São Paulo recebe no dia 29 de novembro a força de duas lendas do punk californiano. T.S.O.L. e Adolescents dividem o palco do Cine Joia na primeira edição paulista do Rockside, festival que nasce com a proposta de celebrar o rock em suas vertentes mais pesadas. A noite marca o retorno de dois nomes essenciais da cena mundial, ambos influentes há mais de quatro décadas.
Porém, para tristeza de muitos, será o último show do T.S.O.L. no Brasil. Formado no início dos anos 1980, em Long Beach, a banda, cujo nome são as iniciais de True Sounds of Liberty, se tornou uma referência singular por unir punk, death rock e hardcore. Liderada pelo vocalista Jack Grisham, a banda atravessou diferentes fases, mudanças de formação e crises internas, mas manteve sua relevância artística. Em 2024, o grupo lançou o álbum A-Side Graffiti, reafirmando sua vitalidade e a capacidade de transitar entre novas composições e releituras de clássicos.
Em entrevista ao Blog N’ Roll, o vocalista do T.S.O.L., Jack Grisham, relembrou a última passagem pelo Brasil, falou sobre a energia do público brasileiro, comentou o processo criativo do álbum A-Side Graffiti, abordou o legado da banda e revelou que a turnê atual pode ser a última visita ao país.

Você está feliz em voltar ao Brasil? A última vez que você esteve aqui foi em 2013…
Certo. Durante as revoltas perto da Copa. Você lembra? Eles levavam o dinheiro no ônibus, haviam protestos em todo o país porque todos os senadores recebiam pagamentos, mas as pessoas tinham que arcar com isso. Ninguém estava feliz com aquilo.
Sim, foi ano da Copa das Conferações. Depois a Dilma foi reeleita e, logo depois, aconteceu o impeachment. Mas, vamos falar de coisas boas, que lembranças dessa passagem você guarda?
Acho que não foi tanto o show, mas sim as pessoas. Havia um sentimento diferente. Acho que a América (do Norte) é muito tensa. As pessoas são muito tensas com as emoções. São reservadas, exceto pela raiva. No Brasil, tudo era mais leve, mais emocional. Eu gosto de emoções. Minhas melhores lembranças foram a gentileza, o amor e a emoção das pessoas. Havia um coração genuíno, algo que você não vê tanto na América.
É, a nossa América do Sul tem algo especial mesmo…
Sim. E é real. As emoções estão expostas e não escondidas. Se gostam de você, dizem. É caloroso, gentil. Eu realmente gostei da última vez.
O Brasil sempre teve uma cena punk ativa. Algum momento específico ou encontro te marcou?
Eu conheço muitos brasileiros porque surfo há muito tempo. Sou fã de surfe. O Yago Dora, que ganhou o campeonato, estava parado perto de onde eu estava hospedado. Eu o vi, gritei da janela do carro. Foi divertido. E, claro, às vezes você sai do show e tem um ônibus queimando na rua (risos). Mas nada que tenha sido ruim. Na verdade, quando não lembro de nada negativo, significa que foi bom.
Que praia você conheceu aqui?
Florianópolis. Eu amei. Moro perto do oceano aqui na Califórnia, então estar lá foi ótimo.
Em São Paulo a praia é longe, mas há várias famosas no litoral. Foi aqui que foi revelado o Medina, por exemplo.
Sim, eu sabia que não estava perto, infelizmente.
Já fazem 12 anos desde sua última vinda. Quais mudanças no setlist o público brasileiro pode esperar?
Fizemos outros discos desde então. O Trigger Complex e o A-Side Graffiti. Tocamos músicas desses trabalhos. Nosso set cobre toda nossa trajetória. Às vezes as pessoas ficam chateadas porque não tocamos músicas da época em que o Joe Wood cantava, mas naquela fase não havia nenhum membro original na banda. Você viu o filme Ignore Heroes? Havia dois T.S.O.L. ao mesmo tempo: o nosso, com os membros originais, e outro sem nenhum integrante original.
No álbum A-Side Graffiti há músicas novas, interpretações e covers. Como surgiu essa ideia?
Para mim, um álbum deve ser ouvido do começo ao fim, como um livro. Trigger Complex foi assim. Mas A-Side Graffiti é diferente, é como um mural de grafite. Uma coleção de ideias. Fizemos covers do Rocky Horror Picture Show, de Bowie, experimentamos coisas. Estávamos apenas vendo até onde poderíamos ir. Foi interessante.
Como foi a experiência da colaboração com o Keith Morris no álbum?
Bem, o Keith me pagou (risos). Eu o conheço desde o Black Flag original, quando ele cantava. É o meu favorito. Depois ele foi para o Circle Jerks. Somos amigos há muito tempo. Já participei de vídeos da banda dele, o Off!. Quando fizemos Sweet Transvestite, pensei que ele seria perfeito. Liguei para ele e disse que precisava dele. Ele veio na hora. Foi ótimo.
Como você equilibra respeitar as versões antigas e tocar com a identidade atual?
Nós soamos praticamente como antes. Já vi bandas mudarem suas músicas a ponto de você nem reconhecê-las. Eu não acredito nisso. Quero preservar o sentimento original. Não posso ouvir a bateria sem pensar no nosso baterista que morreu. Quando tocamos, penso muito nisso. Estou fazendo isso há 46 anos. Já toquei para gerações diferentes. Hoje há jovens que me viram na rua e não sabiam que eu era o mesmo Jack do palco. É engraçado.
Você falou em gerações, como você vê a importância do seu legado?
Seria muito orgulhoso dizer que sou importante ou influente. Se deixei alguma influência, espero que tenha sido pela amizade e bondade, por ser acessível às bandas jovens, por ajudar. Essa seria a influência que eu gostaria de ter.
Você vê seu legado mais forte no punk rock, death rock ou hardcore?
Acho que no fato de termos feito tudo. Nunca escolhemos um som só. Sempre mudamos, experimentamos. Nosso primeiro disco é considerado o primeiro registro de death rock dos EUA, antes dos Misfits. Sempre tentamos coisas novas, e esse seria um bom legado.
Sua banda sempre teve engajamento político e social. Você costuma estudar o cenário político dos países que visita?
Eu estudava mais. Hoje é difícil saber de onde vem a informação. É complicado encontrar a verdade. Quando quero entender algo, converso com as pessoas que vivem lá. Você nunca tem uma história direta, nem nos EUA. Na época das revoltas aqui, liguei para minha esposa e perguntei se ela estava vendo aquilo. E ela disse que na TV falavam apenas de uma pequena disputa estudantil. Então você precisa ouvir quem está no local.
Quais são os planos futuros? Já pensam em um novo álbum?
Não. Em janeiro temos três shows e depois vamos entrar em hiato. Estamos nisso há muito tempo. Nosso baixista Mike está muito doente. O Ron, guitarrista original, também. Às vezes é preciso saber a hora de encerrar. Vamos provavelmente nos aposentar em janeiro.
Então esta pode ser a última apresentação no Brasil?
Eu praticamente garanto que sim. Pelo menos para mim, para esta versão do T.S.O.L. Fomos à Europa no verão e o Ron não pôde ir. Toquei com músicos mais jovens, crianças praticamente. Foi bom, o público adorou, mas eu quero tocar com o Ron, o Mike, o Greg. Eles são minha banda.
Serviço:
Quando: 29 de novembro de 2025 – 19h (abertura da casa)
Onde: Cine Joia – Praça Carlos Gomes, 82 – Liberdade
Ingressos: Fastix