Seis anos atrás, quando conversou com o Blog n’ Roll, o tecladista do Deep Purple, Don Airey, avisou que a aposentadoria estava próxima. Não quis fazer jogada de marketing, nem nada parecido. Apenas confidenciou que provavelmente não entraria mais em turnês mundiais.
Para a sorte dos fãs brasileiros, o plano ainda não foi ativado. O Deep Purple é uma das atrações do Monsters of Rock, que acontece neste sábado (22), no Allianz Parque, em São Paulo.
Em nova entrevista ao Blog n’ Roll, Don Airey explicou o que mantém a banda na estrada, falou da relação com a música brasileira e a entrada definitiva de Simon McBride no lineup do grupo.
Seis anos atrás, em uma entrevista ao nosso site, você disse que estava muito próximo da aposentadoria. O que mudou e te motivou a seguir na estrada?
Nada realmente mudou. A covid veio e deixou tudo parado. E, claro, quando a covid foi embora, todo mundo do showbusiness estava voltando. Nós continuamos porque tinha muita demanda de pessoas que queriam nos ver. Eles pagaram o que nós pedimos e nós voltamos, simples assim.
Mas ainda é contagiante viajar e se apresentar?
A coisa mais importante quando você é um músico, é tocar ao vivo. Você pode tocar sozinho, pode ensaiar, tocar no estúdio, mas a coisa mais gratificante é ir para o palco com um grande público e fazer o que você sabe fazer melhor. Nós amamos ir para a América do Sul, especialmente no Brasil.
Não vejo a hora de ir para São Paulo. É um lugar muito emocionante para estar. Ao longo dos anos nós fizemos muitos amigos aí, não é como voltar para casa, mas nos sentimos muito confortáveis.
A viagem longa é um fator complicador?
Me sinto muito confortável em ir para a América do Sul. Sempre é muito emocionante. Existem muitos problemas logísticos para levar os equipamentos entre os shows, mas sempre vale o esforço. Os fãs são tão incríveis. Eles são tão receptivos e sensíveis.
Aliás, de 2017 para cá, foram mais dois álbuns de estúdio lançados. Pretendem seguir gravando e lançando álbuns?
Sim, algo sobre você ter uma banda de rock é que se você quer continuar trabalhando, e continuar fazendo shows, terá que produzir material novo, é como o negócio funciona. O último álbum acredito que tenha sido o melhor que fiz com a banda, mas foi no período da pandemia, então não pudemos trabalhar tanto com ele.
Por que?
Acho que devido a produção, fez com que nós entregássemos o melhor material. Por exemplo, os solos de teclados foram feitos ao vivo em maioria, não fiz dobras de gravação, então dá uma sensação de ao vivo, as músicas são boas, é um bom material.
Da última vez que veio ao Brasil, o Deep Purple tocou com grandes nomes como Cheap Trick e Tesla. Agora terá a companhia do Kiss, Helloween, entre outros. Vocês se sentem mais à vontade tocando com bandas clássicas do rock?
Quanto mais pesada a banda, melhor para nós. No nosso primeiro show em Bogotá foi muito bom rever o Helloween, não os víamos há um bom tempo, somos velhos amigos, e eles ainda tocam muito bem, tocamos depois deles, e o Scorpions tocou depois de nós.
É uma ótima atmosfera nos bastidores, não apenas entre as bandas, mas entre as equipes. O contador do Kiss é o mesmo cara que trabalhava com o Ozzy, quando eu tocava com ele, será bom revê-lo.
Todo mundo acha que estar em uma banda de rock é beber, se drogar, e fazer coisas horríveis, mas é muito agradável os bastidores. Acho que isso reflete nos shows.
Queria que você falasse um pouco sobre a entrada do Simon McBride no Deep Purple.
Trabalho com ele há 10 anos. Ele tocou no meu projeto solo nos últimos três álbuns. Ian Gillan começou um projeto de orquestrar e pediu minha ajuda, então minha banda acompanhou ele nos shows, e ele me disse que Steve iria sair e tinha que substituí-lo, e não procuramos em lugar nenhum, ele era o cara.
Steve tinha coisas ruins acontecendo na vida pessoal, não podia mais pegar estrada, então chamamos Simon. Isso deu ânimo para a banda, ele toca muito bem, e coincide com a troca de agente, e ele é bem mais novo, tem 43 anos. Ele surpreenderá muitas pessoas.
O que o público brasileiro pode esperar do show do Deep Purple? Pretendem priorizar algum disco? Ou terá um pouco de cada fase da banda?
Vocês verão um verdadeiro festival de Heavy Metal, com todas as bandas que estarão lá. Tocaremos clássicos, mas terá alguns materiais novos, algumas surpresas, solos, alguns vídeos. É uma nova versão do Deep Purple que será vista, as pessoas ficarão surpresas e gostarão. Nós gostamos.
Quando você olha para trás, se arrepende de algum álbum ou música que você gravou? Por que?
Eu era um arranjador, um músico de estúdio, nos anos 1980, estava trabalhando em um estúdio em Londres, e um cara tentou capitalizar em cima do sucesso de Another Breaking in The Wall. Fizemos uma versão de Hey Jude, com gaitas de fole e coral de crianças, era o que ele queria. Foi a pior coisa que já fiz na minha vida, e nem fui pago por isso.
Consegue listar três álbuns que mudaram sua vida? Quais? Por que?
Um do Charlie Parker, Live at Townhall, foi gravado em 1946, mas saiu em LP em 1956 e meu pai comprou para mim, completamente maravilhoso. Álbuns de jazz me marcam muito. Chick Corea tem um, de 1968, chamado Now He Sings, Now He Sobs. Electric Ladyland, de Jimi Hendrix, também tem um efeito profundo em mim.
O jazz é muito presente na sua formação, certo?
Como um tecladista, ter uma veia jazzística é muito comum. Estou ouvindo agora uma nova estrela da cena, Domi Louna. Ela é de uma dupla chamada Domi & JD Beck, na qual ela toca teclado com um baterista. O álbum se chama Not Tight, é incrível, é tudo que ouço no momento.
Outro álbum que me marcou muito foi Todd Rundgren – Hermit Of Mink Hollow, de 1980. Gary Moore me deu este disco, e disse que deveria ouvir. É divertido que os álbuns que mais te influenciam não acabam sendo os que vocês esperavam que fossem. Este último não foi um grande sucesso, mas é um ótimo trabalho.
Todd fez um álbum todo sozinho, passando três meses no estúdio, tocando todos os instrumentos, fazendo os backing, uma criação incrível. Escuto muitos tipos de música, muita música clássica, comecei como um pianista clássico.
Tem algum artista brasileiro que cative você?
Antônio Carlos Jobim. Sou muito fã de Jobim, sei tudo, amo Bossa Nova. Heitor Villa-Lobos é um dos meus preferidos. Aliás, estive no Rio anos atrás e fui à casa dele, é um museu.
Dará tempo de alguma programação extra no país?
Desta vez vou fazer paraquedismo em São Paulo. Não temos muito tempo para sair quando estamos na estrada, se queremos sair temos que sair de manhã porque de tarde temos que nos preparar para o show.