MÁRIO JORGE
Uma discussão um tanto perigosa, porque divisionista, mas salutar sob o ponto de vista das ideias. Um texto publicado no site Wiki Metal começa com o sugestivo título: “É tão errado ser roqueiro e ser de direita?” Nele, o autor toma como base a rebeldia musical estimulada pelo rock em meio às contradições ideológicas entre práticas e modos de um ou de outro regime político, de direita ou de esquerda.
Enumera pontos coincidentes do heavy metal com o pensamento conservador, embora faça ressalvas sobre os conflitos. Claro, uma enxurrada de comentários se seguiu ao artigo, com muito mais gente defendendo os pontos de vista do autor do que atacando. Sempre se disse que o heavy metal é preconceituoso e machista. Depende de quem escuta e como o alinha ao seu pensamento.
Vejo o rock, de maneira geral, muito mais como um fator de diversão, até mesmo um estilo de vida. Isso não o exime de manifestar-se politicamente. Woodstock, em 1969, foi um grande concerto com notáveis fins políticos: a guerra do Vietnã e a intromissão americana no conflito. Não só pela barbárie que a intervenção armada produziu na população vietnamita como também nos milhares de jovens que saíram de seu país para uma luta cujo objetivo era o de demarcar terreno na geopolítica global. O grito, que exacerbou a contracultura, era também uma ofensiva à Guerra Fria, traduzida pelos enfrentamentos verbais e ameaças veladas entre os polos defendidos pelos EUA e pela extinta União Soviética.
Woodstock
https://www.youtube.com/watch?v=F03a-EYvifU
Tem ainda o caráter humanista que acordes poderosos podem representar. O festival em solidariedade pelo povo do Kampuchea foi um deles. Depois de anos de sofrimento na década de 1970, imposto pela radicalização ideológica do Kmer Vermelho no Kampuchea Democrático (Cambodja), a população se viu destroçada por fome, doenças e miséria. O concerto no Hammersmith Odeon, em Londres, em 1979, reuniu pesos pesados para dar sua contribuição, arrecadando fundos para enviá-los ao país. Entre outros, estavam lá o Queen, The Who, Paul McCartney e Robert Plant (Zeppelin) participando com o Rockpile.
Concerts for the People of Kampuchea
https://www.youtube.com/watch?v=yH9ZVZH6VXo
Rock é protesto. E o metal é seu grito mais forte contra injustiças quando se fazem presentes. Que tenha um ou outro de direita e esquerda, o bom do som pesado é sua característica de unicidade. Ninguém vai a um concerto para brigar por fulano do partido tal contra sicrano, de agremiação oponente. Porém, é justificável se rebelar, por meio da música, contra um poder ditatorial, descasos, conflitos e barbáries contra a humanidade.
One, do Metallica, faz a metáfora de quem saiu de uma guerra e vive o pesadelo pós-campo de batalha. Run To The Hills, do Iron Maiden, critica o massacre de índios na América do Norte pelo homem branco. Fortunate Son, do Creedence, rechaça a convocação dos jovens para a guerra sem um ideal. War Pigs, do Sabbath, fala: Generais reunindo massas, assim como as bruxas em missas negras, mentes diabólicas que tramam a destruição. Vai, vendo.
Não vou estranhar quem seja de direita ou esquerda num show de heavy metal. Ali, estão quem quer momentos de diversão, ouvir a banda e respeitar as individualidades, gênero ou raça (humana, né!) de cada um. Rock é pra pular, extravasar, deixar correr solta a energia. Ah, se roqueiros como Nicko Mcbrain (Maiden), James Hatfield (Metallica) e Dave Mustaine (Megadeth) têm suas preferências políticas, qual o problema? É um direito deles. Segui-los nestes conceitos já é outra história.
Sobe no palco e toca, vai!