Fotos: Isabela Carrari
Em 2016, retornei para uma terceira jornada pela Escandinávia, uma das minhas regiões favoritas. Visitei Noruega, Suécia e Finlândia antes de investir em um roteiro inédito para mim: os países bálticos. Estônia, Letônia e Lituânia desfrutam de uma jovem independência. São 101 anos da primeira experiência livre do Império Russo, mas apenas 27 anos da restauração dos seus direitos após o colapso da antiga União Soviética.
O início do texto pode até soar como resumo de aula de história, mas isso possui uma relação importante com o tema central, a música, acredite!
Quem já leu sobre a União Soviética, imagina o quanto a cultura ocidental enfrentava muitas barreiras para chegar ao público local. De fato, era uma missão quase impossível. Discos até surgiam por lá, fossem piratas ou com modificações nas capas, nomes das músicas e por aí vai.
Quando desembarquei em Talin, capital da Estônia, vindo de uma travessia via cruzeiro/ferry de Helsinque (Finlândia), notei alguns efeitos da influência ocidental. O apartamento que aluguei no Airbnb ficava entre o Madonna Club e o Scotland Yard’s Pub. O primeiro é um clube descrito como entretenimento adulto, o segundo um pub capaz de deixar qualquer um se sentindo em casa. Foi difícil trocar esse lugar por qualquer outro bar. Mas a experiência estava apenas começando.
E foi na Old Town que me deparei com as melhores experiências musicais. A começar pelas lojas de discos, três em um quarteirão, cada uma com suas relíquias. Em uma delas encontrei o clássico Sticky Fingers (1971), do Rolling Stones, com sua capa diferenciada. Lançado em 1992, na Rússia, a imagem apresentada é semelhante a original, a fotografia de uma calça jeans, mas aparentemente feminina com uma foice e um martelo gravados na fivela do cinto. Paguei a bagatela equivalente a 10 euros.
Há muitos bares no centro histórico de Talin, que ocupam as praças medievais e ruas de paralelepípedos. Bem próximo da prefeitura está o estabelecimento mais surpreendente de todos: DM Baar, completamente temático do Depeche Mode. Das paredes ao som, do cardápio aos vídeos.
A surpresa com o tema do bar não é nenhum demérito com a banda. Mas certamente nunca iria imaginar um espaço tão especial para Dave Gahan e companhia. Já conheci bar dos Stones em Toronto, museu do Ramones em Berlim, mas um bar do Depeche em Talin, certamente, foi uma baita surpresa positiva. A resposta, no entanto, está na ponta da língua do cofundador do DM Baar, Dan Buinenko (foto abaixo).
“Nós amamos o Depeche Mode. Eles têm uma relação muito valiosa com os fãs da Estônia. Eles fizeram um dos primeiros shows de banda estrangeira aqui, após voltarmos a ter nossa independência”, comentou o proprietário, fazendo referência ao concerto de 2 de setembro de 1998, na cidade de Tartu, o primeiro da turnê The Singles Tour.
Ainda não fui para a Rússia, mas ouvi dizer que existem propostas de bares semelhantes em Moscou e São Petesburgo. E pelo mesmo motivo. Antes mesmo da Estônia, o Depeche conseguiu tocar na Rússia, Hungria e outros países que enfrentavam o bloqueio cultural, no fim dos anos 1980.
Inaugurado em 1999, o DM Baar conta até com um merchan próprio alusivo à banda. Tem camisetas, canecas, imãs, entre outros itens. E a discotecagem não vai decepcionar ninguém. A discografia completa do Depeche é tocada no repeat enquanto a casa está aberta. Nas tevês, mais coisas: shows e videoclipes se revezam.
Se a temática do DM nos surpreende, Buinenko também se diz surpreso com as revelações dos fãs. “Muitos dizem que vêm para Talin apenas para conhecer o nosso bar”.
O proprietário do bar revela ter assistido a banda umas oito vezes ao vivo, mas nada se compara aos encontros que teve com os integrantes. Em 2001, Martin L Gore, Andy Fletcher e Christian Eigner passaram a noite no DM Baar, antes do show do Depeche em Talin. Em 2006, eles retornaram. O maior parceiro da banda, o cineasta e fotógrafo Anton Corbijn também deu as caras por lá com Fletcher. E todas essas lembranças estão devidamente registradas, com fotos, autógrafos e alguns presentes deixados pelos músicos.
Mais do que uma grande homenagem ao Depeche Mode, o bar tem um anfitrião que gosta de uma boa conversa sobre música. Buinenko, que sempre trabalhou em bares como garçom, adora saber como o seu público descobriu o bar, de onde vem, o que está fazendo na cidade e por aí vai.
O DM Baar fica na Voorimehe 4, no coração do Centro Histórico de Talin. O bar funciona de terça a sexta, das 18h à 0h, sábado das 14h às 3h, domingo das 18h às 2h. Segunda não abre. Não é cobrada entrada e você paga somente o que consome.