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Nerdice, rock and roll e cutucadas em Skylab: O reencontro do Autoramas com Santos

ANDRÉ AZENHA
Fotos: Paula Azenha

“13 anos que a gente não toca em Santos. Que saudade de vocês!”. Com essas palavras o vocalista e guitarrista Gabriel Thomas abriu o show da banda Autoramas. Também fazia quase 13 anos que eu não cobria um show de rock. Ir ao Sesc foi como voltar no tempo. Relembrar o período de jornalismo musical, antes de me “oficializar” como alguém do cinema, se é que posso ser chamado assim.

Tempos de shows quase ininterruptos em Santos. De Caverna do Rock, Studio G, Festa Popscene e do próprio Sesc, onde vi Bidê ou Balde, Los Pirata, Los Hermanos (bem no começo de carreira), Forgotten Boys, Ultramen, Zefirina Bomba, Wonkavision, Black Rio e muito mais. Sempre às quintas. Quando o espaço onde hoje é chamado Comedoria, era batizado de Bar do Sesc.

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Época em que escrevia para os sites Scream & Yell, de São Paulo, para o qual entrevistei o Autoramas e cobri aquela apresentação de 13 anos atrás, Rock Press, Dynamite.

O bom público não chegou a lotar o espaço. Mas era a gente certa para a apresentação certa. Todos na faixa entre 30 e poucos e 40 e poucos anos. Interessante notar as transformações que vão além das rugas. No meio dos anos 2000 juntávamos cada centavo para conseguir ver um show de rock.

Muitas vezes, pedíamos o credenciamento de imprensa – e assim economizávamos no ingresso – e a pouca grana que conseguíamos era para garantir um cervejinha. Transporte, nem pensar. Íamos a pé, mesmo. Passado esse tempo, alguns dos “durangos” viraram pais e mães, empreendedores, e agora apreciam vinho em taça.

A energia era a mesma. Com dez minutos de atraso o quarteto formado, além de Gabriel, por Érika Martins (percussão), Jairo Fajer (baixista) e Fábio Lima (bateria) chegou chegando. Como o bom vinho, melhoraram com o tempo. Gabriel e Erica, companheiros de música e vida, parecem cantar melhor.
Seria injusto comparar a formação atual com aquela de 2005: Gabriel, Selma Vieira (baixo e backing vocal) e Bacalhau (bateria). São fases diferentes. Hoje o grupo está escudado pelo amadurecimento e os percalços superados.

Ex-vocalista da banda Penélope, Érika seguiu carreira solo e pode ser mais conhecida por alguns pela participação na música A Mais Pedida, sucesso dos Raimundos. A cantora, musa do rock independente brasileiro dos anos 2000, surgiu de quimono. Carisma puro, energia total. Ambos soam conservados em formol. Talvez por não se entregarem aos modismos e fazerem aquilo que amam, mesmo ante todas as dificuldades que é manter uma banda de rock no Brasil. Ainda mais ultimamente.

O set list foi inaugurado com Quando a Polícia Chegar. Não houve tempo para respiro. Na sequência vieram Stressed Out e Abstrai. Essa mostra o entrosamento dos vocais masculino e feminino. Ao melhor estilo The Mamas and The Papas, Lady Antebellum, The Pretty Reckless, A Banda Mais Bonita da Cidade, entre outros. Quando parcerias assim acontecem e, no caso do Autoramas, com boas doses de garra e decibéis, fica praticamente impossível resistir.

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Em seguida Gabriel anunciou o novo álbum, Libido, previsto para julho. E emendou a pesada Creepy Eco. Em Dingo Dong, Érika soltou gritos agudos ensandecidos. Couldn’t Care At All é outra paulada. Sofas, Armchairs and Chairs é mais uma em inglês, idioma que soa natural nas melodias grudentas do grupo.

Seguiram com o hit Você Sabe, Paciência e Gabriel recordou a primeira vez com o grupo em Santos. “Foi numa festa da 95 FM”, diz referindo-se à antiga emissora de rádio. Érika brincou e disse que, para ela, é a primeira vez na cidade. Nem com a Penélope ou na carreira solo ela cantou aqui. E o companheiro rebateu: “Tem coisas que só o Autoramas proporciona pra você, garota”. Clima caseiro no show. Os demais integrantes recordam as vezes que tocaram no município.

1, 2, 3, 4, do Little Quail and Mad Birds, antiga banda de Gabriel, também foi lembrada como uma recordação: “O Little Quail tocou uma única vez em Santos, foi numa festa da 95 FM”. Nessa hora Gabriel foi servido com vinho por um dos fãs. E a interação entre artistas e plateia só aumentou. Os vocalistas pediram para o público chegar mais perto. “Nós tomamos banho”, disse ela.

Vieram Eu Sei + Eu Não Sei, No Futuro e, em Broto Aprendeu Karatê a noite já estava ganha. Erica imitou o Golpe da Águia, imortalizado por Ralph Macchio e Pat Morita, respectivamente Daniel LaRusso e Mr. Miyagi em Karatê Kid (1984). E, melhor, a cantora citou a recente série Cobra Kai, que dá continuidade à saga dos anos 1980. Rock e nerdice juntos. Tem como não amar?

Logo depois, foram as vezes de Jet To The Jungle, Jogos Olímpicos, quando os músicos desceram do palco (que nem é alto, um degrau apenas) e dançaram com as pessoas, e Catchy Chorus, terminando a primeira parte da apresentação. Gabriel agradeceu e disse ter sorte de fazer show quase todos os dias.

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“Diferente de outros, que só reclamam”, disparou, em uma clara referência ao bate-boca que travou com Rogério Skylab, na noite anterior, no Twitter. Inclusive em outro momento do show, Gabriel gritou: “Xinga muito no Twitter”, arrancando risos de quem estava por dentro da “briga”.

Houve tempo para o colega cartunista e colunista do Blog n’ Roll, Alex Ponciano, entregar as caricaturas que fez do Autoramas num caderninho. Tocaram O Homem Clichê e o hit I Saw You Saying, famosa ao ser gravada pelos Raimundos. “Pouca gente sabe que eu a compus”, disse Gabriel, autor da canção em parceria com Rodolfo Abrantes. Para coroar a noite, Mundo Moderno e a música que alavancou a banda no início de carreira, Fale Mal de Mim.

Particularmente senti falta de 300km/h e Carinha Triste. Nada que tenha estragado a experiência e a felicidade em ouvir rock. Rock que mescla punk, Jovem Guarda, “feito para dançar”, tal qual dizia o vocalista anos atrás.

Posso parecer um velho nostálgico. Mas em meio ao caos do mundo, a todo hiperestímulo a que estamos expostos, à correria diária, é sempre bom ouvir o rock do Autoramas. Ainda mais vendo o passado em perspectiva.

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Após o show ainda deu tempo de pegar um exemplar do livro Magnéticos 90: a geração do rock brasileiro lançada em fita cassete, de Gabriel e Daniel Juca, que retrata o momento fértil do indie rock brazuca em formato história em quadrinhos.

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