Hey pessoas! Chega-me às mãos via Spotify (mãos? O mundo mudou muito!) um disco nacional do qual gostei. Há sinceridade nele, grande ingrediente, não? É Death and Life, do guitarrista, compositor, cantor e, neste caso pelo menos, produtor, Chico Suman.
Há também beleza. E há muitas coisas mais. Uma delas, rara e importantíssima: erudição. O blues de Chico vem sem fórceps, é resultado natural do amadurecimento e processamento de todas as texturas que ouve. Mesmo que não houvesse nenhum blues no formato tradicional no álbum (e já aviso que há o The Brothers Band com pegada Fleetwoodiana em sua melhor fase), existe mais do gênero mágico por segundo neste trabalho do que em muitos a ele dedicados integralmente. As vísceras da ‘americana’ são expostas com muita competência. Apesar de jovem, ele não embarcou na milionésima tentativa infrutífera de ser carbono de Stevie Ray Vaughan. Ouch! É bem mais do que isso.
A segunda música deste disco legal, Living Alone, pode enganar os incautos. Não, não é Dylan com You gonna Make Me Lonesome When You Go ou outra do bardo gênio, espere mais uns segundos e vem a voz e a letra do autor. Isso não significa atirar para todo o lado quando se sabe o que se faz. Outros poderiam quebrar a cara facilmente. Isso significa na verdade, neste caso, um tributo renhido e respeitoso às raízes do folk e aos mestres.
Chico Suman ilustra que a essência da coisa não assenta só sobre uma forma da qual se gosta. É mais amplo que isso. Não existe blues sem spiritual, não existe rock sem blues, não existe soul sem gospel, não existe jazz sem blues e/ou spiritual. E é preciso saber todas essas regras para poder transcender o simples carbono. O resultado de dezenas de bandas de rock (antigas e nem tanto) que existem e existiram por aí, é vazio, algo gélido, ‘soulless’ porque justamente se ressente da falta de erudição em sua formação básica.
Não é o caso de Chico. As suas influências são claras, percebe-se que, além de tocar , cantar bem e saber timbrar a guitarra, uma ES 335 (escolha madura e sempre acertada), ouviu muito e, importantíssimo, ouviu bem. Falando em voz, confira A Small Part Of You. Depois me conte. E falando em apanhado de influências e erudição, ouça Keep The Light On.
O disco poderia ter sido gravado na virada dos 1960s para os 1970s, tranquilamente, e faria bonito no auge do Flower Power. Jerry ‘Grateful Dead” Garcia, de quem Chico me lembra na sua foto mais oficial, aprovaria. Apesar disso, consegue ser jovial mesmo lançado em 2017, porque é feito hoje e por um jovem. E moderno é o que é feito hoje, seja revisitado ou não.
Nas palavras do próprio Chico: “As oito canções estão dispostas de maneira a serem interpretadas como um despertar para uma nova vida, e um adeus ao velho eu, com todas as luzes e sombras envolvidas no processo”. Processo que, segundo ele, engloba perda de emprego, de apartamento, de cachorros, de amores e outras agruras.
Além das plataformas digitais, o disco físico pode ser encontrado na Baratos Afins, na Big Papa Records (na Galeria Nova Barão) e em shows do Chico. Pegue o seu. Tem atmosfera vintage, não só pelos instrumentos utilizados aparentemente, algo na gravação remete também a ela. Intencional ou não? Tanto faz. É bom.
A turma que ajudou, com competência, a fazer este trabalho, espalhada pelas faixas:
– Luiz Bueno (Duofel, veteraníssimo), participação especial – Cítara (Electric Sitar);
– Rodrigo Hid, Leandro Lantin, Adriano Grineberg, Mateus Schanoski, Rafael Stanguini (só em A Small Part Of You) e Collins Freitas: teclados;
– Daniel Kid, Maurício Pilcsuk, Rafael Stanguini e Kleiton Sabaini no baixo;
– DJ Sgrufs no Scratch;
– Chico : Voz, guitarras, violões, gaita, letras, música e produção.
Eita! Abraço a todos!