Faz 50 anos e o mundo nunca mais foi o mesmo… Revolução sem causa específica, barricadas de amor, slogans libertários, muito sexo embalado por rock obviamente: o levante mundial da juventude tendo Sartre, Mao e Che com trilha sonora dos Beatles e Rolling Stones! Todas as criatividades à flor da pele e todos os sonhos nos corações vibrantes entre o Quartier Latin, o Soho londrino e a Califórnia exuberando nudez de alma por corpos livres.
Se em Pindorama a Tropicália vivia crise existencial do uso da guitarra elétrica , os Mutantes já inovavam sem medo incorporando a psicodelia à musica brazuca: era na verdade naqueles anos de trevas a primavera luminosa com o sorriso meigo de Rita tão confederada quanto o General Lee… Com outro Lee, o Wesley, esses descendentes do Sul inocularam a febre cosmopolita na esteira da cultura pop em grande modo fruto por aqui dos ecos de 1968.
Esse ano mítico foi apogeu da descoberta da juventude no Ocidente: os nascidos depois da Segunda Guerra se rebelavam contra o status quo na arte, costumes e o poder careta representado por De Gaulle, Nixon e no Brasil pelos gorilas da ditadura. O nexo causal é óbvio: Woodstock, Hendrix e Joplin passam por esse miolo contracultural dos anos 1960, que tiveram farol nos bulevares de Paris lendo o Livro Vermelho e Marcuse.
1968 catalisou as micros revoluções cotidianas no consumo de arte, a insurgência feminista, o existencialismo, as lutas anticolonialistas, as proezas de Castro & Ho Chi Min e movimentos estéticos como os beatniks que desaguariam nos hippies. Bob Dylan e Eric Clapton já pontificavam nas redondezas ao lado da onipresente Joan Baez. Farewell Angelina e Diamond and Rust me veem a mente para ilustrar musicalmente o período…
O rock militante, o rock com raízes étnicas, o rock folk, o rock no turbilhão de todas as fontes convergentes! Maio foi só ponto alto de movimentos tectônicos por todo planeta. Em agosto os Beatles lançariam a deliciosa Hey Jude e o carro-chefe dessa bossa: Revolution, quase um hino de louvor ao espírito do tempo!
Talvez seja nesse período a maturidade do rock incorporando outras vertentes de validade ao seu ritmo e propósito de inovação constante….pedras que rolam incesssantes! Surge então eis Street Fighting Man, versão musical definitiva da ira colorida dos protestos: faixa de qualquer instante onde paralelepípedos fossem arremessados, da Rua Maria Antonia ou nas calçadas da Sorbonne. A saborosa canção entraria por 1969 (sugestiva numeração ao transe) nas batalhas campais contra o Vietnã e na esteira da onda reacionária pós assassinatos de Bob Kennedy, Martin Luther King e em combate do ícone Guevara.
O rock composicional, conceitual, a música casada à grande poesia inauguravam um espaço privilegiado de reflexão cantada. A frivolidade ficara para trás: alienado era o maior palavrão que alguém poderia carregar. Esse legado que ainda germina e sobre ele vou escrever muito esse ano. Porque se literatura é um tesão, o rock é seu orgasmo! 1968 vive!