Crítica | A Baleia

Engenharia do Cinema Não é novidade que o cineasta Darren Aronofsky sempre pega um assunto, e o aborda da maneira mais psicológica o possível. Seja com o universo das drogas (“Requiém Para um Sonho“), bíblico (“Mãe“) e até mesmo Workholic (“Cisne Negro“). Em “A Baleia“, ele pula para o universo da obesidade (que vem sendo uma das principais causas de morte no mundo, nos últimos tempos). Sim, e provavelmente renderá o Oscar de atuação para Brendan Fraser (pelo qual será um dos momentos mais marcantes do Oscar 2023). Baseado na peça teatral de Samuel D. Hunter (que também cuidou do roteiro desta adaptação cinematográfica), a história é centrada no professor universitário Charlie (Fraser), que após o falecimento de seu namorado, passa a sofrer de obesidade mórbida e não deseja tratamento algum, já que ele está ciente do fato de estar prestes a falecer. Morando sozinho em um apartamento decadente e recebendo visitas constantes de sua enfermeira Liz (Hong Chau), ele tenta uma reaproximação de sua filha distante Ellie (Sadie Sink). Imagem: Califórnia Filmes (Divulgação) Realmente, esta é uma obra bastante difícil de ser ingerida, pois desde o primeiro arco Aronofsky já transpõe o quanto é complicado para um obeso ter prazeres simples. Com uma tela em aspecto de 1.33:1, o intuito do próprio é mostrar sutilmente o quão “gigante” é a presença de Charlie, em várias situações. Seja pelo fato dele sempre se comparar com a baleia Moby Dick (que deu origem ao título do filme) e sempre procurar ser bondoso com todos ao seu redor (como ele resolver alimentar um pássaro, mesmo tendo várias dificuldades de locomoção, ele se esforça para alegrar este). E as referências ao citado, não param por aí. Seja por intermédio da trilha sonora de Rob Simonsen (que usa notas com sintonia de passos de um gigante), o fato de sempre estar chovendo na maioria das cenas (uma vez que os protagonistas da obra citada, enfrentarem o mesmo diante de uma tempestade) e até mesmo um poema recitado pelo próprio que engloba aquele. Além do lado poético e literário na obra, Aronofsky deixa explicita de forma nua e crua como Charlie usava a comida como uma verdadeira fuga para seus problemas (uma vez que ele sempre come descontroladamente, apenas para saciar o vazio de seu ex-companheiro e sua própria filha). E isso é transposto perfeitamente por Fraser, que não transmite uma enorme sensação claustrofóbica, uma vez que não conseguimos sentir a liberdade daquele cenário mostrado. Realmente ele merece o Oscar, assim como o trabalho da equipe de maquiagem e penteado (que deformaram totalmente o mesmo). Mas não é apenas Fraser que dá um show de interpretação, uma vez que o roteiro cria oportunidades para todos os personagens presentes como as próprias Chau, Sink, Ty Simpkins (que interpreta o crente Thomas, e possui um arco ótimo sobre a relação da Bíblia com o quadro de Charlie) e Samantha Morton (a ex-esposa de Charlie, Mary). “A Baleia” realmente é um filme para poucos, mas que nos faz refletir sobre as pequenas coisas da vida e o quão devemos nos cuidar, mesmo por quem nos mais ama.
