Veterana do rock alternativo dos EUA, a banda Spoon lançou recentemente o seu décimo álbum de estúdio, Lucifer On The Sofa. O disco é o primeiro desde Hot Thoughts, de 2017.
Com gravações no Texas e Califórnia, Lucifer On The Sofa traz nove faixas autorais e uma releitura de Held, do Smog, que abre o álbum.
Um dos membros originais do Spoon, ao lado do vocalista e guitarrista Britt Daniel, o baterista Jim Eno conversou com o Blog n’ Roll sobre o novo álbum, lembranças do Brasil, pandemia e influências na carreira.
Como surgiu o título deste álbum? Qual foi a inspiração para este nome curioso?
Britt escreveu a música e decidimos dar esse nome ao álbum. Não é como se eu e ele falássemos muito sobre os significados por trás das coisas. Para mim, é como se a pandemia me fez confrontar questões sombrias como mais importantes ou que vieram à tona.
Sou um workaholic, consigo sempre me distrair e não ter que lidar com essas coisas, mas não tem para onde correr quando você está nesse lockdown há dois anos. Você meio que tem que olhar o que está escondido. Olho para isso como algo que você vai ter que lidar em algum momento e ele está lá sentado no sofá, te observando.
Como foi o processo de gravação do álbum? Teve alguma dificuldade por causa da pandemia? Precisou adaptar algo?
Sim, foi bem no meio da nossa gravação. Nós tivemos que fazer várias mudanças no cronograma. Nós tínhamos talvez três quartos do álbum finalizados, estávamos muito perto de terminar e prontos para mixar e então veio a pandemia.
O que aconteceu foi que nós não conseguimos mais nos encontrar, obviamente porque era uma sala pequena e essa é uma doença transmitida pelo ar, não era seguro ficarmos juntos. Então o Britt usou seu tempo para escrever mais músicas.
Então tem músicas como, obviamente, Lucifer on The Sofa, acho que Wild e Devil and Mr. Jones que não estariam no disco, sabe? Mas acho que tiveram duas vezes em que todos voariam para Austin (Texas) e tivemos que cancelar porque os números (da covid) estavam tão altos.
Tivemos que pensar muito rápido, cortando coisas no último momento… Felizmente, Britt estava em Austin e ele aparecia e fazíamos algumas coisas, mas a pandemia nos afetou muito. No entanto, nós conseguimos superar!
O Spoon carrega uma forte influência do rock clássico e do art rock em seus trabalhos. É algo que predomina em suas influências? Você consegue pensar em alguma influência de sua terra natal também (Texas)?
Sim, eu sinto que esse disco teve muita influência do rock clássico, do começo do ZZ Top, Cheap Trick, John Lennon, Plastic Ono Band… o som de um bando de caras apenas tocando em uma sala. Esses são os discos que amamos, que crescemos ouvindo. Para nós esse é o disco que mais tentamos chegar próximo disso.
Como é sua expectativa de viajar e divulgar Lucifer on the Sofa em outros países? O que significa para você fazer uma turnê com o Spoon?
Nós adoramos ir para o Brasil… Nós queremos tocar para todos, sabe? E o público brasileiro é incrível, nós não vemos a hora de ir para o Brasil.
Você tem alguma previsão do Spoon vir para o Brasil? Um mês ou ano?
Nós definitivamente não temos um mês. Vocês terão Lollapalooza no mês que vem. Será que vai ter ou não? Tem muita incerteza ainda e acho que não conseguimos planejar se vocês ainda não sabem se os shows irão acontecer ou não, entende? Talvez no final do ano. Se tivermos o ok e estiver tudo bem, nós podemos ir e fazer funcionar.
Você se lembra de alguma história curiosa da passagem de vocês pelo Brasil, em 2018?
Eu lembro de uma história, mas não é muito engraçada. Nosso último show foi em São Paulo e nós terminamos muito cedo, então eu e o Gerardo, guitarrista, pensamos, vamos mudar nossos voos e voar essa noite. Então trocamos os voos, entramos na van para o aeroporto e colocamos no Google e apareceu que iríamos demorar quatro horas para fazer 24Km… Isso não pode ser verdade, eu pensei.
