Poesia e Rock # 8 – A poesia de Jeff Buckley

Poesia e Rock # 8 – A poesia de Jeff Buckley

FLÁVIO VIEGAS AMOREIRA

“… Agora eu sei, Costia, agora eu compreendo que o essencial em nossa profissão – tanto faz seja no palco ou na literatura – o essencial não é a glória, nem a fama, nem nada daquilo com que eu sonhava, e sim saber aguentar com paciência… saber carregar a cruz e ter fé. Eu tenho fé, e já não sofro tanto; e quando penso em minha vocação, não tenho medo da vida.

Uso esse trecho de A gaivota, de Tchekhóv, para celebrar o rock assim como a literatura como entrega, sacrifício, conhecimento radical, salvação, poder, abandono. Essa a trajetória de Jeff Buckley que faria 50 anos, como protótipo desse símbolo sacrificial, de ofício sagrado mesmo do artista em ascese e catarse nos palcos do mundo. O rock como poesia, encenação, arquitetura vivencial, musicalidade eloquente, plasticidade por sobre a mimetização mais ou menos aproximada do real, do simbólico e do imaginário.

“O palco não é apenas o ponto de encontro de todas as artes, é também o retorno da arte ‘a vida”,  diz nos Oscar Wilde. O rosto angelical cantando em tributo ao pai Tim Buckley em I Never Asked to be Your Mountain é dessas peças musicais que não nos saem da cabeça e do coração …. Jeff que tinha sensibilidade por demais aguçada e cultura musical ao ponto de interpretar ícones como Nina Simone em If You Knew e Hallelujah, de Leonard Cohen que a pouco nos deixou….. Jeff, que amo ao lado de Jim Morrinson e Nick Drake, do mesmo modo que cultuo Baudelaire, Verlaine e Rimbaud: Santissima Trindade do rock e de sua irmã siamesa a poesia.

Jeff que cantava solo a meia luz num pequenino café esfumaçado de New York o “SinÉ” ou se apresentava no “Olympia” de Paris entoando Je n´en Connais pas La Fin, de Edith Piaf, sempre meigo, doce, lindo e intimista quietinho feito um James Dean no rock….

Jeff que escrevia poemas e queria ser ator e afogou-se num rio de nome Wolf, braço do americaníssimo Mississipi: Jeff era ele mesmo um poema para a eternidade…..Buckley cantando Grace é um hino a essa nossa temática: encontro de todas as artes envolvidas nesse mega conceito cósmico chamado poesia. Ter fé e não ter medo da vida: criar no palco e nos livros: esse o caminho da canção e da letra.