Crítica | Creed III

Engenharia do Cinema Depois do desligamento de Sylvester Stallone da franquia “Creed“, por conta de conflitos com o produtor Irwin Winkler (onde ele alega ter “estragado” o legado de Balboa, com ideias sem sentido), o protagonista dos dois primeiros, Michael B. Jordan acabou não só ficando nesta função, como agora foi colocado também como diretor de “Creed III“. Sendo sua estreia na direção, ele conseguiu facilmente estampar sua marca e criar vários malabarismos ótimos. Porém, ainda faltou aquela presença necessária do grande Rocky Balboa (que sequer é citado aqui). Após ter se aposentado dos ringues, Adonis Creed (Jordan) agora é um respeitado empresário de novos talentos do boxe, enquanto sua esposa Bianca (Tessa Thompson) agora continua tendo uma carreira consolidada no universo da música. Mas a paz do casal é afetada quando Damian Anderson (Jonathan Majors), um antigo amigo do passado de Adonis, reaparece e coloca em risco sua carreira ao tentar se estabelecer como um boxeador de sucesso também. Imagem: MGM/Warner Bros (Divulgação) O roteiro estabelecido por Keenan Coogler e Zach Baylin tenta traçar a vida de Adonis exatamente como foi visto em no quarto e quinto filmes da franquia original de Rocky (com ele vivendo em uma mansão estampada com suas conquistas e ao mesmo tempo levando uma vida simples). Isso tinha tudo para desandar, porém o carisma e direção de Jordan consegue acrescentar ainda mais na narrativa. E digo isso em dois tópicos totalmente distintos. O primeiro são as cenas de luta (que inclusive foram inspiradas em animes como “DragonBall“), pelos quais ele sabe que não é necessário fazer a câmera tremer várias vezes e até mesmo tentar fazer um sensacionalismo com a própria. Ele opta por tentar tratar a situação com um aspecto cartunesco, e remete demais aquela sensação de realmente estarmos dentro do estádio vendo a própria (algo que realmente a franquia original, sabia fazer com êxito). O segundo é no arco envolvendo a filha dos protagonistas, Amara Creed (Mila Davis-Kent) que é surda e muda. Quando a própria está em cena, o diálogo de todos à sua volta é falado totalmente em libras (algo raramente visto na indústria). Parece algo simples, mas o cuidado com Jordan neste arco, transpõe o carinho que Stallone tinha em algumas abordagens nos outros filmes. Mesmo com o citado arrasando na frente e atrás das câmeras, foi uma escolha sábia ele ter colocado como seu antagonista o próprio Jonathan Mayors (que está lentamente ganhando destaque como o grande vilão do novo arco da Marvel). Com um olhar totalmente sádico e ao mesmo tempo amigável, à todo momento colocamos em cheque suas verdadeiras intenções (que costumam ser as piores, dentro do contexto). “Creed III” consegue entreter e divertir por conta do excelente trabalho de Michael B. Jordan, porém, não consegue suprir a ausência de Sylvester Stallone.
Crítica | Triângulo da Tristeza

Engenharia do Cinema Sempre ao ouvir o nome do cineasta Ruben Östlund, certamente os mais cinéfilos ficam atentos de imediato. O diretor sueco não só conseguiu ganhar duas vezes a Palma de Ouro em Cannes (com “The Square: A Arte da Discórdia” e este “Triângulo da Tristeza“), e o prêmio do Júri com “Força Maior“. Um feito totalmente difícil de se fazer, se tratando do Festival de Cannes. Pegando um pouco da essência do primeiro, ele aposta novamente em satirizar o quão ridículo se torna o ser humano, à medida que mais dinheiro e poder estão em suas mãos. A história é centrada no casal de modelos Yaya (Charlbi Dean) e Carl (Harris Dickinson), que mesmo vivendo uma crise no relacionamento, resolvem se aventurar em um cruzeiro dado por um patrocinador da primeira. Porém, eles não imaginariam o quão louca seria essa experiência para ambos. Imagem: Diamond Films (Divulgação) Em seu primeiro capítulo, Östlund procura preparar o terreno não só para a mensagem que ele está disposto a exercer ao seu público, como também nos faz criar uma sutil (onde muitas situações são jogadas para refletirmos) proximidade com o casal protagonista (mostrando que por mais que eles sejam famosos e da classe alta, possuem problemas comuns de quaisquer pessoas). Quando o segundo ato entra em cena, o sueco faz uma grande homenagem ao clássico “Apertem os Cintos, Que O Piloto Sumiu!“, pois ele coloca os mais caricatos personagens em um cenário totalmente inusitado e sempre fazendo idealizar indiretamente que aquilo era uma merda (seja por intermédio de uma mosca sendo enfatizada em uma simples cena, o empresário Dimitry (vivido por Zlatko Buric) ser especialista em vender tal especiaria citada). Não hesito em dizer, que a presença do ator Woody Harrrelson funcione como um verdadeiro “sinal verde”, pois além dele estar ótimo no papel do Capitão da Embarcação, o timing cômico dele é brilhante (sendo responsável pelas melhores piadas do filme, principalmente a discussão sadia com Dimitry). “Triângulo da Tristeza” não só consegue resgatar o estilo da comédia pastelão, como também mostra que ainda é possível ainda realizar filmes deste gênero e nos fazer refletir no final de sua exibição.
