Limitada pelos precários estúdios e com uso de instrumentos de segunda linha com qualidade duvidosa, a psicodelia brasileira abre as portas da percepção do rock brazuca desde a segunda metade da década de 1960. As distorcidas guitarras, sintetizadores afinados e letras lisérgicas enfrentaram toda sorte de preconceito para alargar os horizontes da música jovem tupiniquim, ainda enraizada nas arcaicas estruturas conservadoras.
Viveu os primeiros acordes limitadas a guetos de cabeludos e alienados, sem conquistar uma fração da legião de fãs que constitui nos dias atuais. Entretanto, as distorções típicas do subgênero abalariam o status-Quo das patriarcais bases nacionais com a Geleia Geral sugada da antropofágica liberação cultural, made Semana da Arte Moderna de 22.
Capitaneados pelo gênio (salve!) Rogério Duprat, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Os Mutantes miraram os nariz contra os chapadões para o Tropicalismo, movimento cultural que bebeu da fonte do psicodelismo. Sem o menor apelo comercial, a lisergia do rock limitou-se num minúsculo universo, mais sintonizado com o movimento hippie e a pouquíssimos e (hoje) e valiosos long-plays e compactos.
Na virada da década seguinte – com Caetano e Gil regressos à nata da MPB mais sofisticas (sic) – a psicodelia desdobrou-se no progressivo e afins, assumindo sonoridades regionais – tempero que faz do prog-brasileiro um dos mais admiráveis pelos fãs do gênero planetário.
Cemitério do samba, como cunhou o poeta Vinícius de Moraes, a cosmopolita e sessentista São Paulo hasteou de forma pioneira a bandeira do verão do amor californiano em solo tupiniquim. Bandas como The Beatniks, Os Baobás, The Galaxies e os santistas da Blow Up ajudaram a consolidar o gênero por aqui. Os argentinos do The Beat Boys, os cariocas d´Os Brazões e do Módulo 1000, os mineiros da A Tribo e os gaúchos Liverpool deixaram obras antológicas, que hoje são objeto de disputa no exterior.
Mas o capítulo espetacular do gênero seria escrito com cerca de 10 anos de atraso, com a invasão pernambucana. Lula Côrtes, Zé Ramalho, Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Marconi Notaro, Flaviola e o Bando do Sol e (os Stones do Sertão) Ave Sangria uniu o psicodelismo com as raízes nordestinas.
O brevíssimo histórico acima – que nem preencheria a orelha da história da primeira dentição do rock brasileiro – serve apenas para marcar o primeiro meio século de (sub)existência do psicodelismo sobre os trópicos. A cena de 50 anos atrás tem hoje infinitamente mais admiradores que na época. Prova disso é a novíssima coletânea tributo, com 14 bandas da nova geração cobrindo a mais selvagem, exótica e psicodélica música brasileira.
O apanhado de música foi organização pelo Miniestéreo da Contracultura, sob idealização do Psico BR Discos & Posters da Psicodelia Brasileira. A qualidade do som é de surpreender. Aperte o play e boa viagem…
https://soundcloud.com/user-169480007/sets/tributo-a-psicodelia