Nós ficamos sentados na van por 4 horas, perdemos nosso voo e tivemos que ficar em um hotel de merda. E acabamos pegando exatamente o mesmo voo que iríamos pegar no dia seguinte, que havíamos cancelado. O tráfego nos ferrou (risos).
Chegou a assistir algum show no momento que as regras ficaram mais brandas?
Teve uma janela no ano passado, quando as pessoas começaram a se vacinar e antes da chegada da Ômicron, foram os nossos “Loucos Anos 20”, aquele período entre a Primeira e Segunda Guerra Mundial, quando todos estavam dançando, muito felizes.
Em resumo, acho que essa pequena janela foi como yeah, legal… nós fizemos alguns shows, foi muito legal, todos estavam curtindo… até que veio a Ômicron e tudo voltou a fechar. Consegui ver alguns shows nesse período.
Você se sente seguro para viajar com seus colegas de banda?
Acho que sim… nós vamos fazer tudo que for possível na tour para tentar minimizar e não ficarmos doentes. Porque se um de nós testar positivo, temos que encerrar tudo. Então agora nós estamos comendo todos juntos, nós não permitimos ninguém nos bastidores, estamos fechando tudo para tentar ser mais seguro. É um novo modelo de fazer tour, todos estão fazendo. Não levamos a família, somos só nós mesmos.
A primeira música de um álbum costuma ser o cartão de visitas de muitos artistas. O que motivou a escolher um cover do Smog (banda) para abrir?
O que procuramos em uma música de abertura é aquela que vai estabelecer um tom para o álbum. Então sentimos que aquela definitivamente conseguiu isso. Tem muita conversa de estúdio antes da música começar, o que é legal e divertido. É como se te desse a sensação que estávamos na mesma sala quando gravamos, o que foi mesmo… mas também é um ritmo mais lento o que nos permite ir aumentando o ritmo até as músicas mais rápidas.
Mas acho que o aspecto rock n’ roll do disco e o tom foram realmente estabelecido por essa atmosfera. Nós não estávamos pensando, ah é um cover, estávamos mais pensando, isso é a nossa versão de como seria uma abertura de disco quando é a primeira coisa que a pessoa irá ouvir do Spoon depois de cinco anos. Sentimos que essa música seria uma escolha muito forte.
On The Radio traz muita nostalgia, principalmente pela forma como ouvíamos e descobrimos artistas antes. O streaming é um formato que te agrada? Quais são as vantagens e desvantagens?
Seria ótimo se todos ouvissem apenas discos e comprassem nossa música, essa seria a melhor coisa. Então sim, existe nostalgia aí… Foi assim quando nossa banda começou. Nós já estivemos do outro lado, antes das redes sociais e tudo mais.
Mas, como artista, você tem que jogar com as cartas que se tem. Você tem que estar nesse ambiente e alcançar o maior número de pessoas possível. Muita gente só ouve por streaming e temos que avisar que lançamos o álbum do Spoon.
Você tem o hábito de ouvir playlists do Spotify, por exemplo, para descobrir novos artistas?
Não! Geralmente fico sabendo por alguém de novas bandas e discos ou pela rádio. Tem uma rádio que ouço bastante aqui em Austin chamada KUTX.
Wild também tem uma mensagem muito boa: encontrar um caminho fora das profundezas em busca de um mundo cheio de cor e vida. O que te inspirou nessa canção?
Britt escreveu essa música, mas para mim é muito esperançosa e emblemática. Quando ouço essa canção, eu só quero festejar, sabe? Parece uma celebração, como se fosse vamos sair dessa pandemia, fazer um show ao vivo e depois tomar uns drinks.
Consegue listar três álbuns que ajudar a te formar como músico?
Um seria Tres Hombres (1973), do ZZ Top, que é um estilo de disco de rock dos anos 1970. Essa seria definitivamente uma grande influência deste disco.
Eu diria também In Rainbows (2007), do Radiohead. Esse é um dos meus discos favoritos.
Por fim, para mim, que cresci ouvindo muito The Smiths, U2 e R.E.M., incluo Hatful of Hollow (1984), do The Smiths.
*Tradução e entrevista por Isabela Amorim