Crítica | Till Em Busca de Justiça

Engenharia do Cinema Quando foram anunciados os indicados ao Oscar 2023, muitos se questionaram sobre a ausência de “Till Em Busca de Justiça“, em várias categorias (inclusive para Danielle Deadwyler, em melhor atriz). Em meio a um cenário bastante delicado que o racismo vem enfrentando nos EUA (que já foi bastante superado, em relação ao que era antes), não hesito em dizer para fazer estes tipos de longa você tem de ter um exímio cuidado, uma vez que você está vendendo um assunto delicado ao grande público. Após Emmet Till (Jalyn Hall) ser assassinado brutalmente em 1955, no Mississipi, sua mãe Mammie (Deadwyler) começa uma incansável busca por justiça para prender os culpados e divulgar ao mundo o nível fatídico que racismo que estava obtendo nos EUA. Imagem: Universal Pictures (Divulgação) Estamos falando de uma das histórias mais polêmicas e perturbadoras, se tratando do tópico de como o racismo era tão abrupto. Porém, a diretora Chinonye Chukwu (que também cuida do roteiro com Michael Reilly e Keith Beauchamp) parece ser totalmente amadora ao tentar transformar o arco de Mammie, em uma verdadeira novela, regada a músicas cafonas e frases de efeito totalmente clichês. Vamos pegar como exemplo o arco quando aquela pessoa vai olhar o corpo do filho no necrotério (que está totalmente desfigurado), que por si só já é uma cena pesada e triste. Não havia necessidade de colocar alguns diálogos quando ela recebe próprio na estação, muito menos a trilha sonora horrível de Abel Korzeniowski (que parece ter se inspirado nos famosos tecladinhos de churrascaria e orquestras de eventos da alta sociedade). Este erro acaba sendo gravíssimo, pois acaba cessando demais aquela emoção que a própria cena deveria transpor. Quanto a atuação de Deadwyler, realmente ela entrou de cabeça no papel e seu olhar já consegue vender quaisquer um de seus sentimentos (inclusive o destaque vai para a cena do depoimento no tribunal, que é a melhor do longa). Seguindo por participações breves, mas ótimas de Whoopi Goldberg (que também é uma das produtoras do filme, e interpreta a mãe de Mammie), Haley Bennett (Carolyn Bryant) e John Douglas Thompson (Moses Wright). “Till Em Busca de Justiça” termina sendo um filme que poderia ser melhor executado, para transpor um tema bastante delicado. Mas que possivelmente irá cair no esquecimento nos próximos anos.
Crítica | Até os Ossos

Engenharia do Cinema Depois do sucesso de “Me Chame Pelo Seu Nome“, era inevitável que o diretor Luca Guadagnino e o ator Timothée Chalamet iriam repetir a parceria em um futuro próximo. Sendo lançado no Brasil timidamente, na semana da CCXP, e ficado apenas uma semana em cartaz na maioria dos cinemas (uma vez que o circuito foi dominado por “Avatar 2“, logo em seguida), “Até os Ossos” chegou agora nos serviços on-demand e provavelmente vai começar a ser notado pelo grande público. Baseado no livro de Camille DeAngelis, a história é centrada em Marren (Taylor Russell) que vive como nômade com seu Pai (André Holland), pelo fato dela esconder seus desejos canibais. Porém, após um descuido da mesma, este acaba lhe deixando sozinha e ela começa a viver totalmente sozinha. É quando ela conhece Lee (Chalamet), por quem ela se apaixona e possui os mesmos hábitos canibais. Imagem: Warner Bros Pictures (Divulgação) É um fato que Guadagnino sabe como criar uma atmosfera desconfortável em seus filmes, quando a premissa tem este tópico como foco (vide o remake de “Suspíria”, feito pelo próprio em 2018). Aqui ele não hesita em mostrar cenas de canibalismo explícito (que chegam a beirar o perturbador), e situações que acabam transpondo o quão isso é algo totalmente desconfortante (vide uma cena onde ele intercala uma senhora sendo devorada, com suas fotos em família). E para auxiliar nisso, o design de produção, figurino e até mesmo a fotografia de Arseni Khachaturan sempre transparecem uma tonalidade acinzentada, com aspecto sujo e nojento em quaisquer cenários por onde os personagens passam (com o intuito de representar o quão eles vivem em uma sujeira total). Embora Russell e Chalamet estejam ótimos em cena, embora o segundo mais uma vez esteja preso na persona de adolescente rebelde, quem rouba o protagonismos destes é o veterano Mark Rylance (que interpreta o misterioso Sully). Mesmo aparecendo relativamente pouco, sua característica é uma verdadeira mescla dos citados, mas ainda sim transparece uma incerteza de suas verdadeiras intenções. “Até os Ossos” pode facilmente conquistar os fãs de filmes trash de horror, mas causará um desconforto enorme nos que esperam encontrar um romance clichê e gostosinho de se ver.
