No dia 21 de junho de 1994, o Rancid lançou o segundo disco da carreira: Let’s Go. Chegando nas prateleiras pouco depois da explosão do Dookie e Smash, logo ele entrou no radar dos fãs de punk rock californiano. Inevitavelmente, o material realmente fazia parte da mesma cena de Green Day e do The Offspring.
Apesar de não ser bem-sucedido comercialmente como os citados, o álbum conseguiu ser importante em outros aspectos. Por exemplo, ele provou definitivamente que o Rancid não era apenas “a banda dos ex-integrantes do Operation Ivy”. Além de mostrar que a Epitaph Records estava construindo um casting incrível.
Aproveitando os 25 anos de Let’s Go, nesta edição do PPA resolvi me aprofundar mais na história do álbum. Então, lá vamos nós com mais um “PPA: Clássicos do Pop Punk”!
Let’s Go!
Para o Rancid, Let’s Go era um grande passo na sua carreira. Assim como o início de uma nova era cheia de mudanças fundamentais para o que eles se vieram se tornar no futuro. Após o lançamento do disco de estreia homônimo em 1993, a banda queria um som mais completo. Então, decidiram incluir mais um guitarrista na formação.
Até aquele momento, a banda era formada apenas por Tim Armstrong (vocalista, guitarrista), Matt Freeman (baixista, vocalista) e Brett Reed (baterista). Por afinidade (e amizade), o trio convidou Billie Joe Armstrong do Green Day para a vaga.
Após uma apresentação no lendário Gilman Street Club e ajudar na composição do hit Radio, Billie Joe deu preferência ao Green Day. O grupo já começava a ter um relativo sucesso e estava prestes a gravar o Dookie. E o resto nós já sabemos.
Para a posição de segundo guitarrista, o Rancid contratou Lars Frederiksen. O guitarrista, que já tinha passagem pelo UK Subs, trouxe uma pegada ainda mais street punk. Sem dúvidas, sua bagagem pessoal e musical era o segredo para o estilo mais agressivo.
Como teste para o novo integrante e a nova “sonoridade”, o quarteto gravou o EP Radio Radio Radio (1993). E deste lançamento pela Fat Wreck Chords, duas músicas foram reaproveitadas em Let’s Go. Assim, Radio e Dope Sick Girl conquistaram espaço no álbum lançado no ano seguinte.
Side Kick
Além de ser o primeiro trabalho completo com Lars Frederiksen, Let’s Go deu sequência a parceria do Rancid com a Epitaph Records. E por consequência com Brett Gurewitz, guitarrista do Bad Religion e dono da gravadora, que assumiu a produção do álbum.
De acordo com ele, a decisão de assinar o contrato com a banda foi tomada sem ao menos ouvir uma demo. O músico simplesmente acreditava no potencial da dupla Tim Armstrong e Matt Freeman por conta do passado deles com o Operation Ivy.
Todas as faixas de Let’s Go foram gravadas em apenas seis dias no Fantasy Studios em Berkeley. Surpreendentemente, o mesmo estúdio em que o Green Day gravou o Dookie alguns meses antes.
Durante a parte final da produção, um fato curioso aconteceu. O álbum precisou ser mixado duas vezes. Na primeira vez, as músicas pareciam incríveis no som do carro alugado por Mr. Brett. Contudo, elas ficaram horríveis em outros aparelhos em que testaram. Então, ele precisou remixar tudo em apenas dois dias.
Let’s Go foi planejado originalmente para ser um álbum duplo. No entanto, a tracklist final foi organizada a ter apenas 23 músicas e assim coubesse em um CD, a mídia da época. Apenas as versões mais recentes em vinil saíram em dois LPs de 10 polegadas.
O mais curioso desta história é que muitos críticos compararam o álbum com os primeiros anos do The Clash. Por exemplo, som agressivo era um argumento comum para essa comparação. Então, vale lembrar que o clássico London Calling (1979) foi também um dos primeiros álbuns duplos do punk rock, aumentando as similaridades entre as bandas.
Salvation
Grande parte das letras de Let’s Go foram compostas por Tim Armstrong. Por isso, elas possuem algumas histórias sobre a vida de um punk em East Bay. Elas exploram fatos pessoais, bem como a forma como ele observava as ruas da região.
Salvation, um dos principais singles, resume as experiências do músico ao trabalhar para o Exército da Salvação. Na época, ele recolhia doações em bairros ricos de Oakland para a instituição de caridade em troca de um lugar para dormir e algumas refeições.
Sem soar clichê, a faixa crítica como os ricos desperdiçam dinheiro e logo se desfazem de diversos itens ao doar para os necessitados. Ao mesmo tempo, um trecho destaca que se ele não fosse o uniforme de serviço, Tim seria considerado suspeito pelos moradores.
Mais densa do que parece, Tenderloin fala sobre o bairro de mesmo nome em São Francisco. O local é conhecido por ser uma zona de prostituição com altos índices de violência e também por abrigar diversas pessoas em situação de rua.
Para falar como a vida é difícil para quem vivia naquela região nos anos 1990, Tim Armstrong conta a história de uma moça que precisa se prostituir. E desta forma, ele expõe os preconceitos sofridos por aqueles que recorrem a isso para poder simplesmente sobreviver.
Radio Radio Radio
Porém, nenhuma letra de Tim Armstrong é tão pessoal quanto a já citada Radio. Nela, o vocalista deixa claro que a música o salvou. Filho de um pai alcoólatra, ele nunca teve o carinho e atenção que gostaria. Algo que ele só conseguiu encontrar ao ouvir os discos dos seus artistas favoritos.
Infelizmente, o músico também veio a ter problemas com o álcool no inicio da vida adulta. Porém, com a ajuda de amigos como Matt Freeman, ele voltou a ficar limpo e assim eles deram inicio ao Rancid.
Portanto, Radio reflete bastante da vida do músico desde quando era pequeno até a fase adulta. E, novamente, mostra com a música – principalmente o punk rock – foi fundamental para sua sobrevivência.
Histórias como estas fizeram Brett Gurewitz dizer que Tim Armstrong é a versão punk rocker de Bob Dylan. Ou seja, o músico tem uma habilidade de falar sobre a realidade ao seu redor, por mais dura que ela seja, mas de forma poética.
Dope Sick Girl
Durante seu lançamento, Let’s Go chegou ao número 97 do Billboard 2000. No entanto, o reconhecimento comercial só veio muitos anos depois. Por exemplo, o álbum conquistou o certificado de disco de ouro apenas em julho de 2000.
No entanto, pouco depois do álbum chegar às lojas em 1994, o Rancid começou a ser sondado por grandes gravadores. Obviamente, todas buscavam uma nova galinha dos ovos de ouro como o Green Day era visto na época.
Entre elas estava a Maverick Records, companhia fundada pela Madonna. E com isso vem uma das histórias mais engraçadas sobre a banda. Existem rumores a rainha do pop enviou fotos sensuais para os integrantes como forma de conquistá-los. Porém, a banda continuou Epitaph Records e ainda continua “independente” até hoje.
Apesar de não alcançado um imenso sucesso como seus contemporâneos, Let’s Go era apenas um teste. O disco pode ser considerado o início para algo maior que o Rancid só apresentaria em …And Out Come the Wolves (1995). Mas, essa história é para um outro post!