chato por causa do produtor. A banda era legal, mas o cara era mala. A banda era muito legal, os caras super gente fina, mas o produtor tinha um dentinho, a gente aprendeu ele de Tooth.
Já experiências ruins com bandas, quase nenhuma. A gente sempre se surpreendeu positivamente. O hardcore tem isso, as pessoas costumam ser acessíveis e gente boa. O que mais dava problema eram contratantes tentando dar calote. A gente tinha fama de bravo, mas era só cara de pedreiro mesmo, nunca batemos em ninguém.
Eu sei histórias, por exemplo, eu não estava na banda, mas quando o Agnostic Front veio para o Brasil, eles fizeram uma turnê com o Street, eu não estava no Street ainda. Eles foram fazer a Argentina junto. E o baterista do Street na época era o Gordinho, lá de Pinda.
E o Gordinho dormiu no carro. Aí ele deitou a cabeça no ombro do vocalista. Bem do Miret, do Roger Miret. Deitou a cabeça no ombro do Miret, né, cara?
E o Léo dirigindo falou que olhou assim, cara, falou, puta, fodeu, né, meu? Cara gigante, boladaço. Esse gordo filha da puta deitou a cabeça no ombro do cara, que ela vai matar a nós.
Aí falou o cara, pôs a sua mão nele assim, ele é um bom garoto, deixa ele dormir aqui e tal. Então acho que essas coisas, tipo… Ele me conta isso com muito carinho, assim, né?
Você tem falado sobre sua rotina mais saudável. Como enxerga esse novo rock mais “careta”?
Pra mim foi algo natural. Eu tenho 52 anos, e se você esticar muito a corda, se enforca. Vejo que a nova geração também está mais tranquila. Coisas como cigarro, que eram símbolo do rock, quase sumiram. Muita gente diz que o rock perdeu o perigo, mas eu acho que dá pra ser bom sem exageros. Fiz tudo o que quis, agora tô feliz levando uma vida mais equilibrada.
Após a pandemia, o emo voltou com força. Mas bandas como Hateen e Dance of Days parecem ter ficado de fora. Por que isso acontece?
Acho que existe um certo preconceito dentro da própria cena. Principalmente no emo, que tem uma estética muito fechada. Se você não se encaixa 100%, parece que não é aceito. O Hateen vem de uma geração anterior, uns dez anos antes, então o público que hoje tem 30 e poucos anos se identifica mais com as bandas que cresceram junto deles. A Nenê (Dance of Days) também passou por transições e acho que isso gerou algum tipo de resistência. Às vezes parece que ninguém lembra da gente, mas seguimos fazendo o que amamos.
Eu espero ainda ver… Um estádio cantando ou 1997 ou Se essas paredes falassem. Acho que seria épico.
Eu espero. Espero ver as duas coisas juntas ainda. Ia ser bem especial mesmo. Pra gente poder dizer que essa história foi contada por completo, né? Por todo mundo aí que participou disso.
Por que no Brasil é tão difícil ver turnês coletivas com várias bandas, como acontece lá fora?
O principal motivo é custo. O Brasil é enorme e caro pra viajar. Lá fora, as bandas tocam quase todos os dias, o que dilui as despesas. Aqui seria inviável, ainda mais com vans e ônibus custando o que custam. Falta também uma cultura de colaboração. Se uma banda grande levasse duas menores, todo mundo cresceria junto. Mas o que vejo é o contrário: as bandas que estouram seguem sozinhas e esquecem de quem vem atrás.
Antigamente isso acontecia mais. Quando eu tocava, eu vi o Hill Valleys trazendo o ForFun na van, depois o Dibob trazendo o Strike… E olha onde o ForFun e o Strike chegaram.
Essas coisas acontecem… Por exemplo, o Di do NX Zero. Uma vez eu saí do show do Hateen lá no Hangar 110. E o Di estava na porta, ele tinha ido no show do Hateen e o carro dele estava com o pneu furado. E estava só ele na rua e ele vira para mim e fala “Pô, não sei trocar pneu”. Eu fui lá e troquei o pneu do cara. Hoje ele está aí e eu estou aqui. Entendeu? Ele não sabia trocar pneu, então por isso que eu não fui adiante. Porque eu era muito pedreiro (risos).
E o tão sonhado “MTV 5 Bandas ao vivo”? Ainda é possível?
Falta dinheiro e coragem. Já falei várias vezes: se alguém bancar, as bandas topam. O Moptop voltou, gravou disco e fez show. Tá tudo se alinhando. Falta só alguém dizer “vamos fazer”. Seria incrível ver aquilo acontecer de novo.
Você é um dos grandes compositores da cena. Consegue fazer um top3 com suas composições favoritas?
O top 3 que eu mais me orgulho aí vai ficar fácil. A primeira que eu fiz em português na minha vida foi não sei viver sem ter você. Foi a primeira música que eu fiz em português e ela é um grande sucesso pro CPM22. Então tenho um orgulho muito grande dela
Depois, Um Minuto Fim do Mundo também. Que é uma música que me ajudou a realizar o sonho de ter uma casa, porque financeiramente falando, é a minha música mais rentável. É também a música mais tocada do CPM até hoje. Então para mim é um prazer É uma banda que eu adoro, com os caras que eu adoro.
E eu finalizo com outra música que eu me orgulho muito, que é 1997. É uma música que abriu muitas portas para o Hateen, mostrou que era possível a gente fazer músicas em português. Eu não acreditava no Hateen em português e a música é uma história real, de uma história que eu vivi. Ela serve pra contar e também exorcizar.
Sabe… A gente tem que continuar e seguir em frente, é importante… Eu poderia falar mais meia dúzia de músicas, mas eu acho que que dá pra ilustrar bem com essas três.
SERVIÇO
Street Bulldogs em Curitiba
Data: sexta-feira, 13 março 2026
Local: Stage Garden (Avenida Mal. Floriano Peixoto, 4142 – Prado Velho, Curitiba – PR)
Ingresso: https://articket.com.br/e/4710/street-bulldogs
Street Bulldogs em Belo Horizonte
Data: domingo, 16 março 2026
Local: Galpão 54 (Rua Francisco Soucasseaux 54, Belo Horizonte, MG)
Ingresso: https://eventos.gofree.co/street-bulldogs-tour-de-reunio_38053/
Street Bulldogs em São Paulo (ambos esgotados)
Data: sábado, 14 março 2026
Local: Carioca Club (Rua Cardeal Arcoverde 2899, São Paulo, SP)
Data: sábado, 19 março 2026
Local: Hangar 110 (Rua Rodolfo Miranda 110, São Paulo, SP)