Crítica | Esquadrão Secreto

Engenharia do Cinema Previsto para ser lançado originalmente nos cinemas, “Esquadrão Secreto” foi jogado direto no streaming da Paramount+ e sendo tratado como um dos carros chefes do mesmo, se tratando de produções “originais” e ter como protagonista o ator Owen Wilson (“Case Comigo“). Porém, isso não seria um problema se ele se tornasse um mero coadjuvante no próprio e só está no pôster para chamar o público para conferir o mesmo (algo bastante comum na indústria). Ao terminar de conferir o mesmo, digo apenas que o estúdio tomou uma sábia decisão. A história mostra o pacato e simples Jack (Wilson), que após ter contato com uma energia extraterrestre obtém poderes de um verdadeiro super-herói. A medida que ele vai conseguindo ganhar a vida com suas novas habilidades, ele fica mais distante de seu filho Charlie (Walker Scobell), que acaba descobrindo o segredo de seu Pai e colocando todo o trabalho do próprio em risco. Imagem: Paramount Pictures (Divulgação) O roteiro de Christopher L. Yost, Josh Koenigsberg, Henry Joost e Ariel Schulman (estes dois últimos também assumem a direção), parece ser tirado de uma mistura entre os filmes das franquias da Marvel com “Pequenos Espiões“. Ao contrário dos citados, a fórmula não acaba funcionando aqui, pois simplesmente somos apresentados a várias situações óbvias, imbecis e que até nos afastam em ter interesse ao acompanhar a trajetória de Charlie (sim, o filme é centrado no filho do protagonista e seus amigos). Quando chega na hora de apresentar o grupo de vilões, é uma dos momentos mais vergonhosas do mesmo, uma vez que nitidamente o ator Michael Peña (“Homem-Formiga”) está forçado (e ele não esconde isso em seu trabalho) e sem o mínimo interesse em apresentar algo plausível. E inclusive há algumas piadas suas, porcamente tiradas de outras sátiras sucedidas do gênero de super-heróis. Isso porque não entrei no mérito dos efeitos visuais, que provavelmente até cenas simples em uma residência, parecem terem necessitado de auxilio do recurso (de tão preguiçoso e relaxada que estava a equipe de design de produção). Se fosse um filme da Marvel, pelo menos ficaríamos tranquilos, pois haveria algum patch de atualização, em algum momento (e ainda seria cotado para receber alguma indicação ao Oscar, na categoria citada). “Esquadrão Secreto” realmente consegue se consagrar como uma das maiores bombas no catálogo da Paramount+.
Crítica | Os Banshees de Inisherin

Engenharia do Cinema Mesmo tendo vencido o prêmio de Melhor Comédia no Globo de Ouro deste ano, Os Banshees de Inisherin é mais um caso de filme dramático forte, que vence esta categoria da premiação (quem não lembra quando Perdido em Marte, levou o mesmo e até Ridley Scott falou ao receber a estatueta que “meu filme não é uma comédia”). Conflitos a parte, estamos falando de mais um projeto inusitado e completamente maluco de Martin McDonagh (Três Anúncios Para Um Crime), que já ficou conhecido não só por sempre trabalhar com Colin Farrell (esta é a terceira parceria de ambos), como também apresentar esquetes e situação totalmente surreais em suas produções (e isso vai lhe render seu segundo Oscar, mas como roteiro original). A história se passa em 1923, em um pequeno vilarejo na Irlanda, em plena época da Guerra Civil (tanto que os cidadãos desta, viam a mesma acontecer à distância). Nela vive o pacato Pádraic Súilleabháin (Farrell), que após seu amigo de longa data Colm Doherty (Brendan Gleeson) não quer mais falar com ele, opta por soluções inusitadas para reconquistar o mesmo. Imagem: Searchlight Pictures (Divulgação) Não diria que este é um bromance (gênero conhecido por focar na amizade entre dois homens), e sim um forte drama sobre o comportamento humano. De forma bastante sutil, McDonagh está ciente das possibilidades que poderiam ser desenvolvidas com aquela região com seus protagonistas, tanto que conseguiu traçar um perfil ideal para grande maioria (não é à toa que Farrell, Gleason, Kerry Condon e Barry Keoghan foram indicados ao Oscar de atuação, e coincidentemente são Irlandeses), não fazendo nenhum personagem ser desperdiçado (inclusive os animais como o cão de Colm e o jumentinho de Pádraic). Mesmo se tratando de um quarteto bastante operante, o mérito em grande parte vai para Keoghan (que se não estivesse dividindo a categoria com Gleason, já teria levado este Oscar), que vive o adolescente autista Dominic Kearney. Encarregado de ser o responsável por grande parte das piadas de humor negro, o mesmo acaba roubando a cena, até em situações onde ele literalmente não estava sendo “convidado”. Enquanto isso, Farrell realmente tem um dos seus melhores personagens na carreira, pois ele transpõe todo medo, insegurança, insistência e chatice de Pádraic (lembrando brevemente até Jim Carrey em “O Pentelho”, mas em uma atuação melhorada). Outro grande destaque é a edição de Mikkel E.G. Nielsen (que foi indicado ao Oscar por este trabalho, inclusive), que soube realizar um trabalho impecável, onde nos momentos de impacto, conseguimos nos questionar os motivos e consequências, mas ainda sim, nos pegando se perguntando “qual será o desfecho disso tudo?”. Nascido para ganhar Oscars, Os Banshees de Inisherin é uma produção que consegue cativar por sua premissa simples, mas muito bem explorada.
Crítica | O Pior Vizinho do Mundo

Engenharia do Cinema Chega a ser irônico ver o veterano Tom Hanks, interpretando o protagonista de um filme chamado “O Pior Vizinho do Mundo” (uma vez que o próprio é conhecido por ser um dos astros mais simpáticos de Hollywood). Mas como estamos falando da profissão do mesmo, que é um ator, ele realmente mostra seu talento ao estrelar este remake do longa sueco Um Homem Chamado Ove (que foi indicado ao Oscar de filme estrangeiro, em 2015), que é inspirado no sucedido livro de Fredrik Backman. Apesar de se tratar de uma produção que remete ao estilo dramático que é exibido em exaustão na “Sessão da Tarde”, certamente é uma obra que fará muitos de nós refletirmos. Hanks interpreta Otto, um senhor viúvo e ranzinza que sempre trata as pessoas ao seu redor com uma grande frieza e ofensas. Até que uma família nova se muda para frente de sua residência, o que acaba fazendo com que ele repense mais sobre suas atitudes e sua vida. Imagem: Sony Pictures (Divulgação) Desde seu prólogo somos colocados em diversas situações diárias, que apresentam o comportamento temperamental de Otto. Embora seja um recurso clichê (uma vez que a própria narrativa acabava jogando isso no decorrer da trama), acaba sendo interessante por conta do carisma de Hanks (a sequência inicial, envolvendo a discussão do pedaço de corda, é ótima), que curiosamente divide o papel do mesmo com seu próprio filho Truman Hanks (uma vez que a história vai e volta no passado). Embora estarmos falando de uma comédia dramática, o diretor Marc Forster (Guerra Mundial Z) opta por situações atreladas ao humor negro, para criarmos uma determinada afinidade com o enredo (que realmente funciona, e tira boas risadas). Agora, quando ele parte para o quesito dramático é impossível ficar sem se emocionar, pelo simples fato dele não ter apelado ao fator novelesco ou gritante do arco. Tudo mostrado era realmente plausível e verídico (inclusive, muitos podem se identificar com o contexto). O Pior Vizinho do Mundo consegue se tornar uma verdadeira obra reflexiva, onde em meio a tantos caos e confusões, não paramos para pensar na importância das pequenas coisas.
Crítica | Babilônia

Engenharia do Cinema Desde seu anúncio em meados de 2020, esperava-se que “Babilônia” fosse um novo “Era Uma Vez Em… Hollywood“, uma vez que ele mostraria a capital do cinema em sua formação, em meados de 1925. Com direção e roteiro de Damien Chazelle (“La, La, Land“), estamos falando de um projeto que realmente não pega na sua mão para explicar detalhes e bastidores, mas sim utiliza três histórias paralelas (onde alguns arcos funcionam como esquetes), para apresentar o quão foi complicada a transição do cinema mudo para o falado. A história de Babilônia mostra Nellie LaRoy (Margot Robbie) e Manuel Torres (Diego Calva), que após participarem de uma festa regada a drogas, sexo e outras coisas, em Hollywood, acabam sendo literalmente jogados dentro da indústria cinematográfica (a primeira como atriz e o segundo como produtor e executivo). Ao mesmo tempo, vemos o quão era complicado fazer cinema na visão do então respeitado ator Jack Conrad (Brad Pitt), que cada vez mais sofre com a transição para o o cinema falado. Imagem: Paramount Pictures (Divulgação) Já começo deixando claro que estamos falando de uma história totalmente inspirada nas produções exercidas pelo cinema em meados dos anos 30/40 (onde o romantismo dominava as telonas), e isso pode causar um tremendo desconforto naqueles que desconhecem como o mesmo era antigamente. Seja por intermédio também da trilha sonora regada a jazz e orquestras (cujo trabalho de Justin Hurwitz, provavelmente vai levar o Oscar), ou a fotografia amarelada e com aparência de ter sido rodada em uma câmera Panavision (que possivelmente vai dar para Linus Sandgren, uma indicação ao Oscar). Chazelle realmente conseguiu captar também como funcionavam os bastidores naquela época, por intermédio de diretores que eram verdadeiros malucos (vide o arco da gravação de uma cena de batalha, cujo diretor parecia um verdadeiro general, mesmo andando bastante desleixado), principalmente quando começaram a gravar as primeiras cenas faladas (pelas quais não haviam dublagem na pós-produção ainda, e precisava ter um silencio absoluto no set), condições totalmente precárias nos sets (uma vez que eles eram filmados em desertos, e as vezes resultaram em óbitos) e os conflitos de vários atores devido seus comportamentos antiéticos e tiques vocais (que eram inaceitáveis, uma vez que muitos espectadores não aceitavam ouvir as vozes dos atores). E no quesito de atuações em Babilônia, Robbie realmente se encaixou perfeitamente nesse papel, embora ela esteja mais uma vez presa ao rótulo de Arlequina, ou seja, outra mulher maluquinha (e infelizmente a própria indústria está deixando ela presa nesta zona de conforto). Enquanto Pitt parece estar totalmente em um papel pensado para ele (que lhe renderá mais uma indicação ao Oscar), e se encaixou perfeitamente uma vez que ele possui um perfil de astro daquela época também. O mesmo pode ser dito do mexicano Calva, que realmente convenceu em sua estreia em Hollywood (e realmente possui a postura de um “faz tudo”, da industria). Vale enfatizar algumas menções honrosas para nomes como Tobey Maguire (James McKay), Eric Roberts (Robert Roy), Samara Weaving (Constance Moore), que aparecem relativamente pouco, mas conseguem ter momentos divertidos e que roubam a cena. Só que infelizmente ele falha ao tentar retratar o trabalho do músico negro Sidney Palmer (Jovan Adepo), cuja pauta racial e suas várias dificuldades na indústria são praticamente deixadas totalmente de lado, em sua maioria (e acabou se resumindo apenas em uma cena totalmente banal, dentro do contexto do filme). E não foi só neste tópico que o roteiro acabou pecando ao tentar colocar questões atuais (até mesmo linguajar), em um cenário onde isso realmente não estava acontecendo. Não havia discussões sobre “toxicidade masculina” e principalmente “abusos sexuais” (uma vez que as festas de Hollywood eram regadas a todo tipo de coisas, com atos vulgares sendo cometidos por homens e mulheres). E isso acaba empacando ainda mais para a metragem chegar em 190 minutos (quando poderiam facilmente ter reduzido para 150). “Babilônia” termina sendo um interessante recorte de como o cinema passou por vários problemas em seu início, e como era possível Hollywood passar de lugar dos sonhos, para um grande pesadelo.